Saúde

Pacientes falam sobre doença celíaca e como venceram batalha contra o glúten

O glúten, vindo do trigo e de seus parentes, não fazia parte da dieta humana

Por Esmerino Neto - estagiário* 11/03/2018 07h07
Pacientes falam sobre doença celíaca e como venceram batalha contra o glúten
O trigo e seus derivados são os grandes vilões para quem é diagnosticado com Doença Celíaca - Foto: Reprodução | Google internet

Desde a época dos nômades, a alimentação dos seres humanos vem mudando. Com o intuito de armazenar comida, esses povos aprenderam a cultivar grãos, sobretudo, o centeio, a cevada e o trigo, que eram nutritivos, versáteis, estocáveis e valiosos para comercialização. Porém, esse mesmo avanço cobrou um alto preço: o surgimento de uma enfermidade agora diagnosticada como Doença Celíaca (DC), causada pela ingestão de uma proteína do trigo chamada glúten.

O glúten, vindo do trigo e de seus parentes, não fazia parte da dieta humana. Esses grãos entraram na indústria alimentícia e passaram a nutrir uma crescente comunidade, entretanto essas proteínas começaram a matar as pessoas, quando ainda não havia diagnóstico e seus corpos reagiam de forma anormal a elas.

 Maria Cláudia Carvalho, de 53 anos, conviveu com a Doença Celíaca por toda sua vida e só obteve seu diagnóstico há dez anos. Durante esse processo, passou por vários médicos e fez diversos exames até a descoberta.

“Durante três anos, fui para vários gastros, inclusive em Recife. Nesse período cheguei a fazer 22 endoscopias, com uma anemia ferropriva crônica e um quadro clínico bem debilitante. Mas quem fechou o diagnóstico em 2008 com a biópsia de 2006, foi a Drª Rozangela Wyszomirska, aqui mesmo em Maceió, em uma única consulta”, explica Cláudia Carvalho. Diz ainda que passou por vários especialistas: um conjunto de gastros, hematos, alergistas e oncologistas.

A doença Celíaca é bastante antiga, tendo sido catalogada no primeiro século d.C. quando um médico grego chamado Areateus da Capadócia, relatou em seus estudos. Mas foi o médico britânico Samuel Gee que, em uma palestra de 1887, descreveu um tipo de ingestão crônica encontrada em todas as pessoas que ele examinou, em especial crianças entre um a cinco anos.

Cláudia Carvalho disse que sua reação a princípio foi de desespero, visto que na época ela pouco sabia sobre a enfermidade e a alimentação industrializada era escassa. “Quando retirei o glúten, meu quadro clínico foi melhorando e eu entendi que o meu melhor amigo, o PÃO, me matava lentamente”. Ainda segundo Carvalho, ela foi entendendo que a DC é uma doença autoimune e que, por tabela, traz outras doenças. Conta também que lidou com perda de peso, fraqueza muscular, queda de cabelo e unhas, feridas nos cotovelos e manchas na pele.

Enquanto Cláudia quase entrou em desespero, Sérgio Manoel Barbosa de Miranda Filho, de 36 anos, não reclamava dos sintomas e chegou a pensar que era normal, após consumir glúten. “Achei que todo mundo tinha o mesmo tipo de reação. Na verdade, descobri que tinha há muito tempo e o consumo do glúten impossibilitou que eu absorvesse nutrientes, vitaminas etc. A falta de cálcio fez com que eu desenvolvesse osteoporose, tendo descoberto em 2010”, conta Sérgio Filho.

A vida não parou de pregar peças ao paciente celíaco: em 2005, Sérgio foi diagnosticado com câncer e passou por tratamento quimioterápico por um ano. A descoberta da DC, nesse caso, foi durante uma bateria de exames, que fazia todos os anos após o tratamento do tumor.

“Pra quem passou por uma doença tão severa como o câncer, a descoberta da doença celíaca não teve grande impacto. Encarei como a possibilidade de me forçar a ter uma alimentação melhor, livre do glúten”, ressalta Sérgio.

No dia 16 de maio de 2003, a Câmara dos Deputados aprovou a Lei de Rotulagem de Glúten, que obriga que os produtos alimentícios comercializados informem sobre a presença de glúten, como medida preventiva e de controle da doença celíaca. Após 15 anos, as empresas especializadas tiveram um crescimento do mercado voltado para pessoas com DC.

Os empresários apostaram em franquias voltadas para esse público, com alimentos sem glúten e sem lactose. Em Maceió, por exemplo, essas lojas estão espalhadas por toda a cidade, desde os shoppings às padarias ou lojas nas ruas e avenidas.


Produto da loja Sanglu (Foto: Reprodução)

Formado em economia, Samuel Filho decidiu montar sua loja voltada para alimentos sem glúten. Funcionando há 3 anos,  a decisão de abrir a loja se deu  quando ele percebeu que a esposa começou a fazer receitas sem glúten, como pão, pizza, bolos e salgados. Para o empresário, o novo modo de se alimentar estava melhor que o anterior. Afirma ainda que era um sonho da companheira ter seu próprio negócio voltado para o setor alimentício.

“Decidimos investir nesse negócio. Ela passou por treinamentos de comida sem glúten em grandes centros como São Paulo e Nova Iorque e hoje ela toca na linha de frente a Sanglu. Ela hoje é uma especialista no tema, mais do que eu”, afirma Samuel.

Ele diz ainda que a loja já vem tendo uma repercussão boa na cidade, inclusive turistas que possuem a DC já chegam em Maceió sabendo sobre o negócio do casal. Segundo o empresário, agora pode haver o fornecimento de alimentos para pessoas que até então tinham restrição de come-los e ver a felicidades desses clientes gera muita satisfação.

Pensando nesse mercado, vários programadores desenvolveram aplicativos, disponíveis para Android e IOS, com receitas de alimentos saudáveis e sem glúten. Outros mostram endereços de lojas próximas para facilitar a vida do consumidor na hora de adquirir seus produtos. Portanto, os enfermos têm diversos mecanismos para procurarem o tratamento.


Aplicativos disponíveis para Android e Ios (Foto: Reprodução)

Cláudia Carvalho chegou a pensar que tinha câncer, uma vez que a cada dia definhava mais. Por investigar tanto, descobriu que era portadora de Esclerose Múltipla e hoje aprendeu a conviver com as suas limitações. Outras enfermidades vieram com o tempo, a partir da DC: anemia crônica, constipação intestinal, gases e arrotos acompanhados de muitas dores, o que a fazia ir para o hospital constantemente.

“Aprendi a conviver com a DC, é uma doença que não tem cura e o único remédio é a restrição total ao glúten. Tenho que me policiar quanto a contaminação cruzada, pois também tenho crise inalatória. Os utensílios que utilizam alimentos com glúten também não podem ser usados. Não posso entrar em padarias, lanchonetes, pizzarias, pastelarias e etc”, comenta Cláudia.

Para Maria Cláudia Carvalho, a família é o principal escudo para proteção de uma vida saudável. Conta que mudou tudo radicalmente em sua casa, as festas são adaptadas com o que ela pode comer e, em hipótese alguma, seus parentes fogem a regra.


Família adaptada para parentes com Doença Celíaca (Foto: Ilustração)

Assim como Cláudia, Sérgio Filho teve o apoio de sua família. Sua esposa acompanhou todo o processo da doença. Eles se conheceram em 2007, ela foi uma das pessoas que o incentivou a pesquisar o motivo dele se sentir tão mal toda vez que se alimentava. “Após a descoberta da doença, ela sempre me deu força para levar o problema a sério, começou a aprender receitas de como substituir o glúten nos alimentos que originalmente são feitos com a farinha de trigo na composição”, disse Sérgio.

Sanglu

A Sanglu fica dentro da galeria ClubLyon (Av. Dr. Antônio Gomes de Barros, 664 - Jatiúca, Maceió - AL, 57036-000).