A primavera no Brasil começa oficialmente neste domingo (22), após meses de seca, calor e grandes queimadas. É uma época também em que se vê a chuva com mais frequência, o que faz com que boa parte das famílias tenha um certo alívio. Porém, a chegada da considerada melhor estação do ano não é só de flores e espinhos, ela também pode ser cenário para vários ataques de abelhas.
Em Alagoas, por exemplo, entre terça (17) e este sábado (21), o Corpo de Bombeiros registrou em torno de 15 ocorrências envolvendo ataque de abelhas. A maioria das situações aconteceram em árvores próximas a uma casa, no telhado de alguma residência ou em área de mata.
Um dos casos ocorreu na última quarta-feira em um sítio localizado em União dos Palmares. Um homem caminhava pelo sítio com seu cachorro de estimação, quando foi surpreendido por um enxame de abelhas agressivas. Ele conseguiu fugir, mas o cachorro ficou e morreu devido às ferroadas dos insetos.
De acordo com o biólogo (Ufal) e apicultor José Vieira de Araújo Neto, que também tem mestrado em biologia animal (UFPE) e é pesquisador em Zoologia, esses ataques acontecem devido ao comportamento defensivo forte de algumas espécies de abelhas, que são compostas por muitos recursos sensoriais para perceber possíveis ataques à colônia.
"Temos muitas espécies de abelhas, na maioria das espécies não tem nem ferrão. A abelha que vemos nos casos de ataque é a Apis melífera, popularmente conhecida como abelha africanizada, europeia e tantos outros nomes. Essa espécie defende a colônia com muita eficiência. Alguns ataques de abelhas podem ser desencadeados por determinados odores que as abelhas consideram perigosos, como cheiro de mato cortado, alguns produtos químicos, tremor no solo provocado por alguma obra", explicou o pesquisador.
Muitas vezes as pessoas atacam essas abelhas com alguma substância ou fumaça, o que desencadeia agressividade e ataques
O apicultor também enfatizou que as abelhas vivem de acordo com as ofertas de alimentos disponíveis no ambiente, e que na maioria das regiões de Alagoas há uma maior oferta desses alimentos durante a primavera. A oferta de flores proporciona certos fatores, como maior estoque de mel, que é o que torna as abelhas mais agressivas.
"As populações sobem consideravelmente, e as abelhas ficam com condições ideais para sua reprodução ou divisão dos enxames através da enxameação, onde parte das abelhas ficam na colônia e outra parte busca um novo local para nidificar [formar ninho] e montar uma nova colônia", disse o biólogo.
Ele ressaltou que quando os enxames estão em processo de enxameação, antes de escolher o local definitivo para montar a nova moradia, as abelhas não ficam agressivas, "mas muitas vezes as pessoas atacam essas abelhas com alguma substância ou fumaça, o que desencadeia agressividade e ataques".
Ataque e defesa
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A autônoma Cícera Farias, de 48 anos, teve um susto no começo de setembro deste ano, na localidade onde mora, no bairro do Ouro Preto, em Maceió. Ela tem uma loja de rações e estava organizando os produtos que chegavam no estabelecimento, quando ouviu alguns gritos de socorro na rua. Dona Cícera foi ao centro do barulho e viu que cinco pessoas estavam sendo atacadas por um enxame de abelhas.
Entre os atacados estavam os sobrinhos de oito e nove anos de dona Cícera, dois vizinhos, uma homem que levava um botijão de gás para casa, e até o cachorro de um vizinho. Ela foi a sexta pessoa atacada pelas abelhas, mas conseguiu correr a tempo para dentro de sua residência, e mesmo assim os insetos invadiram o local.
"A sensação é terrível. Fiquei apavorada. Quando fui picada pelas abelhas eu senti uma espécie de calafrio, quase ia passando mal, mas consegui correr e me recuperar. Elas se manifestaram de uma forma que a gente ia chamar os bombeiros, mas teve uma pessoa que teve a ideia de jogar fumaça nelas, e elas foram embora aos poucos", disse Cícera. -
Ela também contou que a origem do ataque foi na casa de um vizinho, que jogou uma sacola de lixo no quintal dele (terreno baldio), sem saber que ali, próximo a uma árvore, estava uma colmeia de abelhas. A sacola bateu na árvore e os insetos começaram a se amontoar em cima desse vizinho que jogou a sacola. "Ele recebeu picadas de várias abelhas, até na cabeça do vizinho tinha ferroada. Ficou com calafrios, passou mal, pálido, e foi para a UPA [Unidade de Pronto Atendimento]. Ele ficou em observação e passou uns dias doente, porque foi picado por muitas abelhas", concluiu.
Outro caso foi o da Rosimeire de Gois, de 49 anos, professora de União dos Palmares. Ela contou que tinha sete anos na época do ataque, e que estava em uma área de roça com o pai, quando, de repente, apareceu um enxame de abelhas. "A gente saiu correndo, meu pai montado no cavalo e eu a pé. Foi uma cena de terror, foi horrível. Fomos picados por milhares de abelhas, e conseguimos ser socorridos por uns moradores da localidade", relatou.
Segundo Rosimeire, uma moradora jogou um balde de água nos dois para afastar as abelhas, que foram embora. Porém, os ferrões dos insetos ainda estavam nos corpos deles, que ficaram inchados por uma semana. A professora também relatou que um primo dela quase morreu após o ataque de várias abelhas. "Ele ficou internado no HGE [Hospital Geral do Estado] entre a vida e a morte", disse ela.
O que fazer em casos de ataque
Ainda segundo o pesquisador, algumas abelhas têm ferrão com uma peçonha muito forte para algumas pessoas, levando-as até a morte por causa do alto número de ferroadas. Caso a pessoa encontre uma colônia de abelhas, o recomendável é ligar para o Corpo de Bombeiros ou buscar algum apicultor para realizar a retirada dos insetos em segurança.
"Se acidentou? Busque o serviço de urgência em saúde, principalmente no caso de alérgicos à abelha e de pessoas com múltiplas ferroadas. Nesses dois casos a agilidade no atendimento é importante, pois podem causar edema de glote e, consequentemente, dificuldade em respirar", pontuou.
A reportagem do 7Segundos entrou em contato com o Corpo de Bombeiros para saber o número total de pessoas atacadas por abelhas em Alagoas e algumas orientações em caso de ataque, mas até essa sexta (20) não obteve resposta.
A Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Maceió também foi procurada para saber a quantidade total de atendimentos nas unidades de saúde referente ao assunto, quais são os sintomas e o que deve ser feito após o ataque. O órgão respondeu que não há dados sobre essa espécie de ocorrência, apenas de doenças de notificação compulsória ou violências. Porém, disse que esses ataques se assemelham a uma intoxicação por animal peçonhento, e que vai envolver toxina, reação do corpo e choque anafilático, sendo recomendado ir ao Hospital de Doenças Tropicais (HDT) Hélvio Auto, no bairro do Trapiche, onde a vítima terá uma assistência mais adequada.