Educação

Cursos de bacharelado da Ufal possuem a maior taxa de evasão da instituição

A maior parte dos alunos que optam por desistir são homens e pardos

Por Felipe Guimarães 19/03/2023 08h08
Cursos de bacharelado da Ufal possuem a maior taxa de evasão da instituição
Universidade Federal de Alagoas (Ufal) - Foto: Reprodução

Conseguir passar no vestibular e entrar em uma Universidade Federal é sonho de muitas pessoas que desejam estudar assuntos do seu interesse pessoal e mudar a sua qualidade de vida. Entretanto, entrar no mundo acadêmico pode não conseguir cumprir as expectativas dos universitários.

De acordo com dados da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), a instituição registrou um total de 3.192 desistências de alunos entre os semestres letivos 2015.1 e 2022.1, representando aproximadamente 10 anos letivos.

A maior parte dessas evasões ocorre em cursos de graduação presenciais, com 96,82% do total de abandonos. Dentre esses, os cursos de bacharelado aparecem entre os mais comuns, com 66,44% do total. Já os cursos de licenciatura vem logo em seguida, com 33,49% do número de estudantes desistentes.

Dentre essas pessoas que optam por desistir de seus cursos, a maior parte são homens, com 1.636 casos e pardos, com um total de 1.073 abandonos registrados nos últimos anos.

Segundo o professor e pesquisador da Ufal, Juan Pablo*, vários pontos devem ser levados em consideração para se analisar os motivos dos quais estudantes vêm optando por evadir de seus cursos.

“A evasão deriva de um momento complexo nas Universidades, alguns pontos, listados chamam a atenção, tais como: o SISU que possibilita a entrada de um percentual grande de alunos que não tem afinidade ou conhecimento sobre os cursos aos quais se candidatam, a falta de recursos, falta de atualização de metodologias, a grande difusão de discursos anti científicos e um aumento no número de alunos com perfil de aluno-trabalhador”, explicou.

Em sua perspectiva, a questão da evasão é um problema a se preocupar. “A universidade é um espaço de todos e, em especial, pensado, construído, mantido e gerido para os alunos. Eles são a razão da nossa existência e funcionamento, ao menos essa é, ou deveria ser, a base filosófica que a justifica. Todo processo de evasão preocupa e deve preocupar muito ao conjunto e partes específicas da Universidade, incluindo o impacto social, cultural e financeiro que isso trás para um estado conhecido nacionalmente por seus baixos índices educacionais e de desenvolvimento social, como Alagoas”, argumentou Juan*.

Na sua visão, a situação pode vir a ser solucionada, porém a solução deste problema não depende única e exclusivamente da Universidade, conforme pontua. “A Universidade está mobilizada em tentar minimizar e ou reverter o grande fluxo de evasão. Algumas ações já vêm sendo executadas, incluindo uma maior permeabilidade nas mídias de comunicação, com consequente maior visibilidade e permeabilidade social. Acredito que a médio prazo o cenário pode melhorar, mas não depende só da Universidade, assertivamente ou de forma incompleta, a Universidade vem se mobilizando para tentar melhorar o cenário, mas a melhoria nos números passa por questões que extrapolam seus limites institucionais. Como exemplo, podemos citar as políticas de cotas, de bolsas de apoio acadêmico, proposição de novos programas sociais e ampliação dos atuais, investimento em estruturação, investimento massivos em ensino, extensão e pesquisa”, disse.

A MAIOR EVASÃO

Dados da Ufal apontam o Instituto de Ciências Humanas, Comunicação e Artes (ICHCA) com a maior quantidade de evasões do Campus A.C Simões, localizado em Maceió, com 2.516 casos registrados na última década. O instituto é responsável atualmente por nove graduações, sendo elas: Biblioteconomia, Dança, Filosofia, História-Bacharelado, História-Licenciatura, Jornalismo, Música, Relações Públicas e Teatro.

Instituto de Ciências Humanas, Comunicação e Artes (ICHCA) — Foto: Ascom CRCC



Buscando entender esta realidade, a reportagem conversou com Matheus Câncio, graduando de 22 anos do curso de História Licenciatura. Questionado o motivo desse grande fluxo de evasões no ICHCA, o estudante não demorou para apontar um possível culpado.

“Penso que a maioria dos estudantes do ICHCA precisam conciliar o trabalho com os estudos, não os estudos com o trabalho. Por conta dos horários do curso, que em sua maioria são vespertino ou noturno, esses estudantes mantêm uma rotina extremamente exaustiva. Um estudante que trabalha pela manhã até o começo da tarde tem que chegar na universidade até as 19h e largar por volta das 21h e 21h30, horário já adiantado pela segurança no campus. Somado a isso mais a falta de ampliação das políticas de permanência da Ufal, penso que a tendência é justamente esse ritmo de evasão”, opinou.

Matheus iniciou a sua graduação no ano de 2020 e desde então, segundo o próprio, cerca de seis de seus colegas optaram por desistir ou trocar de curso por motivos relacionados a falta de transporte, pouca perspectiva no graduação ou falta de condições para se manter.

“No geral, é a logística do transporte que mais me afeta. São poucas as linhas que fazem o trajeto Ufal - parte baixa, descendo, e as linhas são afetadas pelo GPS com mau funcionamento. Nos aplicativos de ônibus, o horário é muitas vezes, ou quase sempre, incerto. Já tentei contato com o aplicativo CittaMobi, mas não obtive resposta. Os ônibus nesse sentido só entram na universidade a partir das 20h30. Outro grande motivo é a segurança no bloco. Nessa mesma semana houve dois assaltos ao redor, sendo um próximo ao RU e outro no ponto de ônibus do ICHCA”, afirma.

Apesar de todas as dificuldades, o graduando ainda acredita que a Universidade possui as ferramentas necessárias para reduzir o fluxo de evasão de alunos da instituição, sendo necessário, sobretudo, diálogo.

“A Universidade tem possibilidades de reduzir a evasão de alunos. Primeiramente, é preciso um diálogo com os estudantes, principalmente com as entidades que os representam. Até porque são pautas que o Movimento Estudantil já discute na Ufal, mas que muitas vezes não são ouvidos ou até ignorados. Acredito que a Universidade reduziria os casos de evasão com a ampliação das bolsas permanências, repensando também a própria política interna das bolsas, onde um estudante bolsista de outro programa, como PIBIC, PIBID, PRP, etc. não pode receber a Programa Bolsa Pró-Graduando”, pontua.

MAIS INFORMAÇÕES

Apesar do número de evasões registradas na última década na Ufal chamar a atenção, a disputa para entrar no ensino superior ainda existe. Conforme o SISU 2022, o curso de enfermagem aparece como o mais concorrido no estado de Alagoas. O 7Segundos conversou com o presidente do Conselho Regional de Enfermagem de Alagoas (Coren-AL), Renné Costa, para apontar os possíveis fatores, veja.

Além disso, outro fator a ser levado em conta sobre a desistência ou mudança em cursos de graduação é talvez a expectativa frustrada dos alunos em se deparar com uma realidade diferente da esperada, por isso, a busca por maiores informações a respeito da graduação almejada pode evitar decepções. Para ter um melhor entendimento das graduações, os vestibulandos podem acessar o site da Ufal.

*Nome alterado, a pedido da fonte, para proteger a sua privacidade e a sua identidade