Justiça

'A senhora deveria voltar a estudar?, diz advogada de Lindemberg à juíza

Magistrada havia afirmado desconhecer aplicação do princípio da ‘verdade real’ 

Por O Globo 14/02/2012 15h03
'A senhora deveria voltar a estudar?, diz advogada de Lindemberg à juíza
No momento mais tenso do julgamento de Lindemberg Alves, acusado de matar a ex-namorada Eloá Pimentel, em outubro de 2008, a promotora Daniela Hashimoto afirmou que a advogada do réu, Ana Lucia Assad, poderia responder por desacato à autoridade por uma declaração dada na tarde desta terça-feira. Em uma discussão sobre as atas do processo, Ana Lucia questionou a juíza Milena Dias sobre uma aplicação do princípio da “verdade real”. A magistrada afirmou que desconhecia a aplicação e a defensora rebateu dizendo: “então a senhora deveria voltar a estudar”. Neste momento, houve exaltação por parte dos presentes ao plenário.

"Como promotora de Justiça, devo informar que a senhora (advogada) pode responder por desacato à autoridade aqui constituída, que é a juíza que preside a sessão. A senhora tem de estar ciente disso", disse a promotora.

A discussão ocorreu durante o depoimento de Dairfe Pereira Lopes, perita que analisou as armas utilizadas no crime. No testemunho, Dairfe apenas ratificou que os projéteis extraídos de Eloá saíram de uma arma calibre 32.

O julgamento de Lindemberg, que está no segundo dia, foi retomado pouco depois das 14h. Após a pausa para o almoço, foram ouvidos os jornalistas da TV Bandeirantes Rodrigo Hidalgo e Márcio Campos, ambas testemunhas convocadas pela defesa do réu. A convocação faz parte da estratégia da advogada Ana Lucia Assad em relacionar o desfecho do caso à pressão pela qual teria sido submetido o réu.

No interrogatório, a advogada de Lindemberg chegou a perguntar para Hidalgo se a imprensa contribuiu com a tragédia, mas o questionamento foi indeferido pela juíza Milena Dias. Os dois jornalistas relataram que receberam instruções de não tentar contato telefônico com Lindemberg ou com as reféns, mas confirmaram que outras duas emissoras falaram com o motoboy no interior da casa.

"Por mais que a nossa emissora não concordasse, e eu não concordo com a postura de alguns colegas, em nenhum momento essas conversas induziram Lindemberg ao crime. Pelo contrário. Era uma tentativa de acalmá-lo e tranquilizá-lo", disse Campos.

Um momento de indecisão, no fim desta manhã, provocou um outro tumulto no segundo dia de julgamento. A advogada do réu desistiu de ouvir a mãe de Eloá, Ana Cristina Pimentel, arrolada como testemunha de defesa. A medida teria sido uma manobra de Ana Lucia Assad para tirar a mãe de Eloá da plateia - Ana Cristina foi colocada numa sala secreta nesta segunda-feira - e evitar comoção por parte de jurados.

Pela manhã, antes da pausa para o almoço, a mãe de Eloá sentou na cadeira de testemunhas e encarou Lindemberg, que ficou observando o chão ou desviando o olhar. Por volta das 11h15m chegou a ser dispensada. A desistência gerou um bate-boca entre os advogados de defesa e acusação. Os assistentes da Promotoria afirmaram que gostariam de ouvir a mãe da vítima como testemunha do júri. A juíza chegou a aceitar o pedido, mas a advogada de Lindemberg ameaçou se retirar do plenário. A acusação, então, voltou atrás, e não ouviu a mãe de Eloá.

"Esse julgamento está ameaçado. A defesa toda hora ameaça abandonar o júri", disse um dos assistentes da acusação, o advogado Ademar Gomes.
A defesa de Lindemberg também chegou a abrir mão do depoimento do irmão caçula de Eloá, Everton Douglas, de 15 anos. Mas a Promotoria não aceitou a dispensa e o jovem foi ouvido como testemunha do juízo, de acordo com o Tribunal de Justiça.

Após o imbróglio, Ana Cristina Pimentel assistiu ao depoimento no plenário. E novamente olhou para Lindemberg. Na saída do Fórum, declarou que não sente que Lindemberg se arrependeu do crime e que sussurrou para ela, que entendeu que a frase dita foi: “Não fala mal de mim”. Abalada, a mãe de Eloá afirmou: - Ele é um assassino.

"Quando a promotora me chamou, ela (advogada de Lindemberg) se manifestou, deu piti, não quis mais que eu falasse", conta a mãe de Eloá.
Por conta dos tumultos ocorridos na manhã desta terça-feira, não está confirmado o depoimento de Lindemberg neste segundo dia de julgamento.
Irmão de Eloá chama réu de “monstro”

Ronickson Pimentel dos Santos, irmão mais velho de Eloá, foi a primeira testemunha a prestar depoimento nesta terça-feira. Ele disse que Lindemberg traiu a confiança da família de Eloá.

"Meu pai e minha mãe tinham ele como um filho. Mas ele tinha duas personalidades: uma para nós e outra fora de casa",  falou Ronickson.

Perguntado sobre como definiria Lindemberg atualmente, o irmão de Eloá disse que o réu era “um monstro” capaz de tudo.

Os trabalhos neste segundo dia de júri começaram por volta das 9h30m, cerca de uma hora após a chegada do acusado ao Fórum de Santo André, no ABC paulista. Lindemberg passou a noite no Centro de Detenção Provisória de Pinheiros, na Zona Oeste de São Paulo, a 30 km do fórum.

Na chegada do Fórum, a advogada Ana Lucia Assad foi bastante hostilizada por populares que se encontram em frente ao local. Ela foi chamada de “defensora de assassino”. Ana Lucia afirmou que entende a emoção provocada pelo julgamento, mas lembrou que exerce o papel constitucional.

"O Lindemberg tem direito a uma defesa técnica. Só com essa defesa pode-se manter Justiça", disse a advogada do réu.

Outras seis testemunhas, todas arroladas pela defesa, devem prestar depoimento nesta terça-feira. Lindemberg, que nunca falou sobre o caso desde 2008, também pode ser ouvido e quebrar o silêncio.

Nesta segunda-feira, primeiro dia de júri, os depoimentos dos estudantes Vitor Lopes de Campos e Iago Vilera de Oliveira, amigos de Eloá Pimentel mantidos reféns pelo motoboy, confirmaram o testemunho dado antes por Nayara Rodrigues, de que o réu falava em matar a ex-namorada desde que entrou no apartamento da vítima.