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Ele foi pai com 14 anos e viúvo aos 17: 'Perdi minha mulher para a dengue'

Maicon Douglas Carneiro dos Santos, 20, de Tianguá (CE), conheceu Ester Cristina Madureira aos 14 anos

Por UOL 31/10/2023 09h09 - Atualizado em 31/10/2023 10h10
Ele foi pai com 14 anos e viúvo aos 17: 'Perdi minha mulher para a dengue'
Maicon Douglas com o filho e a companheira Esther, antes dela morrer de dengue hemorrágica - Foto: Arquivo pessoal

Maicon Douglas Carneiro dos Santos, 20, de Tianguá (CE), conheceu Ester Cristina Madureira aos 14 anos. O relacionamento resultou em uma gravidez e no nascimento do filho, Erick Dylan, em 2018.

Em junho de 2021, porém, a jovem morreu devido a uma dengue hemorrágica, aos 18 anos. Desde então, ele vive sozinho com o filho de 5 anos e compartilha a rotina nas redes sociais.

Ao UOL, ele conta sua história.

Brincadeira virou romance
Tudo começou em 2017, quando conheci a Ester por causa de uma brincadeira de 'Verdade ou Desafio' na escola. Demos nosso primeiro beijo, que acabou se transformando em algo muito além. No mesmo dia, comecei a manter contato com ela pelo celular.

Me encantei pela simplicidade. Era uma garota bem especial e que me fazia muito feliz. Acabou que começamos a namorar depois de três meses ficando juntos, ainda em 2017.

Tínhamos apenas 14 anos de idade e começamos a namorar ainda muito novos. Em março de 2018, quando ela estava prestes a completar 15 anos, ela me contou que estava grávida. Estava nervosa, com medo de ser expulsa de casa.

Mas eu fiquei muito feliz, até porque eu sempre sonhei em ser pai. Mesmo que a gravidez não tivesse sido algo planejado, isso foi muito gratificante para mim. Disse para ela que passaríamos por essa experiência junto.

Os primeiros dois anos do filho

O meu filho, Erick Dylan, nasceu em 10 de novembro de 2018 e a Ester conseguiu presenciar os primeiros passos e palavras dele. Durante os primeiros meses dele, moramos na casa dos pais dela, mas tratamos de arrumar nosso canto um ano depois.

A minha família e a dela nunca tiveram boas condições financeiras, então passamos muita dificuldade no início, mas aquilo me motivava. Era como se, caso eu me esforçasse, poderia mudar a nossa realidade.

Desde antes do meu filho nascer, eu já trabalhava em um depósito de verduras, mas recebia muito pouco, R$ 50 por semana. Logo que ele nasceu, tratei de encontrar algo que pagasse melhor e fui trabalhar em uma marcenaria e vendia sanduíches em uma faculdade.

A Ester nunca teve obrigação de trabalhar porque eu sempre me virei para que ela pudesse se dedicar à maternidade. Só que meu salário acabava sendo insuficiente, então nós dois decidimos trabalhar em uma loja que conserta eletrodomésticos.

Em seguida, eu trabalhei em um supermercado onde recebia apenas R$ 350 reais, como Jovem Aprendiz. Aluguei uma casa no valor de R$ 250 e os pais da Ester sempre apoiaram o relacionamento. Nunca faltou nada e não precisamos pedir dinheiro.

Quando eu era criança, cheguei a pedir esmola na rua e queríamos dar um futuro melhor para o nosso filho. Então, nunca paramos de estudar, apesar de não ter sido fácil. Logo no primeiro ano de vida do Erick,a Ester voltou a estudar de manhã.

Em 2021, ela já estava cursando pedagogia à distância, até porque ela sempre teve esse amor por ensinar, amava crianças e eu sempre incentivei muito ela em relação a isso, apesar de trabalhar o quanto fosse necessário para manter a nossa família.

Eu também estudava pela manhã, mas trabalhava à tarde e à noite, chegava em casa meia-noite e cuidava do nosso filho. Nossas tarefas sempre foram bem divididas para que ninguém se sentisse sobrecarregado.

A perda de Ester
Ester morreu aos 18 anos, em 20 de junho de 2021, de uma dengue hemorrágica que se agravou rapidamente. Ela me falou que estava sentindo algumas dores nos peitos, nas costas, falta de ar. Naquele dia, eu havia a chamado para vermos um filme.

Eu estava na sala com meu filho e ela na cozinha. Eu a chamei e não recebi uma resposta e a encontrei desmaiada no chão. Ela não voltava e eu não sabia o que fazer. Saí correndo na rua desesperado pedindo por socorro. Foi o pior dia da minha vida.

Não sei dizer quanto tempo se passou, mas eu gritei muito, estava muito nervoso, abracei ela e ela acabou voltando. Já no hospital, ela falou com nosso filho ao telefone e  disse: 'A mamãe vai passear e você ficará com o papai. Não se preocupe, vai ficar tudo bem'.

Ela era uma mulher inspiradora, sonhadora e guerreira. Eu estava disposto a crescer junto dela, queríamos nos casar. Tudo que ela queria era poder me ajudar da melhor forma possível. Parece que ela pressentia algo, 15 dias antes de partir, a ela me fez um pedido.

'Nunca deixe de levar o Dylan à casa dos meus pais. Eu te amo muito e sei que ele vai ficar muito bem aqui com você'. Perguntei porque ela estava falando isso e hoje entendo que já tinha alguma coisa errada e que a Ester foi se despedindo aos poucos.

Um pouco nossa rotina pra voces ??

Trabalho com a internet

Sem a Ester, a rotina é diferente, mas quando me tornei influenciador digital, ficou um pouco mais simples de conciliar. Depois que acordamos, faço as atividades da escola com meu filho, os afazeres de casa, o almoço, levo ele ao colégio, lavo roupa.

Para eu aprender essa nova rotina, na ausência da Ester, demorou muito tempo. Foram seis meses. Minha mãe me ajudou bastante nesse processo de amadurecimento e de entender o que eu precisava fazer e ser dentro e fora de casa.

Nunca passou pela minha cabeça que era possível ganhar dinheiro com a internet. Comecei a gravar os vídeos mais como registro e também para compartilhar a minha experiência e isso mudou a nossa vida financeiramente.

O primeiro vídeo foi sobre a morte de Ester. Foi basicamente dois anos postando até conseguir algum salário com os vídeos. Eu comecei a publicar em 2021 e passei a ser monetizado em 2023.

Relação com os sogros e a parte mais difícil
Ainda tenho muito contato com os pais da Ester. Afinal, eles sempre serão a minha família. Geralmente, aos finais de semana, duas vezes ao mês, eu levo o meu filho para dormir na casa deles na sexta-feira e volta no domingo. A nossa relação é muito amigável.

Passei por muitas provações, já que crio o meu filho sozinho desde os 2 anos de idade dele, sozinho. Apesar de ele sentir muita falta da mãe, ele sabe que ela é uma pessoa muito especial e que nunca vamos esquecê-la.

Se ela pudesse ver a gente hoje, diríamos para a Ester que foi muito difícil seguir essa jornada, muito doloroso e que estamos mudando e vamos mudar a nossa vida e a vida da família dela. Estamos trabalhando para isso.