Filmes e séries com protagonismo negro viram realidade no Brasil
Produções criadas e protagonizadas por pessoas negras crescem no Brasil, mas representatividade tem espaço para aumentar no audiovisual
Aparentemente em crise, o nicho de heróis no cinema teve uma unanimidade em 2023: Homem-Aranha: Através do Aranhaverso, segundo filme do carismático Miles Morales. Mudando de gênero, tem a divertida ação Clonaram Tyrone, da Netflix. No Brasil, Mussum, o Filmes marcou a maior estreia nacional. Em comum, os três filmes narram histórias de pessoas negras e feitas por pessoas negras. Esses são exemplos de mudanças no mercado audiovisual e reforçam a necessidade de ampliar a representatividade.
Nesta segunda-feira (20/11), celebra-se o Dia da Consciência Negra e, nos tempos atuais, a data e propostas que visam maior diversidade (seja sexual, racial e suas intersecionalidades) são chamadas de “lacração” por grupos conservadores em redes sociais. Apesar da resistência, os dados indicam que o público entende a importância da representatividade.
Levantamento da Paramount Global, que ouviu 15,3 mil pessoas de 15 países (incluindo o Brasil), indica que 9 a cada 10 entrevistados concordam que a representatividade na televisão e nos filmes influencia na percepção que temos de determinados grupos ou pessoas.
Cientes da importância da inclusão, os entrevistados da pesquisa, no entanto, apontam para alguns problemas: 52% das pessoas que participaram do levantamento afirmam se sentir mal representadas em séries e filmes.
Alê Santos, autor do romance afrofuturista O Último Ancestral, pondera que, apesar da mudança do mercado internacional, a indústria brasileira ainda precisa evoluir na questão. “Filmes como Aranhaverso dão uma ligeira impressão que as coisas estão caminhando e faz com que as estruturas brasileiras se contentem com o sucesso estrangeiro e trabalhem pouco pelo produto nacional”, avalia. “Aqui no Brasil, os criadores negros não conquistaram esse espaço de criação do imaginário, estão focados apenas no realismo violento”, completa.
Ramos, que lança nesta quinta (23/11) Ó PAI Ó 2, assumiu o cargo de showrunner do Prime Video Brasil. Em um de seus primeiros projetos, ele dirigiu Um Ano Inesquecível – Outono, seu segundo filme atrás das câmeras após a estreia em Medida Provisória.
No filme, Gabz e Lucas Leto formam um inusitado casal. Ela odeia música e ele é um artista de rua. “É especial para mim porque vim de um filme com elenco negro, mas que falava de dor. Em Outono, é a black joy (alegria de ser preto, em tradução livre). Falamos de beijo na boca e valorização da música preta brasileira”, explicou Lázaro Ramos, em entrevista ao Metrópoles.
Nova produtora no mercado
Outra notícia que movimentou o mercado, no começo do mês, foi a inauguração do produtora Axé, inciativa da estrela mundial Viola Davis. Para Alê, por exemplo, a ideia é interessante, mas é preciso tomar cuidado para não perder a essência nacional. “Temos muitas narrativas e potências criativas acontecendo aqui no Brasil, espero que a produtora apoie a comunidade negra brasileira. Essa conexão possa ser uma ponte a mais para nos conectar com Hollywood”, considera.
Recentemente, também foram feitos investimentos em criações brasileiras focadas em histórias negras. O Star+, por exemplo, lançou em maio a série Dois Tempos, que conta a história de Paz (Sol Menezzes) e Cecília (Mari Oliviera). A primeira, uma influencer de 2022, troca de corpo com a segunda, escritora lésbica de 1922.
Nos cinemas, Mussum, o Filmis está em exibição e ostenta o posto de melhor estreia nacional de 2023, com uma renda de R$ 2 milhões no primeiro semana. O longa narra a trajetória do comediante, o único negro integrante do elenco principal do humorístico Os Trapalhões, sucesso nos anos 1980 e 1990.
Por trás do longa, está o diretor Silvio Guindane, que enxergou na trajetória do personagem um história que mistura música e humor, numa síntese do Brasil. “A gente está falando de um menino que foi para a Aeronáutica porque era a única saída, que foi um baita sambista, um baita de um filho, um baita pai. Tudo isso se reflete nos brasileiros, com a minha história e com a de quem vai assistir”, diz o cineasta.
Colaborou Raquel Martins Ribeiro