Curiosidades

Desenho de mulher corcunda viraliza e causa 'confusão científica'

Empresa canadense fez post com ilustração de mulher com "mãos em garra" e obesa

Por g1 21/06/2023 09h09
Desenho de mulher corcunda viraliza e causa 'confusão científica'
Ilustração divulgada pela empresa de móveis canadense Furniture at work - Foto: Reprodução

Corcunda, acima do peso e com mãos em forma de garra: nada indica que o futuro dos trabalhadores que fazem home office no futuro será como o da modelo 3D divulgada por uma empresa de móveis canadense. E não há pesquisa científica que sirva como base para as projeções usadas na peça de marketing.

Pelo contrário, o estudo científico que acabou erroneamente associado a essa simulação 3D aponta que um espaço de trabalho adequado (no escritório ou em casa) estava relacionado a um bom desempenho.

Batizada de Anna, a imagem da "modelo" da loja de móveis viralizou nas redes sociais. Ela foi divulgada em 15 de junho pela "Furniture at Work", uma empresa canadense, em um post de blog.

O texto da empresa foi retirado do ar e a Furniture não se pronunciou sobre as afirmações. No blog, a loja afirmava que, após consultas a especialistas e a estudos científicos, resolveu contar com um designer para projetar as possíveis mudanças nos corpos de quem trabalha em casa a longo prazo.

"Buscamos pesquisas científicas e trabalhamos com especialistas em saúde para explorar totalmente os potenciais efeitos prejudiciais à saúde do trabalho em casa, antes de trabalharmos com um designer 3D para criar um ser humano do futuro cujo corpo tenha sido fisicamente alterado devido ao uso constante de laptops e smartphones, má postura e uma dieta pouco saudável. Será que Anna é o futuro do trabalho remoto?", questionava a empresa no texto.

Nas redes sociais e em reportagens da mídia internacional, um dos estudos que acabou equivocadamente associado às imagens é uma pesquisa da Universidade de Leeds, no Reino Unido. No texto que divulgou as imagens simuladas, a própria Furniture não cita o estudo, que foi liderado pelo pesquisador Matthew Davis.

A pesquisa de Davis aponta que 27% dos trabalhadores britânicos em escritórios não têm acesso a um espaço de trabalho adequado em casa.

"Essas alegações [da empresa] não refletem nossos resultados de pesquisa", disse Matthew Davis, professor responsável pela pesquisa, ao ser procurado por e-mail pelo g1.

Davis afirmou que é provável que parte desses 27% trabalhem na mesa da cozinha, sentadas no sofá ou em camas. "Isso não significa que a maioria dos trabalhadores em home office no futuro sofrerá problemas de saúde e musculoesqueléticos", ressaltou.

Impacto da pandemia no trabalho


A pesquisa da Universidade de Leeds foi publicada em duas partes, em maio e outubro de 2022, com o objetivo de mostrar como pandemia da Covid-19 afetou as formas de trabalho e os trabalhadores.

"Nosso objetivo é entender as implicações das mudanças: aprender lições, compartilhar boas práticas e fornecer orientação para organizações que adotam o trabalho híbrido ou adaptam escritórios para apoiar suas futuras formas de trabalho", diz um dos documentos.

O estudo coordenado por Davis mostrou que o trabalho híbrido - uma mistura de trabalho presencial com trabalho em casa - caiu no gosto dos trabalhadores após a pandemia.

As principais conclusões foram:


Esse é o modelo ideal de trabalho para 52% dos entrevistados na pesquisa;
39% disseram que gostariam de trabalhar menos de forma presencial - esses trabalhadores são mais propensos a querer mudar de emprego e possuem menor satisfação com o trabalho;
Quando no presencial, os trabalhadores relataram maior satisfação e engajamento no trabalho;
Trabalhadores que têm mais controle sobre onde e quando trabalham relataram níveis mais altos de satisfação no trabalho e equilíbrio entre vida pessoal e profissional.

"Nossa pesquisa demonstra que o escritório permanece uma influência fundamental sobre como os funcionários pensam, sentem e interagem no trabalho, e passar tempo com os colegas no escritório tem efeitos positivos para os funcionários e suas organizações. No entanto, há evidências claras de que os funcionários desejam e se beneficiam da escolha de onde, quando e como trabalhar", diz o estudo.

O estudo britânico não se aprofunda nas condições físicas dos trabalhadores em home office. Cita que "os empregadores precisam considerar o impacto ergonômico na saúde e no bem-estar da equipe" tanto no presencial como em casa, a fim de evitar problemas musculoesqueléticos, oferecendo mesas e equipamentos ajustáveis às necessidades físicas dos trabalhadores.

"Trabalhar por longos períodos em locais de trabalho inadequados, principalmente usando equipamentos de informática, pode ter efeitos negativos na saúde física e no bem-estar. No entanto, muitos trabalhadores também vão trabalhar parte do seu tempo em escritórios tradicionais e outros locais de trabalho, que fornecem estações ergonômicas mais adequadas", disse Matthew Davis.

Ambiente adequado


A pesquisa diz que o home office em ambiente adequado determina se a experiência é positiva ou negativa. Trabalhar em uma mesa de jantar, por exemplo, está associado a uma maior distração do trabalhador e níveis mais elevados de exaustão, segundo o estudo.

"Acompanhamos isso em nosso projeto de diário, descobrindo que ter um espaço de trabalho dedicado estava relacionado a um desempenho autoavaliado mais alto, satisfação no trabalho, motivação relacionada ao trabalho e engajamento", afirma a pesquisa.