Política

Bolsonaro nega intenção de atacar STF e diz que falou 'no calor do momento' no 7 de Setembro

Antes dos atos em seu apoio no 7 de Setembro, Bolsonaro disse que os protestos tinham objetivo de "enquadrar" o STF

Por BBC News 09/09/2021 20h08
Bolsonaro nega intenção de atacar STF e diz que falou 'no calor do momento' no 7 de Setembro
Bolsonaro recua após chamar Moraes de 'canalha' e ameaçar não cumprir suas decisões - Foto: Presidência da República

Após dias de ataques inflamados ao Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente Jair Bolsonaro baixou o tom por meio de uma nota oficial nesta quinta-feira (09/09). No comunicado, o presidente disse que autoridades não têm o direito de "esticar a corda" e que não teve intenção de agredir outros Poderes.

O recuo retórico veio após caminhoneiros bolsonaristas travarem dezenas de rodovias no país em apoio aos ataques do presidente contra o Poder Judiciário. Bolsonaro, porém, ficou preocupado com o impacto dessa mobilização na economia e pediu na noite de quarta-feira que seus apoiadores liberassem as estradas.

"Nunca tive nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes. A harmonia entre eles não é vontade minha, mas determinação constitucional que todos, sem exceção, devem respeitar", diz o comunicado.

Após chamar o ministro do STF Alexandre de Moraes de "canalha" em discurso na Avenida Paulista durante ato em seu apoio no feriado de 7 de setembro, Bolsonaro indicou ter se excedido.

"Sei que boa parte dessas divergências decorrem de conflitos de entendimento acerca das decisões adotadas pelo Ministro Alexandre de Moraes no âmbito do inquérito das fake news. Mas na vida pública as pessoas que exercem o poder, não têm o direito de 'esticar a corda', a ponto de prejudicar a vida dos brasileiros e sua economia", diz ainda o comunicado.

"Por isso quero declarar que minhas palavras, por vezes contundentes, decorreram do calor do momento e dos embates que sempre visaram o bem comum", acrescentou o presidente.

Moraes é relator de investigações contra Bolsonaro e seus aliados, entre elas o inquérito das Fake News, citado na nota presidencial.

O presidente e seus apoiadores consideram que o ministro tem cometido abusos e desrespeitado a liberdade de expressão ao determinar a prisão de seus aliados, inclusive porque algumas dessas decisões foram tomadas sem participação da Procuradoria-Geral da República.

Já os que apoiam a atuação do ministro dizem que os investigados nesses inquéritos cometem crimes ao ameaçar ministros do STF e defender o fechamento da Corte e do Congresso Nacional.

Antes dos atos em seu apoio no 7 de Setembro, Bolsonaro disse que os protestos tinham objetivo de "enquadrar" o STF. E, ao discursar no feriado, chegou a dizer que não cumpriria decisões de Moraes.

"Deixe de oprimir o povo brasileiro. Nós devemos sim, porque eu falo em nome de vocês, determinar que todos os presos políticos sejam postos em liberdade. Dizer a vocês que qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, esse presidente não mais cumprirá", discursou, na Avenida Paulista.

Já na nota divulgada nesta quinta-feira, o presidente reconheceu que decisões judicias devem ser contestadas dentro dos trâmites jurídicos.

"Em que pesem suas qualidades como jurista e professor, existem naturais divergências em algumas decisões do Ministro Alexandre de Moraes. Sendo assim, essas questões devem ser resolvidas por medidas judiciais que serão tomadas de forma a assegurar a observância dos direitos e garantias fundamentais previsto (sic) no Art. 5º da Constituição Federal", afirmou o presidente.

"Reitero meu respeito pelas instituições da República, forças motoras que ajudam a governar o país. Democracia é isso: Executivo, Legislativo e Judiciário trabalhando juntos em favor do povo e todos respeitando a Constituição", continuou.

Bolsonaro disse também que sempre esteve "disposto a manter diálogo permanente com os demais Poderes pela manutenção da harmonia e independência entre eles".

Mensagens em grupos de caminhoneiros revelam racha na categoria sobre apoio ao bloqueio de rodovias - Foto: EPA

E finalizou a nota agradecendo "o extraordinário apoio do povo brasileiro, com quem alinho meus princípios e valores, e conduzo os destinos do nosso Brasil".

Os apoiadores mais radicais do presidente, porém, demostraram frustração com seu recuo nos últimos dias. O áudio de Bolsonaro pedindo o fim dos bloqueios de rodovias pelo país provocou grande confusão em grupos de caminhoneiros e apoiadores do presidente no WhatsApp, Telegram e redes sociais monitorados pela BBC News Brasil.

Alguns bolsonaristas que participam da paralisação se disseram "decepcionados" e "traídos", enquanto muitos se recusam a acreditar que a voz seja de Bolsonaro, mesmo depois de o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, gravar um vídeo confirmando a autenticidade.

Reação do Judiciário

A manifestação em tom mais brando de Bolsonaro veio após o presidente do STF, Luiz Fux, e o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, reagirem com dureza aos ataques de Bolsonaro.

Na quarta-feira, Fux enfatizou que ignorar decisões judiciais configuraria crime de responsabilidade, o que poderia culminar na abertura de um processo de cassação contra Bolsonaro.

"O Supremo Tribunal Federal jamais aceitará ameaças à sua independência nem intimidações ao exercício regular de suas funções", disse Fux, ao abrir a sessão de julgamento do STF.

"O Supremo Tribunal Federal também não tolerará ameaças à autoridade de suas decisões. Se o desprezo às decisões judiciais ocorre por iniciativa do Chefe de qualquer dos Poderes, essa atitude, além de representar um atentado à democracia, configura crime de responsabilidade, a ser analisado pelo Congresso Nacional", reforçou.

Já Barroso voltou a repudiar os ataques de Bolsonaro ao sistema eletrônico de votação. Sem apresentar provas, o presidente tem levantado dúvidas sobre a segurança das urnas brasileiras.

"A democracia tem lugar para conservadores, liberais e progressistas. O que nos une na diferença é o respeito à Constituição, aos valores comuns que compartilhamos e que estão nela inscritos. A democracia só não tem lugar para quem pretenda destruí-la", disse o presidente do TSE.