Reconheceu as duas belas mulheres acima? Danielle Olímpia, de 25 anos, e Duda Santos, de 21, posam nestas fotos bem diferentes das personagens que encarnam de segunda a sábado em “Travessia”, primeiro papel em novelas das duas. Na trama de Gloria Perez no horário nobre, as duas jovens atrizes são amigas, adolescentes de 15 anos e estudam na mesma escola. Isa, personagem de Duda, parecia que ia ser a filha problemática da família de Laís (Indira Nascimento) e Monteiro (Ailton Graça), mas acabou ajudando os pais a lidar com o problema do irmão mais novo, Theo (Ricardo Silva), que sofre de dependência tecnológica. A menina apoia também a amiga Karina, interpretada por Danielle, que tem vivido um drama que ultrapassou a novela e virou debate nas redes sociais e fora dela. A jovem foi vítima de estupro virtual por um pedófilo que utilizou a tecnologia deep fake para se passar por uma atriz e enganá-la. Desde então, ela tem se escondido no quarto, onde passou a se automutilar.

Após ganhar notoriedade na série “Sintonia”, da Netflix, Danielle celebra o sucesso da atual personagem, que leva às telas um assunto pertinente a muitas famílias e jovens.

— Eu já sabia que Karina passaria por uma situação de assédio, mas não sabia que seria um estupro virtual. Vim estudando, me preparando, ouvindo mulheres, falando com psicólogos e terapeutas. Está sendo um estudo diário porque ainda não acabou. A repercussão está vindo de uma forma muito positiva. Eu sempre quis trabalhar com propósito, com algo que conscientizasse as pessoas. Toda essa história da Karina é também a de várias mulheres. Todo dia alguém me manda uma mensagem falando o quanto é importante. Então, estou muito feliz e grata.

Nos próximos capítulos, o pedófilo vivido pelo ator Claudio Tovar vai cumprir sua promessa de espalhar fotos da menina em sites com conteúdo pornográfico, o que ela mais temia.

— Karina ainda está na metade do poço. Ela ainda vai se afogar, vai ladeira abaixo — entrega Danielle, sem dar spoilers do que vai rolar depois dessa trama: — Está sendo trágico para ela, mas incrível para mim como atriz. Choro no set, mas depois assisto às cenas feliz.

Na vida real, Danielle, como diversas mulheres, já passou por situações de assédio, mas ressalta a importância do papo aberto que tinha com os pais.

— A minha família sempre teve uma conversa muita esclarecida sobre isso. Teve uma vez que, ainda criança (12 anos), eu estava andando na rua e um homem falou para outro, se referindo a mim: “Em quantas vezes você passaria essa menina no cartão de crédito?”. Fiquei chocada e contei para os meus pais — relembra ela, que acrescenta: — Minha trajetória foi muito positiva em relação a isso, já que estudei numa escola que também alertava sobre o assunto. Consegui me proteger desde criança. É importante que todas as pessoas tenham informações, até porque a maior taxa de pedofilia ocorre dentro de casa.

E é também no aconchego do lar que o drama da família de Isa acontece na novela. Enquanto arranja um tempo para apoiar a amiga, a personagem de Duda ainda está envolvida com as dificuldades do irmão com dependência tecnológica.

— Tanto Theo quanto Karina estão vivendo seus pesadelos em seus quartos. Geralmente, as mães ficam tranquilas quando os filhos estão em casa e não sabem que pode estar acontecendo algo perigoso. É importante a novela mostrar isso. Os dois casos são alertas. Com o estupro virtual, a vida dessas meninas demora a voltar ao normal ou nunca mais é a mesma. Estamos falando de uma violência. Já o caso do Theo é algo novo e a novela está dando um norte para muita gente, falando que não é para ignorar. O vício em tecnologia é como qualquer outro — ressalta Duda.

A intérprete de Isa revela que viveu um drama similar dentro de sua própria casa, com o irmão Rhuan, de 21 anos. Ela conta que só percebeu a gravidade da situação durante a pandemia, quando já estava gravando a novela.

— Meu irmão era superviciado em jogos de internet. É uma doença nova, a gente foi entender que tinha algo errado depois de um tempo. A gente achava que era só uma fase. Minha mãe ficava tranquila com o filho dentro de casa, sem correr os perigos da rua. Demoramos para entender e acabamos fazendo coisas que não foram saudáveis — reflete Duda, explicando que, durante o processo, a mãe chegou a quebrar o computador do rapaz.

Além de Rhuan, a atriz tem dois irmãos, Pedro, de 18 anos, e Maria Paula, de 15. A caçula foi fonte de inspiração para Duda montar a personalidade de Isa. Duda, inclusive, é conselheira da caçula.

— Temos uma relação muito próxima. Ajudei a cuidar dela desde pequena porque minha mãe trabalhava fora. Sempre expliquei a ela onde alguém podia botar a mão ou não podia — diz Duda, que não tinha conversas sobre educação sexual com a mãe: — Cresci num lar em que ela me protegia de saber certas coisas. Na primeira vez que conversamos sobre assuntos íntimos, eu tinha 18 anos e já namorava há dois anos e meio. Ela me pediu desculpa por nunca ter abordado certas coisas, disse que não tinha coragem.

Em “Travessia”, Isa também ficou na mira do pedófilo, mas Karina impediu a amiga de passar pela mesma situação que ela, ainda que sem contar o que estava acontecendo. Na vida real, Duda recebe comentários nas redes que a deixam chocada.

— Tem mensagens inacreditáveis na internet. Semana passada, um cara escreveu uma frase numa foto minha dando a entender que a minha inocência dava tesão nele. Como existem pessoas loucas! — exclama a atriz, que avalia: — Falar desse assunto com certeza machuca muito e requer coragem. Toda mulher já foi assediada e muitas sentem medo de contar.

Antes de “Travessia”, Duda fez uma participação rápida em “Malhação”. Mas foi 2022 o divisor de águas da carreira da carioca que cresceu numa comunidade da Vila da Penha. Foi quando entrou para a novela e fez dois filmes.

— Meu trabalho me enche de orgulho. Minha mãe fica muito feliz. Ela não imaginava tudo o que ia acontecer. Para a minha família, ainda é um grande acontecimento eu estar numa novela. Eu sempre quis ser artista, não sabia como. Sou criada numa periferia na Vila da Penha, então não tinha muita expectativa para isso. Minha mãe não queria que eu fosse atriz, ela preferia que eu fizesse faculdade, por preocupação. Hoje ela já entendeu que deu tudo certo — conta Duda, revelando que os parentes ficam assustados com suas cenas na trama: — Minha mãe sempre me pergunta se eu estou bem. Eles acompanham tudo fielmente e se mostram preocupados com minhas dificuldades, limitações... Querem que eu melhore a cada dia. Ficam estressados com o Theo, com pena da Karina...

E haja pena da personagem! As cenas da moça são comoventes, e também pesadas. Mas sua intérprete conta que vem tentando se blindar para não ficar tão afetada com a experiência da ficção

— Esse é um dos maiores desafios da minha vida. Como atriz, você tem que sentir as dores das personagens e elas queimam a alma. Eu fiz um trato comigo de que no set eu seria Karina, mas depois que eu passasse da catraca dos Estúdios Globo eu seria Danielle, e esses sentimentos não viriam comigo. Eu não me jogo nesse abismo. Também estou trabalhando num lugar em que as pessoas são incríveis, respeitam meu tempo, meu espaço. Eu me senti muito protegida e acolhida para contar essa história — diz ela, que fala sobre o contato com Claudio Tovar, o ator que interpreta o pedófilo: — Saiu por aí que eu pedi para não falar com ele. Claudio é maravilhoso e agradeço muito a ele pela parceria no set. Mas é claro que cinco minutos antes das cenas não vou estar dando risada com ele. Vou estar concentrada. Como atriz, eu não tenho como fazer nada sozinha. A troca com ele é maravilhosa.

Com Duda, a parceria também tem sido produtiva. Danielle conta que elas se conheceram na preparação do elenco, e a amiga complementa:

— Somos amigas na vida real antes de começar a amizade na novela. Nós já tínhamos intimidade, então foi mais fácil chegar nesse lugar. Confiamos muito no trabalho uma da outra — diz Duda, que também levou para sua convivência outros atores do elenco: — Ricardo, que faz o Theo, é um menino de apenas 15 anos tão talentoso, esperto, inteligente... Com 20, nem sei onde ele vai estar (risos)! A gente grava muito TikTok nos bastidores, vemos novela juntos no camarim, lanchamos juntos, comemos pipoca. Indira, minha mãe na novela, é o amor da minha vida. Ela até passou a Páscoa aqui em casa! Além do meu núcleo, fiz amizade com Chay Suede, Dandara Mariana, Jade Picon... Vou levar esse elenco pra vida.

Enquanto Duda tem a família toda aqui no Rio, Danielle é paulista, mas de família mineira. Ela fica em contato com seus parentes pelas redes sociais.

— Aqui moro sozinha. Meu pai vive em Morada Nova de Minas e trabalha numa pousada. Minha mãe mora em Vazante, que já é perto de Goiás, e vende pão de queijo. Tenho dois irmãos, Lari, de 26, e Victor, de 23. Ela trabalha com marketing também em Minas. Já ele é poliglota e trabalha num cruzeiro. Não tenho a mínima ideia de onde ele deve estar agora, por exemplo (risos).

Danielle teve o primeiro contato com o teatro aos 6 anos de idade. Aos 11, protagonizou uma peça na escola e dois anos depois conheceu o teatro profissional. Em 2016, se formou em Artes Cênicas, Maquiagem, TV e Cinema. Além de peças, curtas e cursos na área artística, a atriz chegou a cursar a faculdade de Direito enquanto não apareciam trabalhos no audiovisual. Ela também auxiliava a mãe na venda de pão de queijo em Vazante, Minas Gerais.

— Eu tinha o maior prazer em ajudá-la a vender. Tenho muito orgulho da minha história. A gente passou por fases difíceis no passado. No começo, quando eu disse que queria ser atriz, eles se preocupavam. Mas é um sonho que todo mundo sonhou junto na verdade.

Quem vê Karina na TV pode nem acreditar que Danielle tem dez anos a mais que a filha de Joel (Nando Cunha). Com aparência de menina nas telas, a atriz diz que hoje se vê mais como mulher.

— Todo mundo que conversa comigo fala que sou uma alma velha. Sei que tenho uma carinha de novinha, faço personagens assim. Mas, desde cedo, estou atrás da minha independência trabalhando. Hoje, eu consigo me ver como uma mulher adulta, dona de mim, e cheia de sonhos.

Já Duda, na novela, é vaidosa assim como a mãe, Laís, que é superfashionista. A estudante é adepta dos delineados gráficos nos olhos e, diferentemente da advogada, usou os cabelos trançados durante toda a novela.

— A equipe arrasa, eu sou péssima para fazer maquiagem (risos). Nas gravações, eu uso uma trança chanel, que nunca tinha usado. O cabelo me deixou bem menininha. Tô adorando! — diz ela, que completa: — Na vida real, já tive trança até a bunda, nagô. E fui eu que pedi para a personagem usar trança, porque é mais prático no dia a dia. Eles adoraram a ideia. Eu refaço duas vezes ao mês. Tenho que acordar muito cedo para gravar e meu cabelo natural, que é crespo, dá muito trabalho! Estou em transição capilar. Mas, em breve, vou voltar com o meu black.