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Própolis vermelha: o ouro exótico dos manguezais de Alagoas

Produto apresenta potencial econômico, medicinal, bem como é uma fonte geradora de emprego e renda

04/06/2023 06h06 - Atualizado em 05/06/2023 23h11
Própolis vermelha: o ouro exótico dos manguezais de Alagoas
Própolis vermelha - Foto: Empresa Fernão Velho

Marcelo Alves – repórter

Dos manguezais de Alagoas surge uma vegetação exótica que já é comparada a ouro, só que avermelhado. A preciosidade se chama própolis vermelha. A descoberta chamou a atenção até de pesquisadores e estudiosos da Universidade de São Paulo (USP) que viajaram até o estado alagoano e confirmaram o potencial econômico, medicinal. E além de exalar um cheiro balsâmico forte, a raridade possui uma fragrância de geração de emprego e renda, que traz benefícios para a agricultura familiar, meio ambiente e turismo.

Resina chega a custar R$ 1 mil o quilo


Para se ter ideia do valor da preciosidade encontrada, somente em Alagoas, o quilo da resina da própolis vermelha custa R$ 1 mil. Isso é o que garantiu, o presidente da União dos Produtores de Própolis Vermelha do Estado de Alagoas (Uniprópolis), Mário Agra. “Temos que criar um programa estadual da apicultura para fortalecer as relações institucionais e buscar impulsionar a produção e a venda, pois temos um produto com potencial fantástico, que é produzido de Piaçabuçu a Maragogi”, disse.

Mário Agra fala sobre importância da própolis vermelha em reunião no Palácio República dos Palmares
Felipe Brasil - Agência Alagoas


Ainda de acordo com Mário Agra, a cor avermelhada e o cheiro balsâmico forte, que é gerada a partir da resina da planta, conhecida como "Rabo de Bugio", que é transformada na colmeia pela ação salivar das abelhas, cera e pólen, só existe unicamente em Alagoas. Além disso, a espécie alagoana também é única em possuir uma composição complexa com isoflavonoides (formononetina, medicarpina, vestitol e isoliquiritigenina, substância usada para tratamento de câncer.

“Essa própolis vermelha dos manguezais de Alagoas não existe em nenhum lugar do mundo”, ressaltou Mário, durante reunião ocorrida no Palácio República dos Palmares, com o vice-governador Ronaldo Lessa, e que contou com a participação de empreendedores, pesquisadores e representantes do Sebrae, Embrapa e Universidade Federal de Alagoas (Ufal).

“Temos ouro nas mãos”, diz reitor da Ufal


O reitor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Josealdo Tonholo, disse que o material é a primeira indicação geográfica da biodiversidade das Américas e comparou a espécie a ouro. “Temos ouro nas mãos, que é a própolis vermelha de Alagoas. Não estamos falando apenas de abelha, de caixa, estamos falando de algo mais complexo, que são as oportunidades transversais, como agricultura familiar, agricultura de recursos hídricos, ciência e tecnologia”, disse Tonholo, durante o encontro do Palácio República dos Palmares.

Tonholo ressalta importância da própolis vermelha
Felipe Brasil - Agência Alagoas

De acordo com Tonholo, a Ufal pode contribuir com ações de reconhecimento e comercialização, bem como auxiliar através da promoção de cursos e programas de divulgação para alavancar as vendas do produto. O reitor propôs ainda a elaboração de um projeto para impulsionar o turismo científico e ecológico para abrir portas para o financiamento. “É inegável a importância da própolis como um produto genuinamente alagoano, que traz impactos sociais, econômicos e científicos, que pode ser comprovado pelo quantitativo de pesquisas que produzimos sobre a temática na nossa Universidade. Por isso, precisamos investir em estratégias de divulgação e de adensamento da cadeia produtiva”, disse Tonholo, durante o seminário Própolis Vermelha de Alagoas: avanços e perspectivas.

De acordo com Tonholo, a Ufal é responsável por 52% das patentes sobre própolis vermelha no Brasil e também de 12% dos depósitos internacionais na Organização Mundial da Propriedade Intelectual [World Intellectual Property Organization (Wipo)].

Embrapa e Sebrae ressaltam importância do produto


O diretor superintendente do Sebrae, Vinícius Lages, vê a própolis vermelha como uma dádiva da natureza para Alagoas. “A natureza nos deu a beleza dos mangues, Mata Atlântica, Caatinga, abelhas que exalam a resina que faz com que os ‘microbiorreatores’, que são as abelhas, façam a produção da própolis”, disse Vinícius.

Avanços e perspectivas da Própolis Vermelha de Alagoas são apresentados em seminário no Sebrae
João Paulo Macena

Ainda de acordo com Vinícius, é necessário haver a contribuição para que o produto seja transformado em riquezas, gerando renda e desenvolvimento nos municípios. “Essa própolis é cada vez mais instigante e interessante. Ela tem isoflavonoides. Na natureza, só a soja e outro vegetal têm essa substância. Ou seja, é um produto único. Esse é um dos motivos que fazem com que lá fora os pesquisadores se interessem. Essa substância serve para aliviar, por exemplo, sintomas da menopausa. Isso faz com que a própolis daqui seja consumida nos Estados Unidos. É preciso trabalhar em conjunto para que possamos aproveitar mais os benefícios dela”, ressaltou.

O chefe-geral da Embrapa, João Flávio Veloso, classificou o produto como embaixador de Alagoas. “Esse é um produto altamente relevante por conta de sua indicação geográfica. Ele associa sustentabilidade, agricultura familiar e meio ambiente, por estar nos entornos das lagoas Manguaba e Mundaú. E temos que ressaltar que, do ponto de vista científico, ainda há muitos benefícios a serem descobertos”, disse Veloso.

Em 2021, a empresa Fernão Velho, que produz e comercializa cápsulas da própolis vermelha, recebeu o selo de Indicação Geográfica (IG) Denominação de Origem (DO) – Manguezais de Alagoas. De acordo com o presidente da Fernão Velho, a marca é um reconhecimento internacional que permite a produção. “A gente sabe que o mundo todo reconhece essa certificação internacional. Portanto, a partir de agora, acreditamos que vamos dar um salto importante e quem sabe até nesse ano, ainda, iniciar um processo de exportação”, disse Calheiros, presidente da empresa Fernão Velho.

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), um Selo de Identificação Geográfica remete à localização de origem e às condições da fabricação de produtos, permitindo que consumidores saibam que o que estão adquirindo é diferenciado pela qualidade de sua procedência, além de valorizar a cultura local e fomentar atividades turísticas.

USP comprova potencial econômico e medicinal da própolis


Há quase duas décadas pesquisando a própolis vermelha de Alagoas, o professor da Universidade de São Paulo (USP), Severino de Alencar, disse que o produto é o único do Brasil composto por isoflavonóides, substância que ajuda no processo inflamatório. “O material é originário de manguezal, por isso é necessário à preservação dos mangues”, disse Severino.

De acordo com os estudos realizados pela USP, publicado no Journal of Natural Products, além das duas substâncias anticancerígenas, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) descobriram outros seis novos polifenóis, substâncias naturais como os flavonoides e os taninos, encontradas em plantas, cereais e também no vinho, com estruturas totalmente inéditas na ciência.

“Das oito substâncias novas e isoladas pela primeira vez da própolis vermelha, duas apresentaram propriedade citotóxica anticancerígena em células de ovário, mama e de glioma. Realizamos os testes in vitro nesses três tipos de câncer por eles serem multirresistentes a diferentes drogas e, portanto, muito difíceis de tratar. Essas células têm um mecanismo, já conhecido, que superexpressa uma proteína responsável pela exclusão de drogas das células, levando à resistência medicamentosa. No entanto, os testes mostraram que as substâncias da própolis vermelha conseguiram contornar esse mecanismo, algo essencial para reduzir os tumores”, disse Roberto Berlinck, professor no Instituto de Química de São Carlos da Universidade de São Paulo (IQSC-USP).

Fernão Velho investe em abelhas e garante emprego e renda

Com o apoio de consultores do Sebrae, o engenheiro agrônomo e fundador da Fernão Velho, Mário Calheiros aliou seus estudos realizados internacionalmente sobre abelhas ao longo de mais de três décadas transformou a empresa em uma referência nacional e também fora do país na comercialização de vários produtos feitos à base da própolis vermelha, bem como na geração de emprego e renda.

Mário Calheiros entres as colaboradoras
Fernão Velho

“Resolvemos fazer um reposicionamento da nossa marca, mais uma vez com o apoio de consultores do Sebrae, já que agora tínhamos desenvolvido produtos diferenciados e boa parte do nosso público consumidor, eram selecionados. Nossa marca passou a se chamar “Apícola Fernão Velho”, levando o nome do bairro que é a sede de nossa empresa, até então instalada. Fernão Velho é um nome que traduz tradição, fortaleza e uma certa imponência”, disse Mário Calheiros.

“Oportunizamos pequenos produtores a serem introduzidos no mercado, através de um processo seletivo minucioso, onde cadastramos e oferecemos todo apoio e monitoramento técnico, deste modo ampliamos nossa capacidade de fornecimento de produtos de altíssima qualidade”, ressaltou Calheiros.

Sempre buscando a melhoria de produtos 100% naturais, a Fernão Velho conta com diversas variedades de itens feitos com a própolis vermelha, das linhas mel, nutracêutica, gourmet, a exemplo de cafés, extratos, hidromel, vinagre, spray para garganta.

Variedades de produtos à base da própolis vermelha produzidos na Fernão Velho
Fernão Velho