Cultura

Diretores do filme alagoano "CAVALO" contam suas expectativas para estreia nacional nesta quinta

Obra estreia nos cinemas de todo o Brasil

Por Felipe Guimarães 12/08/2021 07h07
Diretores do filme alagoano 'CAVALO' contam suas expectativas para estreia nacional nesta quinta
Cavalo Foto de Cartaz - Foto: Reprodução

Com a tão esperada estreia do filme ‘CAVALO’ marcada para ocorrer nas telonas de todo o Brasil nesta quinta-feira (12), a nossa equipe do 7Segundos não podia deixar essa oportunidade passar e correu para entrevistar os diretores Rafhael Barbosa e Werner Salles.

Ambos amantes da sétima arte e formados em jornalismo pela Universidade Federal de Alagoas (Ufal), os cineastas deram vida ao primeiro longa-metragem alagoano a ser realizado com um edital público e a primeira produção de grande duração já feita por ambos.

A obra chegou a receber o Prêmio Guilherme Rogato, da Prefeitura de Maceió, e contou com recursos provenientes do Fórum Setorial do Audiovisual Alagoano (FSA) e toda a sua produção foi concebida com recursos provenientes da iniciativa pública.

Além disso, “CAVALO” chegou a ser exibido para cerca de 15 mil pessoas em 32 festivais de cinema nacionais e internacionais, conquistando premiações em seis deles, sendo elas de “Melhor documentário” no Cindie Festival, “Melhor trilha sonora”; “Melhor som e melhor direção de arte” no festival Comunicurtas 2020, “Menção honrosa” no Festival Cine Seridó 2021 e também recebeu o mesmo prêmio na Mostra Visões Periféricas 2021.

Tendo conquistado a crítica especializada e o público pelos locais onde passou, CAVALO entra para a história do audiovisual alagoano e deixa e faz a sua estreia no circuito comercial de forma promissora.

Confira abaixo, o nosso diálogo com os diretores do filme


7Segundos
- CAVALO faz sua estreia no circuito comercial entrando para a história do audiovisual alagoano. Vocês poderiam contar para a gente como surgiu a ideia de fazer o filme?

Werner Salles
- A pesquisa inicial era investigar a relação entre o médium, nas religiões de matriz africana, com as entidades que incorporam. Era entender essa relação entre corpo, inconsciente e o inconsciente coletivo que essas entidades representam. Contudo, a pesquisa foi se ampliando ao longo do tempo para o terreno da dança, principalmente da dança contemporânea. A partir de um teste de elenco com vários jovens de Alagoas nos deparamos com histórias de personagens que tinham uma relação muito expressiva com o corpo, na dança, no hip hop e nos terreiros. Isso foi um plot para o filme. Os personagens trouxeram suas vivências e suas potências para o roteiro.

Com isso decidimos fazer um filme processo, criando um ambiente para esses personagens expressarem suas identidades e suas ancestralidades, através do corpo e da dança, que é também é uma forma de acessar o inconsciente, tal qual a incorporação.

7S
- Quais são as expectativas de vocês para com a exibição do filme para todo o Brasil?

W.S
-Apesar de ser um filme que não segue uma narrativa clássica, Cavalo se comunica com o público através da emoção, através da poesia. Acreditamos e apostamos nisso. Cavalo também é um filme que mergulha em um universo de símbolos e arquétipos, principalmente das culturas de matriz africana, que estão presentes no Brasil profundo. É um filme identitário, de certa forma. E isso tem gerado interesse do público. A carreira em festivais mostrou que o filme tem um apelo forte. Uma recepção muito emocional. No final da sessão em Tiradentes o público estava muito emocionado.

Algumas pessoas até dizem que Cavalo é um filme pop, muito contemporâneo. Acho que isso tem a ver também com a musicalidade, a pulsão de juventude e de vida das personagens. Ele foi visto por cerca de 15 mil pessoas em festivais, a grande maioria deles online.

Acreditamos que as salas de cinema vão amplificar a experiência. No cinema, com tela grande e som 5.1, o filme vai bater muito mais forte, sem dúvida. Estamos muito felizes com o circuito de salas que o filme alcançou, com uma distribuição muito bem sucedida da Descoloniza Filmes (SP) e da La Usa Cinematográfica (AL). Dia 12 de agosto, Cavalo entra em cartazes nas principais capitais brasileiras.

7S -
As filmagens foram rodadas somente em Alagoas?

Rafhael Barbosa
- 100% das nossas locações são em Alagoas. Filmamos em vários bairros de Maceió, do Centro ao Benedito Bentes. Filmamos também em União dos Palmares, Coqueiro Seco e Santa Luzia do Norte.

7S
- CAVALO é um filme que também fala sobre ancestralidade, porque essa temática foi escolhida?

R.B
- Desde “Exu - Além do Bem e do Mal” (2012), temos desenvolvido um projeto artístico que se relaciona com os arquétipos dos orixás e das entidades. Uma pesquisa de oito anos que influenciou na concepção do nosso primeiro longa. Também estávamos estudando a história do Quilombo dos Palmares, uma das maiores narrativas de resistência do mundo, quando entendemos que seria instigante investigar os ecos desse passado em nossa contemporaneidade. A ancestralidade foi o caminho encontrado para expressar essa busca.

7S
- Com relação ao elenco, é muito difícil encontrar personagens para se fazer cinema aqui no estado?

R.B
- Nesse sentido, a nossa dificuldade foi escolher entre tantos talentos que participaram do nosso teste. Fizemos o teste para escolher apenas um protagonista. E fomos muito impactados pelas presenças, potências e histórias que surgiram. Acabamos selecionando sete pessoas e mudamos o roteiro do filme para imprimir essa força que nos chegou.

Alagoas tem uma das cenas de dança contemporânea mais interessantes do país, e o filme se beneficia disso. Temos dançarinas e dançarinos de extremo talento no casting.

O estado também é um terreno férfil para a atuação. Só para citar alguns nomes que têm se destacado recentemente: temos o jovem ator Luciano Pedro Jr concorrendo ao prêmio de atuação no festival de Gramado desse ano, pelo seu trabalho no filme “Carro Rei”, de Renata Pinheiro. A atriz alagoana Anne Oliva também está no elenco, com uma participação muito forte.

Aline Marta co-protagonizou com Antônio Pitanga o longa “Casa das Antiguidades”, única produção brasileira que concorreu à Palma de Ouro em Cannes em 2020. Erom Cordeiro tem protagonizado uma série de sucesso depois da outra. Acaba de estrear em “Os Ausentes”, no HBO Max, ao mesmo tempo que está no elenco do longa “Doutor Gama”, de Jeferson De, em cartaz nos cinemas.

A atriz Lucélia Pontes está no elenco da série “Bom Dia, Verônica”, da Netflix, e da novela “Malhação - Toda Forma de Amar”, entre outros trabalhos. Igor Araújo é outro nome que tem feito muitas participações em séries nacionais. A última delas foi “Manhã de Setembro”, da Amazon Prime. E Ivana Iza, que já rodou o Brasil com as peças “Devassas” e “A Velha”, deve chamar atenção do cinema brasileiro com sua incrível atuação no filme “Serial Kelly”, de René Guerra, próximo longa-metragem alagoano que vai chegar aos cinemas, com lançamento da Globo Filmes. Alagoas tem talento de sobra.

7S
- Sobre o ‘fazer cinema’ em Alagoas: o Estado ampara os artistas e os incentiva a fazer as suas produções? Quais as maiores dificuldades?

W.S
- É difícil em qualquer lugar sensibilizar o poder público para a importância do investimento na cultura e na economia criativa. Mas onde existe articulação política, união e organização, existe mudança. Cavalo só existe porque a Ancine criou uma política pública com o objetivo de corrigir uma distorção histórica e descentralizar os investimentos. E seu lançamento agora, chamando atenção do Brasil, é o exemplo de como essa política é bem sucedida e é necessária. Os editais transformaram a cena audiovisual alagoana em poucos anos. O primeiro edital foi lançado há 10 anos, em 2011. Em uma década construímos um caminho muito expressivo.

O ano de 2020 foi um marco simbólico para a produção de Alagoas. “Cavalo”, primeiro longa-metragem alagoano realizado a partir de um edital público, chegou ao circuito de festivais como ponta de lança de uma cena que antes já vinha cavando espaço com curtas-metragens premiados.

O ano começou com a presença recorde de quatro filmes alagoanos na Mostra de Tiradentes. No mesmo mês de janeiro, pela primeira vez um curta realizado no estado (“Como Ficamos da Mesma Altura”, de Laís Araújo) era exibido no prestigiado Festival de Roterdã.

Em Gramado, foi a vez de “Trincheira”, de Paulo Silver, levar o cinema alagoano para o festival mais popular do país. Um feito também inédito, assim como foi a seleção de “A Barca”, de Nilton Resende, para o Festival de Cinema de Havana, o mais importante da América Latina.

Além dos festivais, os realizadores de Alagoas têm se destacado em laboratórios nacionais e internacionais. O roteiro do longa “Marina”, de Laís Araújo, foi o único brasileiro selecionado pelo Hubert Bals Fund em 2019, mesmo ano em que o jovem cineasta Ulisses Arthur (“As Melhores Noites de Veroni”, “Ilhas de Calor”) saiu do BRlab com o prêmio da Incubadora Paradiso e o prêmio Desenvolvimento da Vitrine Filmes para o projeto de seu primeiro longa, “Não Estamos Sonhando”.

Os novos longas de Laís e Ulisses somam-se a mais de 100 outros filmes alagoanos atualmente em fase de produção. São cinco longas-metragens, cinco telefilmes e 93 curtas-metragens já financiados por diferentes fontes, que vão desde editais lançados por prefeituras e pelo governo do Estado em parceria com a Ancine, até os projetos contemplados na recente Lei Aldir Blanc. O número se torna ainda mais simbólico ao lembrar que 2021 é ano do centenário dos primeiros registros audiovisuais feitos em Alagoas, pelas lentes do pioneiro Guilherme Rogato.

Mesmo diante do movimento de desmonte da Agência Nacional de Cinema, o audiovisual alagoano segue resistindo e chamando cada vez mais atenção.

7S
- CAVALO ganhou seis premiações nos festivais de arte, vocês esperavam receber tanto prestígio?

R.B
- Nós vivemos uma experiência muito forte fazendo o filme. Cada diária nos proporcionou sentimentos intensos. E sabíamos que se a gente conseguisse imprimir essa energia no filme, teríamos uma obra capaz de tocar as pessoas. A recepção da crítica e do público, e os prêmios conquistados mostram que conseguimos transmitir a força das nossas personagens para a tela.

7S
- E sobre os festivais internacionais, como o público e a crítica receberam o filme de vocês?

W.S
- Tivemos uma participação interessante em festivais internacionais como o Los Angeles Brazilian Film Festival – LABRFF 2020, o Festival Inshadow - Lisbon Screendance Festival 2020, em Lisboa, o Selecionado para o Festival BIdeOtik - Azkuna Zentroa Bilbao, o Mimesis Documentary, no Colorado, entre outros. E ainda a carreira em festivais internacionais continua. Acabamos de ser selecionados para o FICCA KUNTA KINTE, que está prevista para acontecer entre os dias 1º e 5 de setembro, em Medellín, na Colômbia. No momento estamos negociando com plataformas de streaming para um lançamento internacional. Os gringos gostam do filme.