Professor Abel

Professor Abel

Professor Abel

O ser professor na UTI.

Ainda há esperança para o paciente?

15/10/2023 20h08
O ser professor na UTI.

Ter jovens perdidos em relação às profissões a seguir após o término do ensino médio é regra nas salas de aula do país inteiro. Estão dispersos, desfocados e altamente desorientados em relação ao seu próprio futuro, guiá-los é tarefa cada vez mais difícil para educadores e familiares. São muitos caminhos a seguir, muitas distrações no percurso, muitas incertezas e principalmente muitos exemplos não tão bem sucedidos de profissionais, tudo isso somado ao fato dos estudantes concluírem cada vez mais cedo sua vida na educação básica e aí a incerteza é a ordem do dia, escolher uma profissão pode ser angustiante para a maioria deles.

Mas apesar de tantas dúvidas, uma certeza é cada vez mais constante: a maioria não quer seguir a carreira dos educadores que os ensinaram ao longo da vida. Em uma pesquisa rápida nos grupos de estudantes que estou a resposta foi direta. Mais de 95% dos jovens não quer ser professor. Os motivos são os mais variados e óbvios diante da crise que vivemos em nossa sociedade de umas duas décadas pra cá: desvalorização salarial, excesso de trabalho fora do expediente, pouco reconhecimento social e até a violência nas escolas afastam a maioria dos estudantes das licenciaturas.

Não quero aqui focar na regra, e sim nas exceções, nos exemplos positivos e inspiradores. Sim, estou falando dos jovens que querem a sala de aula como vida profissional. O que será que mobiliza esses poucos jovens a remarem contra a maré e trilharem para as licenciaturas?

Ana Beatriz, 18 anos, estudante da 3ª série de uma escola pública de Craíbas. Isabela Lacerda, 19 anos, concluinte do mesmo ano letivo que Beatriz, só que de uma escola privada de Arapiraca. Matheus Sonoda, 24 anos, formado em engenharia elétrica, vive na maior cidade do Brasil. O que esses jovens, que não se conhecem tem em comum? São pessoas que afirmaram convictamente que querem fazer licenciatura e querem ser professoras.

Isabela é fruto de professora, tem em casa um belo exemplo de como é uma trajetória na educação, e foi esse o motivo maior. “Minha mãe, ela é professora, sempre foi, a única profissão a vida inteira e eu sempre achei incrível. Qualquer coisa que eu faça, penso em prestar concurso e ir pra sala de aula”, diz ela toda orgulhosa. Sempre atenta as aulas, assídua leitora, se destaca pela excelente comunicação verbal e escrita, certamente será uma educadora de mão cheia. 

Ana Beatriz, mora na zona rural de Craíbas, família de gente trabalhadora, mas, que pelas agruras da vida não seguiram na vida escolar, mas sempre a incentivaram a estudar, e foi justamente na sala de aula que ela encontrou o farol a seguir na vida profissional. Na fala dela exala o sonho de ser professora, e faz questão de dizer o quanto o ambiente onde estuda é inspirador: “Ver vocês (professores) em sala de aula, além de ser incrível, é uma baita inspiração. Eu sempre gostei bastante de conversar e ensinar algumas coisas, nunca me imaginei muito no ramo, tanto por falta de incentivo quanto de valorização da área, eu comecei a pensar nisso na gincana de história em 2022 na escola, foi uma dinâmica incrível, e pra mim que já gostava de história, aquele evento só serviu para aprofundar mais. Eu dei uma aula uma vez e gostei muito. Eu fui professora no meu curso por um dia, achei a experiência incrível e quero viver isso como profissão”, disse.

Aos 24 anos, nascido, criado e vivendo na capital paulista, Matheus Sonoda é formado em Engenharia Elétrica pela Faculdade de Engenharia Industrial (FEI), tem atuado hoje na área de TI, mas, alimenta diariamente o sonho de ensinar. Nas palavras dele, ser professor é meta de vida: “Hoje estou fazendo mestrado justamente vislumbrando a sala de aula, quero, preciso e sei que posso passar conhecimento, essa ideia sempre me motivou desde a graduação quando liderava grupos de estudo. Lecionar é para realização pessoal, vontade de fazer a diferença, promover um ambiente propício ao conhecimento leve, útil e que faça sentido na vida do aluno, criar aulas mais atrativas, dinâmicas, que possam fixar os estudantes na área de estudo. Em 2018 entrei na faculdade e eram 20 salas com 70 pessoas cada, formei em 2022 com 10 na minha turma e uns 300 no total de todas as engenharias, sei que boa parte dessa evasão passa pelo trabalho do professor e sei que posso contribuir para essa mudança tão necessária na educação”.

Esperanças que sonhos como estes se multipliquem é motivador, é um alento, um afago diante de tanta dificuldade encontrada pelos professores que hoje veem sua profissão quase fadada a extinção. Que mais Beatrizes, Isabelas e Matheus nasçam e garantam a sobrevivência dessa função tão nobre e necessária para nossa sociedade e que as previsões do tal apagão da educação sejam lindamente derrubadas.