O som que vem da periferia: Quando o Rap muda vidas

Rimas, poesia, pensamento rápido, à capela ou com música de fundo

Por Juliana Leandro |

Instrumento de transformação social para crianças e jovens, o rap e suas variações crescem cada vez mais em Maceió com o surgimento de coletivos e batalhas de rappers que põem em debate temas como a desigualdade social e o racismo.

Rimas, poesia, pensamento rápido, à capela ou com música de fundo. Assim é o rap, gênero musical que consiste em um discurso com ritmos e que surgiu dentro das comunidades afrodescendentes dos Estados Unidos no final do século XX. 

No rap a letra é mais importante que a música ou a harmonia, pelo fato de trazer discursos político-sociais com rimas embasadas no cotidiano dos rappers ou MCs. 

Atuando de maneira solo ou em grupo, os rappers participam de duelos de frases rimadas e elaboradas na hora, instantaneamente, e devem transmitir uma ideia, um discurso sobre um assunto que faça parte do universo tanto de quem canta como de quem ouve. Ganha quem deixar o adversário sem palavras, neste caso, sem rimas. Os temas cantados – rimados – são diversos, passando pela violência nas favelas, desigualdades, amor, dinheiro e sexo.

O rap faz parte da subcultura do hip hop, um movimento cultural que também engloba o break dance, DJing, gírias e grafite, além da moda. Partindo do pensamento de que “a arte salva”, o rap e o hip hop se tornaram ferramentas de transformação social, muitas vezes, sendo mais efetivas que o governo, por serem os mecanismos capazes de ajudar crianças e jovens a terem um conforto, um modo de sustento ou, até mesmo, uma família.

Rapem: rap e movimento Fundado por Levysson Ilton e Obama, o coletivo Rapem é formado por integrantes que compartilham o propósito de levar a arte e o entretenimento para os ônibus que circulam em Maceió e, através disso, desconstruir a imagem negativa que grande parte da população associa ao rap, além de arrancar sorrisos dos passageiros que já estão sobrecarregados com a rotina de seu dia a dia. 

“Muitas pessoas acham que a gente faz isso só pelo dinheiro, mas não é, entendeu? Não é. É totalmente diferente. É pelo fato de querer animar um pouco o dia, a viagem da pessoa que tá ali dentro do ônibus” explica Bown L, nome artístico de Levysson.

“Muitas pessoas acham que a gente faz isso só pelo dinheiro, mas não é, entendeu? Não é. É totalmente diferente. É pelo fato de querer animar um pouco o dia, a viagem da pessoa que tá ali dentro do ônibus” explica Bown L, nome artístico de Levysson.

O cotidiano do trabalhador brasileiro pode ser muitas vezes caótico e isso acaba interferindo diretamente no humor das pessoas, principalmente de quem tem que pegar ônibus lotado todos os dias e enfrentar horas no trânsito. O transporte público é um dos locais onde esse estresse mais se aflora devido, principalmente, à grande circulação de usuários em lugares apertados, fechados e quase sempre superlotados, com uma realidade de pessoas cansadas, indispostas.

É aí que os meninos do Rapem fazem a diferença. Eles entram no ônibus, cumprimentam os presentes e pedem licença para rimar, as reações das pessoas são diversas. 

O MC Freellipe, nome artístico de Fellipe Motta, conta que no começo só possuía experiência rimando em batalhas de rap, foi quando, à convite de um amigo, teve a oportunidade de rimar em coletivos e se encantou pelo trabalho.

“Até então não tinha nem contato, nenhuma pretensão, nem um trabalho artístico, nada. Ele me chamou e eu fui e achei a experiência legal, massa”, diz.

A partir desse momento, a paixão pelo free style, modo de cantar de maneira improvisada, só cresceu, e junto com ela veio a necessidade de criar uma identidade e fazer algo maior. “A gente não tinha um nome, a gente só rimava e ficava por isso mesmo” comenta.







Colecionando experiências boas e ruins, Freellipe relata alguns dos episódios que viveu ao lado dos seus colegas de rima Além da alegria que buscam proporcionar para a população que usa o transporte público.

"Uma moça mandou mensagem pra a gente, depois da apresentação. Ela disse que estava com pensamentos suicidas, e que queria tirar a vida. Mas a nossa apresentação trouxa alegria para ela de novo. Essas coisas fazem tudo valer a pena."

Porém nem toda experiência é positiva, e algumas delas marcaram bastante o coletivo.

"Uma vez cheguei para um senhor no ônibus, e fui fazer rima com ele né. Aí ele não gostou, e respondeu de forma agressiva e me chutou." Relata Freellipe.

O nome Rapem nasceu do desejo de criar algo regional e que possa transmitir a verdadeira essência do coletivo. Dessa maneira, ao longo do tempo, adquiriu vários significados.

“Rapem pode ser de repente e, antigamente, a casa de menor era a Febem, né? Também tem isso: Rapem. E como a gente rima no ônibus, é em movimento, aí juntou: Rapem, o rap em movimento”, explica Freellipe.

Atualmente os meninos são reconhecidos nos ônibus e fora deles e estão sempre buscando expandir o trabalho do coletivo, como explica Brown L.

“A gente já se apresentou em escola, já se apresentou no Ifal, já se apresentou na Ufal, participou de uma roda de conversa na sala de aula e isso vem sendo muito bom pra nós.Cada vez mais nosso movimento vem crescendo”.

Com uma abordagem mais leve e descontraída, o Rapem vem conquistando corações de adultos e crianças na cidade de Maceió.

“Lá em Marechal, que a gente foi lá rimar para as crianças, a gente parecia que era artista, pô! As crianças fazendo fila para tirar foto com a gente”, lembra Obama, emocionado.

Atualmente, o coletivo mudou de área. Eles foram pioneiros nas rimas em coletivos, e com isso, outros grupos foram surgindo. Para se destacar e expandir o trabalho artístico do grupo, eles resolveram começar a rimar na orla da capital. 

"A gente queria se destacar. Muitas pessoas estavam fazendo rima nos ônibus. Resolvemos mudar para a praia, um público maior, do mundo inteiro. O mundo inteiro conhecendo nossa arte. Além de ser mais rentável para a nossa equipe." Explica o MC.

E para todos que precisam de um boa risada, um elogio ou um pouco de arte para aliviar dos problemas e tenções do dia a dia, os meninos do Rapem estão todos os dias na orla de Maceió e em outros pontos turísticos do estado, marcando com alegria e inspiração todos que cruzam seu caminho.