Professor Abel

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Quem cuida de nós?

A urgência do cuidado.

17/03/2024 15h03 - Atualizado em 17/03/2024 16h04
Quem cuida de nós?

Saudade dos tempos que a sociedade levava maçãs para gentilmente serem doadas para aquela professora ou professor tão querido e não ameaças ou agressões como é a ordem do dia hoje.


Ser professor nesse país tem sido cada vez mais desafiador, e com certeza você já ouviu muito isso por aí. Para alguns, esse texto pode parecer um cântico de dor diante da desvalorização salarial ou um muro das lamentações de alguém ingrato, chato ou mal-agradecido, que diante de todo sofrimento de outras categorias tem seus privilégios e reclama de “barriga cheia”. Desarme-se! Esse texto é apenas o retrato de milhões de profissionais Brasil afora que são tentados a não acreditarem em sua importância social. Sim, nós professores somos constantemente levados a crer que todo peso dos problemas educacionais recai sobre nós e ainda é vendido a nós que nossa função tem o devido reconhecimento que merece.


Mas, uma pergunta cabe: O que faz um bom professor? Formação acadêmica, hábito de leitura, estudo constante, empatia, simpatia, espírito inventivo, controle emocional, capacidade de resolver conflitos...? São tantas qualidades que enumerar aqui daria várias páginas e até faltariam palavras. Mas, já parou para se perguntar como anda a saúde física e mental de professoras e professores em nosso país? Em uma rápida pesquisa na internet, é possível encontrar dados que comprovam como o ambiente escolar está cada dia mais adoecido, sobretudo para os professores. Depressão, ansiedade, burnout, síndrome do pânico, estafa, problemas cardiovasculares, hormonais e até transtornos alimentares graves, palavras assustadoras que infelizmente tem feito parte da rotina de milhões de educadores e que afetam decisivamente a qualidade do ensino e a vida dos profissionais e estudantes a longo prazo.


Quantos professores que você conhece se queixam de algum problema relacionado à sua função? A saúde física e mental desse público anda bem prejudicada, mas parece que tem pouquíssima gente realmente preocupada com isso. Fazemos programas para combater a violência, a evasão, a taxa de analfabetismo, melhorar a saúde do estudante, incentivar a prática de esporte entre eles e até incentivar a alimentação saudável. Criamos ações para promover a igualdade, o respeito às diversidades e elevar a motivação dos estudantes. Elaboramos e executamos planos para fazer o jovem se sentir acolhido no ambiente escolar, para que eles pensem no futuro, possam planejar sua vida a longo prazo e lidar bem com suas emoções. Aplaudo aqui tudo isso e reafirmo toda a importância que essas ações têm, assim como o poder que possuem de gerar impacto positivo na educação, mas a pergunta é: Como envolver a outra ponta nesse esforço geral pela salvação da educação? Incluir os professores nessa iniciativa é urgente e pode salvar, além da educação, também a saúde e a vida de milhares de SERES HUMANOS, que se dedicam a transmitir conhecimentos.


Autoridade contestada, conhecimento acumulado de anos colocado a prova diante de fake news, embasamento científico disputando com achismos de rede social, carga horária extensa para ganhar mais, multitarefas, viagens diárias para cidades distantes para dar aula, prazos muitas vezes impossíveis de cumprir, lidar e entender as emoções de outras pessoas (geralmente sem saber lidar com as suas próprias), salários quase sempre defasados, exposição contínua a indisciplina e a violência (inclusive de pais de alunos em diversos casos), insegurança, cobrança constante por resultados que muitas vezes não dependem só dele, e o pior, ver a educação ser tocada por muitos que há anos não pisam em sala de aula (políticos que não fazem ideia do que é uma escola, por exemplo) e que mostram muitas vezes grande insensibilidade as angústias do universo educacional e seus dilemas. A eleição de um deputado sem qualquer histórico na área para presidir a comissão de educação na Câmara dos Deputados é um sintoma desse total desprezo pelo setor que muitas autoridades públicas têm. Inacreditavelmente, a maior bandeira de luta desse parlamentar naquele espaço de decisão sobre políticas públicas educacionais é a tal linguagem neutra. Para ele, toda a sorte de problemas educacionais que temos urgência de resolver é menor diante da pauta ideológica defendida por ele. Qual parcela dos educadores ele representa? Quem o elegeu? Quantas vezes ele entrou em uma sala de aula para ouvir os que fazem aquele lugar? Professores são o que para esse determinado político?


Adoecer no trabalho não é “privilégio” dos professores, outras tantas categorias são tão expostas como essa (em alguns casos até pior), mas essa é a parte que me cabe nesse latifúndio, é isso que muitas vezes sinto e ouço constantemente de colegas em corredores e salas de professores. Em muitas situações, nos sentimos sós, quase que sem ter a quem recorrer, a quem lamentar se não a nós mesmos. Quantos líderes partidários, mandatários, juristas ou qualquer pessoa que tem autoridade para decidir ou fiscalizar algo estão verdadeiramente por nós? O que falta para as lideranças da educação desse país entenderem que estamos pedindo socorro? Líderes desse país, aprendam de uma vez por todas que nenhuma mudança é possível na sala de aula sem considerar o professor, não protagonizar essa categoria é continuar batendo cabeça e dando murro em ponta de faca, andar em círculo, insistir em um trabalho inútil ou qualquer outra expressão da língua portuguesa que signifique NÃO ADIANTA, e como dizem os jovens: não vai rolar. Ou cuidamos dos nossos professores agora ou a educação não anda, ou olhamos para o quadro com atenção que mestres merecem ou vamos seguir construindo casa na beira da praia para o mar levar na primeira onda, ou criamos uma política imediata e séria de valorização dessa categoria ou em menos de uma década teremos um total apagão de profissionais (poucos jovens querem a sala de aula como profissão no futuro). Que essa mensagem saia de uma sala de aula e ecoe pelos quatro cantos do país, chegue aos gabinetes, palácios, salas de reunião e ouvidos de quem decide as regras do jogo nesse pedaço do planeta. Cuidem de nós.

Sobre o blog

Thiago Abel, mas podem me chamar apenas de Abel. Professor,  e inquieto por natureza. O objetivo do blog é observar o que de fato importa no cotidiano do povo arapiraquense e tudo que influencie em nossas terras.

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