Operação Kapnós: cigarros falsos causaram prejuízo de R$ 4,5 milhões aos cofres públicos
Revendedores compravam os produtos de fábricas clandestinas, localizadas, em sua maioria, na região Sul do país
A Operação Kapnós identificou duas quadrilhas do Nordeste que trabalhavam com a comercialização de cigarros falsificados, nesta quinta-feira (07), durante uma operação coordenada do Grupo Estadual de Combate às Organizações Criminosas (Gecoc) do Ministério Público Estadual de Alagoas (MPE/AL). Onze pessoas suspeitas de envolvimento na falsificação e distribuição de cigarros foram presas no Nordeste, sendo oito delas nas cidades de Maceió, Arapiraca, Limoeiro de Anadia e Anadia, no Estado de Alagoas.
O Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (Idesf), associação civil sem fins lucrativos que realiza pesquisas e estudos sobre os prejuízos causados por esse tipo de crime no Brasil, levantou que hoje, no país, o cigarro ilegal movimenta R$ 6,5 bilhões ao ano. Isso tudo impulsionado pela alta demanda, baixa punição e potencial de ganho das organizações criminosas com os esquemas ilegais. Apenas no Nordeste, as quadrilhas causaram o prejuízo em torno de R$ 4,5 milhões aos cofres públicos.
Os prejuízos causados pelo comércio ilegal de cigarros atingem diversos setores e estão intimamente ligados a outros delitos. Um levantamento do Idesf apontou que mais de 70% dos carros apreendidos com cigarros no Brasil são veículos roubados. As perdas atingem também a indústria nacional, que sofre concorrência desleal. Os criminosos não pagam impostos nem seguem normas de higiene e segurança do trabalho. Afora, também, os prejuízos à saúde dos consumidores, que inalam substâncias desconhecidas, às margens da lei e das fiscalizações.
Ao todo, 100 agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e 45 homens das Polícias Civil e Militar de Alagoas foram acionados. A operação recolheu 2.930 caixas de cigarros falsificados, veículos de luxo, uma lancha, um jet-skis e R$ 295 mil, tendo sido R$ 81 mil em espécie e mais R$ 214 mil em cheques. Todos os bens recolhidos teriam sido comprados e colocados no nome de laranjas com o intuito de lavar o dinheiro adquirido com o comércio ilegal de cigarros.
Os presos e todo o material apreendido foram encaminhados, respectivamente, à Divisão Especial de Investigação e Capturas (Deic), localizada no bairro da Santa Amélia, e à Academia de Polícia Militar de Alagoas, no Trapiche da Barra, ambas em Maceió.
Como funcionava o esquema
De acordo com os levantamentos que vinham sendo realizados há quatro meses, as quadrilhas presas eram especializadas em comercializar cigarros falsificados, produzidos no Brasil, mas com selos de marcas paraguaias já bem aceitas no mercado nacional, como eight, gift, bello e meridian.
Segundo as informações coletadas, os revendedores compravam os produtos de fábricas clandestinas, localizadas, em sua maioria, na região Sul do país, e distribuíam para diversos centros de comércio no Nordeste. Os dois bandos possuíam uma estrutura organizada, cujos integrantes exerciam papéis distintos. Existiam os fornecedores regionais, os estaduais, e os locais, fora os vendedores que comercializavam para o consumidor final.
Foram justamente dois desses vendedores, que vendiam cigarros falsificados no Mercado da Produção e na Feira do Artesanato, no Centro da capital alagoana, que se tornaram o ponto de intersecção entre as organizações criminosas. Ora eles compravam a mercadoria de uma das quadrilhas, ora compravam da outra, o que tornou possível mapear os núcleos que sustentavam o esquema criminoso.
Quadrilhas
Uma das quadrilhas tinha seu distribuidor regional sediado em Lauro de Freitas/BA. Ele revendia para os estados de Alagoas, Pernambuco, Piauí, Ceará e Paraíba. Já a segunda, tinha seu centro de distribuição em Caruaru/PE e atuava nos estados vizinhos, Alagoas e Paraíba, e também tinha negócios no Rio Grande do Norte.
Os produtos eram vendidos com notas fiscais falsas, que indicavam mercadorias diferentes daquelas que estavam sendo transportadas. Um dos integrantes do bando de Lauro de Freitas era o responsável pela confecção desses documentos, que também podiam ser vendidos separadamente da carga de cigarro, se assim os clientes desejassem.
Em Alagoas, o principal distribuidor estadual reside em Arapiraca, de onde revendia o produto do crime para as cidades do interior do estado e para compradores da capital. O transporte do produto para os distribuidores locais era feito em veículos de pequeno porte, carregados com, no máximo, 100 caixas de cigarros, e sempre acompanhados de um veículo batedor, que ia à frente do principal. Eram maneiras de evitar as fiscalizações nas estradas e se prevenir de grandes prejuízos, caso fossem abordados.
Devido ao dinheiro fácil, os líderes das organizações viviam como empresários de sucesso, administrando empresas de fachada, a exemplo de postos de combustíveis, restaurantes e distribuidoras de bebida, tudo no nome de terceiros. Havia, inclusive, em uma das organizações, um financiador do esquema, que emprestava dinheiro para a compra da mercadoria falsificada. O faturamento por ano de uma das quadrilhas chegava a mais de R$ 1 milhão, valor sobre o qual não incidiu arrecadação de impostos, nem fiscalização.
Operação Kapnós
Kapnós é uma palavra de origem grega que significa tabaco e, que por sua vez, remete a fumaça. Na operação, ela tem duplo sentido. Faz referência ao produto alvo das investigações e a fumaça tóxica resultante do gás emitido pela combustão dos componentes químicos do produto. Como o cigarro é produzido de forma clandestina, sua confecção não obedece as regras sanitárias e higiênicas impostas pelos órgãos de fiscalização e controle.
O nome também tem sentido figurado, já que fumaça, metaforicamente, é um termo utilizado quando se quer falar que algo está sendo encoberto. Nesse caso, os levantamentos realizados indicam que as manobras feitas pelas quadrilhas tentam esconder a origem ilícita do dinheiro e dos bens.