Baleia Azul: jogo ligado às mortes de dois jovens requer atenção dos pais
Um jogo virtual de desafios, via Facebook ou Whatsapp, que vão de automutilação ao suicídio, pode estar ligado às mortes de dois adolescentes no Brasil nessa semana. Chamado de Baleia Azul, a interação pode ter induzido a morte de uma mato-grossense de 16 anos, que foi encontrada em uma represa no dia 11, e um mineiro, de 19, que teve uma overdose de remédios, no dia 12.
Apesar de não ter confirmação de que os suicídios dos jovens foram induzidos pelo jogo, as polícias civis dos dois estados tiveram indicações em ambos os casos de que as vítimas estariam participando dos desafios. No caso do Mato Grosso, a mãe da menina disse que a filha já havia feito cortes nos próprios braços e que deixou duas cartas em que conta dos desafios. Já em Pará de Minas foi encontrado no celular do rapaz um grupo de whatsapp chamado "Blue Whale" (Baleia Azul, em inglês) com pessoas de diversas regiões do país e onde ele enviou uma mensagem de despedida pouco antes de se matar.
No entanto, independentes da confirmação da indução do suicídio e da relação com a Baleia Azul, esses casos acedem o alerta para o fato de que os adolescentes brasileiros estão em contato com a "brincadeira" e de que é preciso atenção. "Esse jogo pode atrair os jovens pela curiosidade do desafio, só para ver o que é, mas também jovens mais vulneráveis. E pode ser a gota d'água para quem já está no limite do sofrimento", explica a psicóloga especialista em prevenção ao suicídio, Karen Scavacini.
Jogo é um risco para jovens depressivos e até para curiosos
Em uma busca rápida no Facebook é possível encontrar mais de dez grupos com o nome Baleia Azul. Vários deles estão focados em combater o jogo, mas outros apresentam uma mistura de publicações "zoando" os desafios e outras de adolescentes perguntando como fazem para participar. Uma lista com os 50 desafios propostos pode ser encontrada facilmente na internet, mas teoricamente o Baleia Azul funcionaria com base na atuação de "curadores" que garantiriam o cumprimento dos desafios – desde fazer cortes na pele formando palavras ou desenhos, até passar 24 horas vendo filmes de terror. O desafio final seria o suicídio.
Os adolescentes e pré-adolescentes estão em uma fase em que ainda não percebem as consequências de seus atos. E esse jogo pode atrair não só aqueles em situação vulnerável, mas também outros, pela sedução da emoção que os desafios propõem.
Para Karen, a febre da Baleia Azul traz algo que se assemelha a outros movimentos virtuais que aconteceram em anos anteriores, como em 2012, quando jovens com anorexia criavam blogs para postar e cultuar as fotos de seus corpos abaixo do peso. "Na vida em sociedade, todos precisamos de pertencimento. Jovens que têm uma sensação de não pertencer, podem encontrar nesses movimentos a sensação de ser parte de um grupo, de ter alguém que entenda o que está passando. O jogo ainda traz uma questão também de poder falar que está jogando, de ser bacana".
No entanto, mesmo aqueles que não tenham ideações suicidas ou um quadro depressivo, que tenham entrado no jogo só pela curiosidade, podem ter problemas. "O adolescente imaturo pode se sentir acuado. Depois de cumprir alguns desafios, ele pode ter medo de ser descoberto, de ter feito algo errado e isso levar ao suicídio", diz a psicóloga. Por isso, ela considera que é essencial que os pais não só fiquem atentos, mas conversem com os filhos sobre o assunto.
Os pais precisam ficar de olho
A moda do jogo virtual surgiu na esteira da estreia do lançamento da polêmica série do Netflix "13 Reasons Why", que também aborda a temática do suicídio. "A gente tem visto um aumento no número de suicídios e depressão entre jovens no Brasil, por isso esse assunto está tão latente. É essencial que se fale disso. O diálogo é o principal caminho para a prevenção", reforça Karen.
Ela recomenda que os pais conversem com seus filhos sobre o jogo, digam que estão preocupados, abertos a conversar e que ofereçam ajuda. Proibir e controlar o acesso a internet não são recomendados, pois podem gerar mais interesse, mas ter regras para o uso da tecnologia é importante. "Além disso, no caso de adolescentes que ainda não têm maturidade para entender os riscos e consequências do que fazem, olhar histórico de navegação e trocas de mensagens não é invasão de privacidade, é cuidado, proteção".
E se os pais perceberem que o filho está participado mesmo da brincadeira e chegando a se colocar em risco ou se machucar, é importante levar a um profissional para que seja feita uma avaliação mais profunda de como o adolescente está.
Escola cria um jogo resposta à Baleia Azul
Como dentro de casa nem sempre o diálogo é aberto, a equipe do colégio FECAP, em São Paulo decidiu trazer para dentro da escola a questão do jogo. Ao saber da Baleia Azul, os funcionários realizaram uma reunião e bolaram um plano para lidar com o assunto. Como a escola conta com um curso técnico de jogos digitais, a primeira proposta foi criar um jogo de resposta à Baleia Azul.
"Nós lançamos o desafio aos alunos: criarem um jogo com 50 tarefas opostas à Baleia Azul. Com atitudes éticas, coletivas, que pensem no respeito e na solidariedade", explica a coordenadora do colégio, Nilda Di Giacomo. A ideia surgiu também para dinamizar a conversa e incluir os jovens de maneira ativa no debate sobre suicídio.
A turma ficou animada e na hora topou o desafio. Além disso, a escola selecionou três professores para levarem debates sobre o assunto para as salas de aula e enviou um informe aos pais, explicando a nova moda digital e recomendando que conversem com seus filhos.
Par a coordenadora, o assunto, apesar de não ter nada a ver com a grande curricular, é pertinente à escola. "A gente ouve falar muito em jovens em depressão. Na medida em que eles estão doentes emocionalmente, que chegam laudos médicos falando sobre necessidade de acolhimento, de inclusão social, esse assunto vem para dentro do muro da escola, não tem como deixa-lo para fora".