Inverno traz baixas temperaturas e charme ao município sertanejo de Água Branca
A cidade também conta com um rico acervo histórico e arquitetônico preservados
Sentir frio no sertão não é algo tão comum assim, mas, em Água Branca, município do Alto Sertão alagoano com pouco mais de 20 mil habitantes, a temperatura baixa um pouco nessa época do ano e o friozinho bate forte durante o mês de julho, principalmente nas primeiras horas do dia e ao entardecer.
Durante a noite e na madrugada, então, andar agasalhado e dormir com um aconchegante cobertor é essencial para quem é mais sensível às baixas temperaturas que chegam facilmente aos 14 ou 15 graus em média.
Localização
A explicação para o frio de Água Branca está na geografia do município, que fica situado numa região serrana. O ponto mais alto da cidade, conhecido como Mirante do Calvário, está a 730 metros de altitude em relação ao nível do mar.
Geralmente o mirante amanhece coberto por uma forte neblina que aos poucos, vai baixando, até encobrir parte das ruas de pedra do centro da cidade (Veja mais imagens na galeria de fotos).
Água Branca reaparece diante da neblina. Foto: cortesia/Valter Sousa
Quando a neblina vai se dissipando lá no Mirante do Calvário, se tem um visual privilegiado de grande parte do alto sertão de Alagoas. Lá de cima, durante o dia, enxerga-se uma imensidão de terras a perder de vista, e ao longe, dá até para ver algumas cidades sertanejas, como a vizinha Delmiro Gouveia, por exemplo.
À noite, a iluminação artificial sinaliza a posição de outras cidades e povoados próximos, como se fossem constelações na escuridão do céu.
Mudança no visual
Nessa época do ano, o figurino dos moradores de Água Branca também muda. A jaqueta, o casaco e o agasalho saem do armário e fazem parte do dia a dia das pessoas que saem de casa cedo para trabalhar.
Serração transforma o visual da paisagem seca em Água Branca. Foto: cortesia/Valter Sousa
Durante a noite também é comum ver as pessoas vestidas da cabeça aos pés pelas ruas de Água Branca. Em algumas comunidades rurais, localizadas no alto das serras ao redor da cidade, sempre bate um vento forte no final da tarde que perdura até a madrugada e ao amanhecer durante o mês de julho e agosto, dando uma sensação térmica abaixo dos 10 graus centígrados.
Festival
O frio tornou-se tão tradicional em Água Branca nessa época do ano que há cerca de duas décadas o município começou a organizar um festival de inverno que se estendeu até os anos que antecederam a pandemia.
O festival era realizado sempre no final do mês de julho ou início de agosto e o objetivo era incentivar o turismo e proporcionar lazer para a população local.
Festival esquentava as noites frias de Água Branca. Foto: reprodução 7Segundos
Na programação, havia trilhas ecológicas e apresentações culturais durante o dia, além de shows com artistas da região e grandes nomes da música nacional no período da noite, a exemplo de Elba Ramalho, Geraldo Azevedo, Guilherme Arantes e Jorge de Altinho.
Turismo cultural
Por falar em turismo, pontos históricos para se conhecer em Água Branca não faltam. Para começar, vale ressaltar o conjunto arquitetônico do casario em estilo colonial que toma conta da área central da cidade que ainda preserva o antigo calçamento com enormes pedras a nos remeterem ao tempo dos colonizadores portugueses.
Água Branca preserva arquitetura do período colonial. Foto: cortesia/Valter Sousa
Dentre o rico acervo arquitetônico da cidade, vale destacar a casa do Barão e da Baronesa de Água Branca, localizada na área central da cidade e que pertencia aos descendentes do nobre casal, e que, recentemente, foi adquirida pelo município para ser transformada em museu.
Barão e baronesa de Água Branca
Joaquim Antonio de Siqueira Torres, o Barão de Água Branca, foi um nobre proprietário de terras e agropecuarista da região, que além de receber o título de Barão em 1879 através de um decreto imperial, foi agraciado também alguns anos antes com a comenda da Ordem de São Gregório Magno pela Papa Leão XIII por ter patrocinado a construção da igreja matriz de Nossa Senhora da Conceição, em 1871, inclusive utilizando a mão de obra escrava, segundo relatos históricos.
A secular igreja ainda se mantém preservada com os traços arquitetônicos originais, oferecendo aos visitantes, mais uma opção de ponto turístico na cidade.
Interior da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição em Água Branca. Foto: cortesia/Valter Sousa
Já o velho casarão onde viveram o Barão e a Baronesa de Água Branca já hospedou o Imperador Dom Pedro II quando o monarca esteve visitando a Cachoeira de Paulo Afonso em 1859.
Lampião
O imóvel também foi palco de um episódio marcante para a história. O primeiro assalto atribuído a Virgulino Ferreira da Silva, O Lampião, quando ainda dava os primeiros passos no cangaço, foi justamente à casa da Baronesa Joana Vieira Sandes, que à época era viúva.
Segundo os relatos históricos, o assalto teria acontecido por vingança de Virgulino que teria ficado aborrecido com a baronesa por ela ter se recusado a ajudar o cangaceiro algum tempo antes.
Segundo alguns historiadores, o assalto aconteceu em junho de 1922 quando Lampião e mais 30 homens, invadiram a casa da baronesa nas primeiras horas da manhã e de lá levaram joias, roupas, dinheiro, perfume, ouro e algumas cabras leiteiras.
Belezas na vegetação nativa em Água Branca. Foto: cortesia/Valter Sousa
Arte e cultura
Água Branca também preserva o artesanato da cultura afrodescendente produzido pelas mulheres que vivem na comunidade quilombola Serra das Viúvas, artesãs que herdaram o conhecimento da cultura ancestral através das gerações passadas.
As artesãs da Serra das Viúvas organizaram uma associação onde também produzem o artesanato feito com a palha do ouricuri, uma espécie de palmeira, principal matéria prima para a produção de objetos decorativos e peças utilitárias.
Rapadura
Em Água Branca também existe um velho engenho de açúcar que, além de preservado, ainda se mantém em atividade, moendo cana-de-açúcar e produzindo rapadura.
O sorvete de rapadura feito no Engenho São Lourenço já virou tradição e marca da cultura sertaneja, espalhada até por regiões mais distantes, como o litoral alagoano.
Todo o processo de produção do engenho é artesanal.
Produção de rapadura em engenho de Água Branca. Foto: cortesia/Valter Sousa
No engenho também funciona um restaurante decorado em ambiente rústico.
No restaurante os visitantes podem aproveitar para provar pratos típicos da culinária regional e experimentar o famoso sorvete de rapadura, além do tradicional mel de abelha.
Olhar sobre a cidade
Água Branca também conta com o olhar diferenciado de um fotógrafo premiado e apaixonado pela profissão e por sua cidade natal, que sempre que retorna para sua querida terra, consegue fazer belíssimos registros do lugar onde nasceu através de suas lentes e sua visão direcionada ao belo. Estou falando de Valter Sousa, que nos brindou com a maioria das fotos exibidas nesta reportagem. Veja mais fotos na Galeria de Imagens, ao final da página.
Fotógrafo Valter Sousa e seu acervo de fotos sobre Água Branca. Foto: cortesia