Saúde

Alagoas registra 26 mil ligações ao CVV no primeiro semestre de 2021

Jovens tem psicológicos afetados negativamente pela pandemia da Covid-19

Por Felipe Guimarães* 12/09/2021 08h08 - Atualizado em 13/09/2021 12h12
Alagoas registra 26 mil ligações ao CVV no primeiro semestre de 2021
OMS estima que 322 milhões de pessoas pelo mundo sofrem de depressão - Foto: Pixabay

Há mais de um ano, nenhum de nós poderia imaginar como estaríamos vivendo nos dias de hoje. Em poucos meses, a população brasileira foi orientada a deixar de frequentar bares, festas, visitar os seus parentes e ficar isolada em casa, saindo apenas para se fazer o necessário.

Essas restrições, somadas ao medo constante da morte iminente e a dor de perder aqueles que amamos, afetaram negativamente a saúde mental de muitas pessoas. Em Alagoas, no ano de 2020, o Centro de Valorização a Vida (CVV), serviço responsável por prestar apoio emocional e de prevenção ao suicídio por teleatendimento, registrou 33.612 ligações entre os meses de Abril e Dezembro daquele ano.

Em 2021, o último levantamento registrou 26.049 ligações somente nos primeiros seis meses deste ano, demonstrando uma grande procura pelos serviços de apoio emocional.

Para a voluntária do CVV, Tamira de Almeida, cada ligação recebida precisa de um cuidado especial. “Não tem ligação mais difícil que outra, toda situação é delicada e requer nossa atenção. Tem ligações que demandam mais tempo para a outra pessoa se sentir atendida, satisfeita ou acolhida em sua dor. Cada pessoa que liga trás uma situação própria, sob a própria ótica”, explicou.

Tendo iniciado a sua contribuição no CVV pela vontade de ajudar ao próximo, Tamira afirma ser comum atender mais pessoas durante o nono mês do ano, por conta da campanha brasileira de prevenção ao suicídio, o Setembro Amarelo.

Algumas opções para pessoas em busca de atendimento psicológico gratuito. Foto: 7Segundos


“A procura tende a aumentar porque acontece a divulgação do serviço, isto pode encorajar alguns a buscar o serviço enquanto alternativa de acolhimento ou mesmo despertar curiosidades em outros”, disse a voluntária.

De acordo com uma pesquisa divulgada pelo laboratório Pfizer, 39% das pessoas de 18 a 24 anos relataram uma piora em sua saúde mental durante a pandemia.

Por conta dessa tendência, a nossa reportagem buscou ouvir o relato da estudante Luanna Macedo, de 21 anos. Para ela, não poder sair mais de casa agravou negativamente o seu psicológico.

Luanna Macedo é estudante de psicologia. Foto: arquivo pessoal



“Quando minha ficha caiu de que realmente estávamos vivendo numa pandemia, sem poder sair de casa, tendo que usar máscara, vendo muitas pessoas sendo infectadas e morrendo, aquilo começou a mexer muito comigo. Eu que antes via mais meus amigos, saía mais pra me divertir, acabei não podendo mais sair mais de casa. Me senti muito solitária em alguns momentos, fui perdendo a vontade de fazer as coisas, porque é cansativo ficar em casa diante de tantas notícias ruins”, relatou.

Para tentar manter o equilíbrio, Luanna resolveu retornar para a terapia, a fim de encontrar maiores forças para enfrentar a pandemia. Por conta das restrições, a estudante precisou se adaptar ao chamado “novo normal” e iniciou o seu tratamento de forma remota.

“Procurei a minha antiga psicóloga e fiz terapia online. Busquei ajuda terapêutica quando percebi que já estava muito mal e precisava de um profissional que me ajudasse a lidar com tudo que estava acontecendo. Tanto o número de mortes quanto o isolamento social tem me afetado muito. Sinto muita empatia por todos que se foram e me vejo indignada por pessoas estarem sendo mortas. Algumas que já fizeram parte da minha vida acabaram sendo vítimas da doença e tenho muito medo que aconteça com mais pessoas”, comentou.

Quando buscar ajuda?


Uma dúvida bastante comum é a de saber quando se deve buscar ajuda profissional para os problemas que sentimos. Buscando orientar a população, a psicóloga Bárbara Oliveira explicou quais os primeiros sintomas.

“Os sinais, que quando progridem podem se transformar em sintomas, variam muito de pessoa para pessoa, já que levam em consideração a estrutura psíquica do sujeito, seu esquema emocional e formas de enfrentamento diante de situações desafiadoras. De uma forma geral, deve-se prestar atenção quando os pensamentos ou comportamentos estão interferindo nas funções do dia a dia, sejam essas funções no âmbito profissional, escolar, alimentar, nas relações interpessoais, etc. Ou seja, quando você percebe que coisas que costuma fazer começam a te desgastar mais do que o normal", explicou.


Questionada do motivo pelo qual os jovens entre 18 a 24 anos estarem se destacando como o principal grupo a apresentar uma piora em sua saúde mental a psicóloga explico que em sua visão, essa é uma problemática sistêmica.

“Acredito que possa estar relacionado com a estrutura e forma de funcionamento do modelo socioeconômico atual. Jovens adultos estão passando por várias mudanças simultâneas e desafiadoras para tentar ingressar em um sistema que prega a máxima de se tornar cada vez mais eficiente e proativo, afinal é um sistema que gira em torno da produção. Ou seja, para além de qualquer fator pessoal que possa ser somado a esse agravamento, já existe uma pressão pré estabelecida da família, da sociedade e por consequência, de si mesmo, em obter sucesso”, disse.

A boa notícia para esse grupo é que as redes sociais, essenciais para os jovens, também podem servir como uma aliada na busca por melhorar a sua saúde mental. Porém, é necessário cuidado.

Psicóloga Bárbara Oliveira. Foto: arquivo pessoal



“A frase ‘o que diferencia o remédio do veneno é a dose’ se enquadra muito bem nessa questão. As redes sociais são uma fonte democrática de acesso ao conhecimento, porém é um acesso que se feito sem cuidado, pode trazer mais desinformação do que benefício. São ótimas para que se encontre facilmente espaços de acolhimento e atendimento próximos a você, mas não devem ser usadas como processo terapêutico em si, mesmo que sejam grupos ou fóruns de outras pessoas em situação similar”, afirma a psicóloga.

Uma outra ferramenta apontada por Bárbara são os próprios serviços de teleatendimento, como o próprio CVV, utilizados muitas vezes em casos extremos. Utilizando-os de forma efetiva, eles podem abrir portas para um acompanhamento profissional mais elaborado.

“Primeiro gostaria de explicar que os serviços de teleatendimento não substituem o acompanhamento terapêutico, pelo contrário, eles são muito usados em caráter de urgência, muitas vezes como última alternativa antes de se tomar uma decisão drástica ou quando o indivíduo necessita de amparo e não tem ou não consegue a quem recorrer, embora esses não sejam os únicos casos, pois podem também ser utilizados como fonte de informação de qualidade para que se possa dar o primeiro passo. Os atendimentos sempre são gratuitos e sigilosos, tudo para dar o máximo de conforto para quem está necessitando falar e ser ouvido. É comum que após esse contato, a pessoa sinta-se pronta para procurar ajuda profissional mais específica, então ainda que sirva "apenas" para amenizar as dores emocionais, considero um serviço muito importante e com consequências muito positivas para quem o recebe”.

Para compreender melhor os impactos causados pela pandemia na saúde mental dos indivíduos, o 7segundos entrou em contato com o Conselho Regional de Psicologia de Alagoas (CR-15), em busca de possíveis dados para se trabalhar este tema. Contudo, o Conselho explicou que ainda não se há dados ou pesquisas concluídas sobre o assunto.

No momento, as melhores recomendações a serem tomadas para lidar com a crise sanitária da Covid-19 e o seus possíveis impactos, são a vacinação, o uso de máscaras, álcool em gel e a busca por profissionais capacitados para lidar com problemas de saúde mental.

*Com supervisão da editoria