Despacho de delegado sobre morador de rua viraliza: "Não tem onde 'arriar o barro'"
Delegado não aceitou a prisão de um morador de rua que pulou muro de uma creche para se aliviar
O texto de um delegado da Polícia Civil do Rio Grande do Norte viralizou nas redes sociais. O motivo é o emprego de expressões incomuns quando se trata de um despacho policial. Ao entender que foi desnecessária a prisão de um morador de rua – levado à delegacia após ter sido flagrado defecando dentro de um prédio público – Aldo Lopes de Araújo escreveu: “Trata a presente ocorrência de uma cagalança geral: do prefeito ao secretário, passando pelo diretor do órgão, pelo vigilante de faz-de-conta, pelos membros da Guarda Municipal que conduziram um homem inocente até esta Delegacia”.
O delegado também usa o despacho, que foi assinado no domingo (5) durante seu expediante na Delegacia de Plantão da Zona Norte de Natal, para justificar a soltura do homem. O prédio em que o morador defecou foi um Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI), que estava fechado. “O conduzido é morador de rua, e não achou lugar melhor para dar de corpo, cagar, como se diz no idioma espontâneo do povo. Trata-se de um brasileiro em típico estado de necessidade. Ele não tem casa nem privada onde “arriar o barro”, como se diz lá em nós”.
Na manhã desta quarta (8), Aldo Lopes falou com o G1, e confirmou que foi ele mesmo o autor do despacho. Também explicou que fez uso de um vocabulário mais popular por ter se sentido inconformado com o fato "de um homem simples, abandonado pelo poder público”, ter sido levado para a delegacia por ter usado, “justamente um espaço público e que também não tem recebido os cuidados necessários”, para aliviar suas necessidades fisiológicas.
“Não admito injustiças. As coisas precisam ser melhor apuradas, melhor investigadas. É inadmissível que eu, em um plantão de fim de semana, tenha que perder tempo com uma coisa dessas. Por que ninguém pula o muro da sua casa para cagar? Porque você toma conta, zela pela sua residência, pela higiene e segurança dela. E deveria ser assim também com a coisa pública, que ninguém zela, que ninguém cuida”, desabafou.
Aldo Lopes tem 61 anos de idade. É paraibano e tem 17 anos de carreira na Polícia Civil. Além de delegado, é jornalista e escritor.
Repúdio
Em nota, o Comando Geral da Guarda Municipal do Natal (GMN) disse repudiar a atitude do delegado Aldo Lopes de Araújo, e afirma que o homem detido foi levado à delegacia por ser suspeito de ter furtado dois refletores de LED pertencentes ao CMEI Marluce Carlos de Melo.
"Diante do fato, a GMN deteve o suspeito dentro das instalações do CMEI e o conduziu juntamente com o material do furto a Delegacia de Polícia Civil de Plantão da Zona Norte, seguindo o procedimento legal de entregar o detido a autoridade competente da Polícia Judiciária para que a mesma conduza as investigações referente ao caso, objeto de sua competência institucional", acrescentou a nota.
A Guarda Municipal de Natal disse também que o despacho do delegado "agride gratuitamente e sem nenhuma razão" a imagem institucional da corporação, essa que ao longo dos seus 27 anos de existência zela pela relação harmônica e parceira entre as instituições de segurança pública, sempre atuando dentro da legalidade, respeito a legislação e aos direitos humanos, na busca de contribuir com construção de cenário social onde a segurança e o direito do cidadão sejam perenes".