Por que o erotismo infantil é um problema e como os pais podem evitar?
Pelos ângulos filmados através da câmera, o salão se mostra cheio. No palco, um DJ toca Funk e um locutor anuncia o nome da garota que é a nova sensação da internet. Ela está vestida de short curto, blusa, tênis e um boné. No ambiente, ecoa o som da música Bonde das Maravilhas. Não demora muito e MC Melody se apresenta e segue perfeitamente aquilo que a letra diz: “Bote a bunda no chão” e “Faz quadradinho de oito”. O público grita ao passo que a menina de apenas nove anos deita no chão e ergue os quadris para cima. Logo após, vira-se de costas para a plateia e treme o quadril.
A descrição acima exemplifica o que se pode chamar de erotismo infantil. Uma prática intensa, que no Brasil, pode ser visto nas redes sociais, na escola, nas ruas, dentro de casa. A erotização precoce é a quebra da vivência infantil, do qual é imposta uma cultura sexual adultizada na criança, que nada tem a ver com o processo de desenvolvimento saudável na infância. O caso da MC Melody pode ser considerado um caso extremo, mas existem vários exemplos que são praticados no dia-a-dia e podem estar passando despercebidos.
Segundo a psicóloga e coordenadora do Ensino Infantil de uma escola de Maceió, Gabriela Valente, diversos fatores podem influenciar na adultização precoce, como fatores externos (mídia, redes sociais, conteúdos musicais, filmes, desenhos). No entanto, os pais e o seio familiar são os principais responsáveis pelos limites e liberdades impostos ás crianças.
“Embora o meio externo tenha influência direta, cabe aos pais a responsabilidade de evitar e filtrar a exposição dos filhos a determinados conteúdos musicais, visuais, vestimentas”.
Por isso, ela enfatiza que o exemplo dos pais determina o comportamento dos filhos.
“A principal forma de aprendizagem é o exemplo. É importante que os pais incorporem que são espelhos para os filhos, desta forma, devem resignificar as suas próprias posturas”.
O pai e empresário de MC Melody, Thiago de Abreu, também conhecido como MC Belinho, foi alvo de denúncias e polêmicas nas redes sociais. Em entrevistas a jornais e portais de notícias, o empresário afirmou vê o comportamento da filha com naturalidade e a incentiva promovendo shows e alimentando a página do facebook com vídeos da cantora.
Internautas denunciaram uma das páginas da jovem, que foi excluída pelo facebook. Mas outra foi criada, e hoje, possui mais de 200 mil seguidores.
A psicóloga explica que essa exposição sexual infantil é um problema não só de imagem, mas que pode resultar em assédios sexuais.
"Mesmo quando assediada, a criança ao mesmo tempo está sendo violentada na sua dignidade e na sua alma. A violência não é necessariamente só o ato”, explica Valente.
É possível em algumas postagens no facebook da MC mirim o assédio vindo de homens adultos.
Exemplos mais simples, que podem estar sendo naturalizados são crianças escolherem suas próprias roupas, e que, por alguma influência, preferem vestimentas e maquiagens que não são adequadas à sua idade. Outro exemplo está no desinteresse por brinquedos e desenhos infantis e a preferência por jogos, ídolos, músicas e brincadeiras que estimulam a sexualidade precoce.
Escola
No último dia 27 de maio, uma sexta-feira, um colégio localizado em bairro nobre da parte baixa de Maceió protagonizou um episódio polêmico envolvendo seus alunos, com idades entre 11 e 12 anos. É que uma turma da escola expôs a música “Baile de Favela” - que estimula a violência e a prática sexual- durante um evento esportivo dentro da instituição. Indignados, internautas se mostraram contra o acontecido em redes sociais.
Gabriela Valente explica que a escola deve participar junto com os pais no processo de desenvolvimento da criança. Esse processo, que não é focado nas genitais e nem no desejo, estabelece uma “descoberta corporal e exploração saudável e normal”.
“A escola tem o domínio de auxiliar os pais nesta descoberta. Assim as crianças devem receber orientações para que tenham a noção de domínio do próprio corpo e saber que ninguém pode tocar em seu corpo. Sem fazer terrorismo, os pais e a escola podem dar estas orientações”, afirma.
“A equipe escolar deve ter conhecimento das etapas do desenvolvimento infantil, a fim de promover projetos pedagógicos que contribuam para o desenvolvimento cognitivo e emocional que caminham juntos e são interdependentes”, expõe a psicóloga, que vê com preocupação os danos causados por essa quebra da infância nos adultos das próximas gerações.
“Vejo que podemos esperar das próximas gerações um vazio existencial e uma frustração muito grandes como consequência da perda de se vivenciar a beleza e o encantamento das etapas da infância tão importantes para a formação pessoal”.