Justiça

Torquato diz que conflito Barroso X Gilmar provocou prisão de amigos de Temer

Na semana passada, o juiz Marcus Vinícius Reis Bastos, da 12ª Vara Federal de Brasília, converteu em ação penal a denúncia sobre o “Quadrilhao do PMDB”

Por Uol Notícias 18/04/2018 09h09
Torquato diz que conflito Barroso X Gilmar provocou prisão de amigos de Temer
Presidente Temer e Tomato - Foto: Reprodução

O ministro da Justiça, Torquato Jardim, afirmou que o “conflito” entre Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes, que eletrifica o Supremo Tribunal Federal, teve reflexos no inquérito que apura se um decreto de Michel Temer beneficiou empresas do setor de portos em troca de propinas. Segundo Torquato, a Operaçao Skala, que resultou na prisão temporária de empresários e amigos do presidente em 29 março, foi decretada por Barroso em reação a uma liminar de Gilmar, que proibira no final de dezembro as chamadas conduções coercitivas.

“Para mim, houve muito mais um conflito entre ministros do Supremo do que a proteção da demanda jurisdicional”, declarou o ministro da Justiça, em entrevista ao blog, na tarde desta terça-feira. Entre os presos estavam o advogado José Yunes e o ex-coronel da PM paulista João Baptista Lima Filho, dois amigos de Temer acusados de atuar como operadores do presidente. Permaneceram na cadeia por três dias. Torquato considerou as prisões abusivas.

“Se a condução coercitiva de testemunhas para depor estava suspensa no Brasil por liminar do ministro Gilmar Mendes, o substitutivo da condução coercitiva não é a prisão. […] Até porque, no caso de quase todos os que foram levados, à exceção de um [o coronel Lima], eles sempre depuseram quando convocados. Eles já haviam tido seus escritórios submetidos a busca e apreensão. Já haviam entregue os documentos necessários. Então, para compensar-se o menos, foi-se ao mais, que se revelou um exagero. Aí, sim, há um abuso de direitos individuais, uma quebra do Estado democrático de Direito.

Torquato manifestou preocupação também com outro processo. Refere-se ao chamado “Quadrilhão do PMDB”. Vem a ser um desdobramento da segunda denúncia criminal formulada pela Procuradoria-Geral da Repúblioca contra Temer, no ano passado. Como a Câmara congelou a denúncia, o ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo, enviou para a primeira instância do Judiciário o pedaço do processo referente aos acusados sem mandato.

“O que me preocupa do ponto de vista jurídico, é que possa haver pré-julgamento, pré-condicionamento e pré-investigação em face de alguém que não está nos autos”, disse Torquato. Acha possível tocar o processo sem investigar Temer indiretamente?, quis saber o repórter. E o ministro: “Se é possível ou não, não sei. Mas terá que ser possível. Do contrário, o processo será nulo.” A denúncia contra Temer só poderá andar depois que ele deixar a Presidência, em janeiro de 2019.

Na semana passada, o juiz Marcus Vinícius Reis Bastos, da 12ª Vara Federal de Brasília, converteu em ação penal a denúncia sobre o “Quadrilhao do PMDB”. Enviou para o banco dos réus velhos amigos, correligionários e ex-auxiliares de Temer. Entre eles, de novo, José Yunes e o coronel Lima, além Rodrigo Rocha Loures, Geddel Vieira Lima, Henrique Eduardo Alves, e Eduardo Cunha. Nesta semana, o magistrado convocou o depoimento de 42 pessoas, a maioria delatores da Lava Jato. “Presumo que o juiz federal terá esse cuidado extremo de não extrapolar”, realçou Torquato.

Instado a comentar a prisão de Lula, o ministro da Justiça de Temer classificou o fato como uma evidência de “amadurecimento da democracia” brasileira. “A jurisprudência, hoje, permite o começo do cumprimento da pena após o julgamento em segundo grau. É isso que foi feito no caso dele, como em muitos outros casos”, disse Torquato. “Não podemos desprezar, obviamente, a repercussão político-partidária, sociológica, porque se trata de um ex-presidente da República que ainda goza de muito prestígio em vastos segmentos da sociedade brasileira. Mas esses são fatos da sociologia e da política, não pertinentes à aplicação da lei.”

Torquato é o único auxiliar de Temer que defende publicamente a prisão de condenados em segunda instância. Escora seu ponto de vista num argumento pouco mencionado: “A isonomia de oportunidades entre os cidadãos”. Para ele a medida iguala ricos e pobres: “Você achata a riqueza para que todos, independentemente do poder aquisitivo, da capacidade de continuar recorrendo a outras instâncias, iniciem o cumprimento da pena.”

O repórter recordou ao ministro que, a partir de janeiro de 2019, Temer estará sem mandato, ao alcance de um juiz de primeira instância. E ele: “Nós todos, o professor e advogado Michel Temer, presidente da República, meu amigo, nós temos a perspectiva intelectual, cultural de interpretação do direito constitucional: a isonomia de todos em face da Constituição, a isonomia de todos em face da lei.”

No início de março, quando o ministro Luís Barroso mandou quebrar o seu sigilo bancário no caso dos portos, Temer mandou divulgar uma nota na qual prometeu divulgar, ele próprio, seus extratos bancários aos jornalistas. Recuou. O ministro da Justiça aprovou a meia-volta: “A reação do presidente foi política, compreensível. O advogado tem outra perspectiva: ‘Vamos divulgar o que o relator pedir’. Até porque, nisso o presidente foi muito claro, ele não precisa divulgar. É tanto vazamento que, no dia que chegar lá vai ser vazado. Então, que haja vazamento sob a responsabilidade da autoridade pública, não dele.”

No vídeo abaixo, você assiste à íntegra da conversa com Torquato Jardim. Nela, além dos temas já mencionados, o ministro da Justiça revela sua opinião sobre Luís Barroso, relator do caso dos Portos no Supremo, e seu desafeto Gilmar Mendes. Comenta a crise que debilita o Supremo. Elogia a ministra Rosa Weber, que coloca o colegiado da Suprema Corte acima de suas posições pessoais. Especialista em Direito eleitoral, fala sobre a decisão do STJ de enviar o inquérito contra Geraldo Alckmin à Justiça Eleitoral. De resto, assegura que o governo de Michel Temer, apinhado de delatados, investigados e denunciados, apoia a Lava Jato.