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Brechas diminuem chances de punir caixa 2 em delações

Por Folha de São Paulo 18/03/2017 10h10
Brechas diminuem chances de punir caixa 2 em delações
Empresário Marcelo Odebrecht, preso na Lava Jato, chega à sede da Justiça Federal, em Curitiba (PR) - Foto: Paulo Lisboa/Brazil Photo Press/Folhapress

Políticos acusados da prática de caixa dois clássico, ou seja, de ocultar da Justiça Eleitoral a real movimentação financeira de suas campanhas, têm se beneficiado de brechas na legislação para escaparem de punição criminal e eleitoral.

Quando não há indício de malversação de dinheiro público, os casos de caixa dois são enquadrados criminalmente em um artigo do Código Eleitoral, o 350, de falsidade ideológica, em que não há jurisprudência pacífica no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para condenação.

A lei diz que a pena poderia ser de até cinco anos de prisão, mas, segundo o tribunal, até hoje não houve condenação neste sentido.

Já em julgamento somente eleitoral, com a pena de perda de mandato e inelegibilidade, há o risco de não haver tempo hábil para punição se a acusação ocorrer fora do prazo estipulado pela Constituição.

"O mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral no prazo de 15 dias contados da diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude", segundo a Constituição.

Nos depoimentos decorrentes de delações premiadas, executivos da Odebrecht relataram que a empreiteira gastou de US$ 500 milhões a US$ 680 milhões para financiar campanhas eleitorais no Brasil via caixa dois entre 2006 e 2014.

Marcelo Odebrecht, ex-presidente e herdeiro do grupo, contou aos procuradores da Lava Jato que parte da doação de R$ 150 milhões à campanha da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer foi por meio de caixa dois.

O ex-presidente da Odebrecht Infraestrutura Benedicto Júnior, o BJ, disse em depoimento ao TSE que a empreiteira baiana doou R$ 9 milhões por fora para campanhas eleitorais do PSDB.

Diante dessas e de outras revelações, lideranças políticas de vários partidos têm buscado um discurso para minimizar o peso do uso da prática de caixa dois eleitoral.

Nos pedidos de abertura de 83 inquéritos para investigar políticos citados pela Odebrecht, a Procuradoria-Geral da República tem buscado diferenciar o chamado caixa dois "puro", sem prova de contrapartida ilícita, do caixa dois em que há elementos que mostram que, em troca da doação por fora, houve pagamento de vantagem indevida.

Para aqueles que aparecem com alguma suspeita de terem atuado em favor dos doadores ou que tenham prometido alguma ação nesse sentido, a PGR pede investigação pelo crime de corrupção passiva, cuja pena de prisão pode chegar a até 12 anos.

O ministro Henrique Neves, TSE, reconhece que a limitação para o pedido de impugnação de uma chapa suspeita de caixa dois dificulta sua punição no campo eleitoral, mas ressalta que há espaço ainda no campo criminal, mesmo que não haja jurisprudência formada.

"Permanece o prazo para o oferecimento de ação penal em razão de informação falsa que tenha sido prestada, pois o crime só prescreve em 12 anos", disse.

O advogado eleitoral Ricardo Vita Porto também alerta que a questão não está ainda consolidada.

"Há outros precedentes do TSE indicando que esta análise deve ser feita somente após o recebimento da denúncia. Havendo indícios de materialidade e autoria a denúncia deve ser recebida, dando assim início a ação penal contra os acusados", diz.

LACUNAS

Ainda que uma jurisprudência de condenação criminal do caixa dois "puro" venha a ser consolidada pela Justiça no futuro, há outras duas formas de os políticos escaparem de uma prisão.

A primeira é utilizando um artigo da lei que prevê suspensão de processos, por dois a quatro anos, em casos em que os crimes têm como mínimo o período igual ou inferior a um ano.

De acordo com a legislação, expirado esse prazo, sem revogação, a punibilidade estará extinta.

A outra forma, como já foi alertado até mesmo pelo Ministério Público, é a não apresentação da prestação de contas. Assim, não poderá haver a acusação de omissão ou falsificação de documento, justamente aquilo que poderia gerar uma ação.