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Pai e filhos: uma relação que tem se transformado

Por Redação 10/08/2014 09h09
Pai e filhos: uma relação que tem se transformado
Pai e filho têm uma relação para além da paternidade. - Foto: Arquivo pessoal

“Mãe só tem uma, mas pai se encontra em qualquer esquina”. A frase proveniente do senso comum reflete um preconceito ainda vivo na sociedade acerca da participação da figura do pai na criação dos filhos, o que nem sempre faz jus a relações completas e cheias de afeto entre pai e filho.

O psicólogo Aluízio Costa defende, entretanto, que uma mudança tem se estabelecido nas famílias atuais, tornando o pai mais participativo nas relações com os filhos. “Saiu o modelo do pai castrador que não é afetivo e que só estabelecia regras e desenvolveu-se, nos últimos tempos, a figura do pai presente que é afetivo, dialoga, brinca, participa mais ativamente da vida dos filhos e os ensina mais que valores morais, ensina a ser e viver no mundo com afeto/carinho/amor”, explica.

O artista plástico e servidor público, Cícero Brito, de 59 anos, tem dois filhos e se orgulha de ser um pai totalmente diferente daqueles de sua geração. Ele afirma que se esforça para participar da vida dos rebentos, como um amigo, sem, com isso, perder a autoridade. “Para mim, é um privilégio ser pai atuante de dois filhos maravilhosos. Tenho um relacionamento muito bom com meus filhos”, afirma.

Cícero é pai do jornalista Breno Airan, de 24 anos, que o vê como uma referência e não economia nos elogios. “Meu pai é tão bacana que, se eu não fosse filho dele, gostaria de ser pelo menos afilhado. ‘Vou sempre respeitá-lo, sobretudo enquanto morar debaixo de seu teto. Mas ele é bem brando. Sabe ouvir, dialogar. E a gente nunca discutiu por nada, que eu me lembre. Acho que essa é uma vantagem nossa”, diz.

Graças a essa relação amistosa, Cícero influenciou até o gosto cultural de Breno. “Nossas paixões são as artes. Herdei dele essa vontade de me expressar de algum modo. Desde pequeno, ele me incutiu sutilmente o gosto pela música. Aqui em casa, há um local que chamo até hoje de "Sala de Som". Era todo um universo Rock N' Roll... (Que sorte eu tive, meu pai, de "sair" de você!)”, declara.

As experiências cotidianas também se tornaram inesquecíveis para ambos. Breno faz questão de contar sobre a lembrança de um dia que foram juntos ao cinema. ‘Certa feita, fui com ele ao cinema e logo avisei: "Se ligue que esse filme é caótico; tem umas bruxas e tal. Terror!". E ele olhou pra mim com aquela cara de quem diz "Meu amigo, eu assisti a ‘O Exorcista’ na década de 1970, então o que vier é fichinha". Uma onda”, relata.

Por tudo isso, Cícero representa a verdadeira figura do herói, que constrói, por meio de gestos diários, a figura de um pai presente e sempre disponível. “No mais, ele é mesmo meu herói. É Dia dos Pais, mas minha mãe também leva os créditos - eu a amo. Os dois. E meu irmão também”, confessa.

Leia a entrevista completa com o psicólogo Aluízio Costa 


A presença do pai, segundo Aluízio Costa, é fundamental para o desenvolvimento saudável dos filhos. O psicólogo explica melhor a relação e a importância da presença da figura paterna nesse processo de crescimento na entrevista abaixo concedida ao Portal 7Segundos. Confira:

Sete Segundos: Quão relevante é a participação do pai para a formação do indivíduo?

Aluízio Costa: A figura paterna estabelece com a criança a compreensão de que existem outros além da mãe, pois o bebê de início entende a relação com a mãe como única. Mais tarde a figura paterna estabelece limites de relação, onde faz o bebê perceber que existem outros no mundo com quem ele aprenderá não só a amar, mas a conviver e a vivenciar as variadas experiências da vida, em especial os diversos afetos. No futuro essa relação constitui ponto importante na estruturação da personalidade no que se refere a regras e valores, que deverão ser aprendidos pela criança. É através de presença paterna que esse novo ser conseguirá compreender que existem outras pessoas no mundo, além dele e da mãe e que o afeto tem que ser compartilhado com outros.

Sete Segundos: Como os pais podem participar mais da vida dos filhos?

Aluízio Costa: Estar presente tem sido a máxima para as novas gerações de pais. Saiu o modelo do pai castrador que não é afetivo e que só estabelecia regras e desenvolveu-se, nos últimos tempos, a figura do pai presente que é afetivo, dialoga, brinca, participa mais ativamente da vida dos filhos e os ensina mais que valores morais, ensina a ser e viver no mundo com afeto/carinho/amor. As figuras paternas da atualidade contribuem para os filhos construírem uma personalidade mais integral.

Sete Segundos: É preciso mudar essa visão de que o pai não é tão necessário quanto a mãe? 

Aluízio Costa: Deve sim mudar este conceito e crença errônea de que pai é dispensável, por mais que se fale que a relação de amor da mãe com a criança se inicie no ventre materno, os pais estão presentes, ficam grávidos com as mães, amam seus filhos. São, sim, modelos diferentes de amor, mas não dá para dispensar ou diminuir a relação de amor pai-filho. Assim como se fala do instinto materno também há o instinto paterno e o desejo de cuidar e amar o filho.

Sete Segundos: Por que a relação com o pai costuma ser mais distante?

Aluízio Costa: Este modelo cultural ainda está muitas vezes arraigado na sociedade que identifica a figura da mãe como possuidora do filho, ao pai cabe apenas criar (manter). A mulher foi educada para cuidar da casa e filhos, o homem com a obrigação de prover, sócio-historicamente tem se quebrado tal padrão cultural. Este modelo ultrapassado criava o distanciamento afetivo pai-filho e esta carência de contato com o pai, sobretudo de um contato corporal cotidiano com ele, deixa um déficit que se encontra inclusive na experiência futura e ser pai.

Sete Segundos: Como mudar esses conceitos?

Aluízio Costa: Aprendemos a ser pai com a experiência de paternagem que tivemos. Os novos pais devem entender que compartilhar a aventura do descobrimento, que é brincar e adquirir conhecimento com seus filhos, une definitivamente e constrói um laço afetivo único e referencial para a vida. Se não suceder assim, surge um sentimento de desamparo, de inferioridade e de abandono.

Sete Segundos: Quais as consequências da falta do afeto paterno?

Aluízio Costa: As consequências da carência paterna são tão graves como as da materna, mas só recentemente foram estudadas com profundidade. As necessidades do filho tornam aconselháveis que um pai comporte com a mãe parte do cuidado afetivo-emocional de seu filho assim estruturando sua personalidade. Na mesma proporção que uma criança necessita de sua mãe, necessita do amor de seu pai.

Sete Segundos: Isso traz novas exigências para o homem/pai?

Aluízio Costa: A paternidade exige do homem um desprendimento e uma entrega de afeto que o leva a um crescimento pessoal e à maturidade afetivo-emocional. O segredo do papel paterno é ter tempo para estar em contato com seu filho e registrar as mudanças, ter flexibilidade suficiente para se adaptar às novas necessidades advindas de cada fase da vida do filho, ajustando cada período desenvolvimental dele, aprendendo como pai o tão difícil equilíbrio entre “permitir e proibir” e assim estruturar uma personalidade sadia, constituindo um ser humano saudável e íntegro. A única e indispensável experiência para o desenvolvimento da vida está em seu alicerce nas figuras paternas e maternas, que “são nossas maiores feridas”, são também nossos maiores alicerces de existência e constituição como sujeitos, são nossas fontes de identificação e desenvolvimento e no futuro seremos cópias reproduzindo com nossos filhos aquilo que aprendemos com eles.