Cultura

Museu Casa de Taipa é inaugurado com mais de 900 peças antigas em Taquarana

Cerimônia de abertura do espaço fez parte da programação do 1º Festival de Teatro de Rua e Espaços Alternativos (FESTA)

Por 7Segundos com Jamerson Soares/Assessoria 25/03/2022 13h01
Museu Casa de Taipa é inaugurado com mais de 900 peças antigas em Taquarana
Inauguração do Museu Casa de Taipa aconteceu na noite de quinta (24) - Foto: Jamerson Soares/Assesoria

A voz firme e acolhedora de Fernando Gomes Freire, de 29 anos, vibra entusiasmo por telefone. É um dia da realização de um sonho que perdurou em sua vida desde os 12 anos, quando já colecionava moedas, notas e velhos adereços. Fernando anuncia que o Museu Casa de Taipa, localizado no povoado Varas, em Taquarana, município do agreste alagoano, abre suas portas para a população.

A inauguração do museu ocorreu na noite de quinta-feira (24), com a presença do próprio Fernando, familiares, a comunidade local, artistas e autoridades do município. Na ocasião, houve festejos, fogos de artifício, muita música e agradecimentos. Até o céu estava mais limpo e tranquilo. O grupo colorido de pastoril "Pastoril Sagrado, Pastoril Santa Cruz", da cidade, também se apresentou no local. A cerimônia de abertura do espaço fez parte da programação do 1º Festival de Teatro de Rua e Espaços Alternativos de Taquarana (FESTA).


Fernando é auxiliar administrativo, faz Ciências Biológicas no Instituto Federal de Alagoas (IFAL), gosta de colecionar artefatos e objetos, que talvez muita gente não se importe em se apegar. Segundo o criador do Casa de Taipa, que também participa há cinco anos de um projeto de restauração de estátuas e capelinhas, sempre existiu um tripé pessoal e hereditário que sustentou a criação do espaço.

"Eu sempre digo que esse museu é da vida, um museu de uma vida que passou. Eu costumo falar sempre que aqui também foi construído com fé, oração e trabalho", enfatiza.

Máquinas datilográficas, virador de fumo, câmeras dos anos 50, pilão; lampiões, discos de vinil, radiolas, prensadeiras, moedas de décadas passadas; vasos rústicos, máquinas agrícolas e de costura. Objetos que fazem parte da cultura popular de Taquarana e que eram guardados na casa da avó, que faleceu há 14 anos. No acervo, há também peças de 1900.

Ele relata que a ideia de construir um museu veio dele mesmo e do incentivo de quem o via colecionar coisas. A construção do espaço começou em 2019 depois de ele conseguir juntar dinheiro e comprar o terreno.


Em novembro do mesmo ano, vigas de madeira e a composição de taipa começaram a ser levantadas. A comunidade, junto com recursos da Lei Aldir Blanc, por meio da prefeitura do município, ajudou Fernando a moldar a estrutura durante o fim do mesmo ano e o começo de 2020.

"Junto com a comunidade eu consegui a tapagem, a eletricidade, entre outras coisas. Veio a pandemia e tivemos que parar os trabalhos, mas já estava pronto. Em 2021, a gente conseguiu se organizar direitinho. Ganhamos um apoio pela lei de cultura e melhoramos o visual do museu. Vamos tentar manter para que não fique só por hoje e que a cultura continue. É quase impossível manter o espaço sozinho, mas a comunidade é sempre presente", diz Fernando.

Com uma arquitetura moderna, mobiliário rústico e amplo acervo de objetos, o Casa de Taipa exala uma essência regional e de arte popular. O letreiro na entrada da casa já sinaliza que dentro do espaço há também memória regional e muita espiritualidade.

Segundo Gomes, parte do acervo do museu é composto por peças doadas pelos seus tios, avós, pessoas de sítios vizinhos, do próprio município e de outras cidades, como Belém e Maribondo.

"Para mim é um sonho realizado que talvez hoje se torne um sonho de muitos. Acredito que o município ganhe com isso. As pessoas poderão se encontrar no passado ao entrar no museu, pois é um local de pertencimento", conclui Fernando, que diz que, em breve, os dias e horários para visitação serão divulgados.

O artista e secretário de cultura de Taquarana, Igor Rozza, acredita que a construção conjunta do museu contribuiu para a cultura local. "Os sítios que estão perto do Varas se juntaram para a construção do museu, têm uma importância cultural muito grande para o município, porque as pessoas de lá acabaram se juntando para que o Fernando conseguisse realizar esse sonho".


Pertencimento e memória sentimental

Meio tímida e receptiva, a pesquisadora Michelayne de Melo, de 26 anos, fala ao telefone com uma sensação de dever cumprido. Ela está há três meses trabalhando com Fernando na restauração e catalogação das peças do museu. É Michelayne que apura e organiza os objetos do local com um olhar mais técnico.

A pesquisadora conta que no momento há 83 peças catalogadas, mas no total o museu reúne mais de 900 objetos. Michelayne, Fernando e cerca de 10 pessoas, incluindo a família dele, contribuem para os trabalhos.

O espaço é dividido em três partes: música, literatura e religiosidade. Há diversos cadernos de literatura de cordel de artistas locais e de outros municípios, além de um grande acervo com cerca de 400 discos, de música que vai de Maria Bethânia a Luiz Gonzaga. Há um espaço com imagens que trazem uma memória ritualística de benzedeiras de Taquarana. Um oratório foi também instalado em outro cômodo da casa.

"Desde 2005, Fernando vem colecionando coisas antigas sem utilizar o olhar técnico, mas de ancestralidade, então entrei nessa empreitada para ajudá-lo. O acervo vibra a cultura musical, a cultura religiosa à literária, como também artefatos do homem do campo. É um trabalho difícil, mas gratificante", comenta a pesquisadora.

Ainda segundo Michelayne, o espaço físico do museu não conta só como algo memorialístico, mas também com o sentimento de pessoas que moravam e moram na cidade. Ela lembra que nós somos o centro e nesse centro há ramos que criam nossa identidade, e é no museu que as pessoas podem se encontrar com seus antepassados.

"A partir do momento que criamos espaços como esse criamos também a identidade do nosso povo, que não fica só na lembrança, fica também o sentimento de pertencimento desse local. Essas peças são uma troca de experiências e sentimentos, porque cada pessoa que entra ali remota o seu passado. É uma memória sentimental, de um pai, de uma mãe, de um cotidiano que tinha com a família, com aquele objeto".