Justiça espanhola anula condenação de Daniel Alves por 'agressão sexual'
O tribunal aceitou um recurso feito pela defesa de Daniel Alves. Ainda cabe recurso da decisão perante a Suprema Corte da Espanha

O Tribunal Superior da região da Catalunha, na Espanha, anunciou nesta sexta-feira (28) a anulação da condenação do ex-jogador de futebol Daniel Alves por agressão sexual, dizendo que a decisão original apresentava "inconsistências e contradições".
O tribunal aceitou um recurso feito pela defesa de Daniel Alves. Ainda cabe recurso da decisão perante a Suprema Corte da Espanha.
Em fevereiro do ano passado, o ex-jogador da seleção brasileira havia sido sentenciado a 4 anos e 6 meses de prisão pelo Tribunal de Barcelona por "agressão sexual", um crime que na Espanha é equivalente ao que é considerado o estupro no Brasil.
A acusação envolvia uma mulher de 23 anos que, segundo a corte, foi abusada por Alves no banheiro de uma discoteca em Barcelona na madrugada de 31 de dezembro de 2022.
O tribunal concluiu na época que não houve consentimento por parte da vítima para o ato sexual e que existem elementos de prova, além do testemunho da mulher, para dar prova da violação.
Agora, em decisão que anula o veredito, o tribunal superior catalão disse que o depoimento da suposta vítima não era confiável ao se referir a fatos que poderiam ser verificados objetivamente por meio de gravações de vídeo, "indicando explicitamente que o que ela relatou não corresponde à realidade".
Alves já tinha sido solto da prisão sob fiança de 1 milhão de euros (R$ 6,2 milhões) enquanto aguardava o resultado de seu recurso.
A Justiça havia considerado que seu risco de fuga havia diminuído com algumas medidas.
O jogador também tinha a obrigação de se apresentar ao tribunal uma vez por semana e estava proibido de deixar o território espanhol.
Agora, ele pode sair do país, já que o tribunal de apelações suspendeu todas as restrições de viagem.
A advogada do ex-jogador de futebol, Inés Guardiola, comemorou a reversão da condenação.
"Estamos muito felizes; a justiça foi feita e Alves foi considerado inocente", disse ela à rádio local RAC1 após o veredito ser anunciado.
Ester Garcia, advogada da suposta vítima, ainda não se manifestou.
A decisão judicial
Segundo a decisão do Tribunal Superior da Catalunha, a decisão original sobre o caso apresentava "lacunas, imprecisões, inconsistências e contradições quanto aos fatos".
Por isso, os magistrados decidiram, por unanimidade, aceitar o recurso interposto pela defesa do ex-jogador de futebol e anular a decisão anterior.
Segundo a Justiça espanhola, as provas reunidas no julgamento, que sustentaram a condenação, não "excedem os padrões exigidos pela presunção de inocência".
O principal ponto da nova decisão é que, diferente da sentença anterior, não haveria como, apenas com o depoimento da vítima, decidir se houve ou não consentimento.
Ou seja, o tribunal não está afirmando que a versão de Alves, de que não houve estupro e que ele teve uma relação sexual consentida com a vítima, seja a correta.
Mas os juízes argumentam que, pelas inconsistências, também não podem aceitar a hipótese da acusação como provada.
Um dos elementos em que o Supremo Tribunal de Justiça da Catalunha (TSJC) destacou graves inconsistências na decisão de primeira instância diz respeito à felação (sexo oral) que a vítima negou ter praticado antes de ser penetrada por Alves.
Segundo as informações divulgadas pela corte, a localização de DNA na boca da vítima e a descoberta de impressões digitais no banheiro onde a agressão teria ocorrido colocam em dúvida as informações passadas pela mulher.
Também haveria, segundo o TSJC, uma diferença significativa entre o relato da vítima e as imagens das câmeras de vídeo.
De acordo com a decisão, como o relato da denunciante "difere significativamente" do que foi registrado pelas câmeras, as provas e argumentos devem ser examinadas com maior rigor e seguindo os requisitos da presunção de inocência.
E, neste ponto, "a discrepância entre o que a reclamante disse e o que realmente aconteceu compromete seriamente a confiabilidade de sua história", disseram os magistrados.
Além disso, o tribunal decidiu que o argumento da denunciante de que ela foi com Alves ao banheiro por medo de que seus amigos pudessem segui-los não parecia razoável.
Os juízes concluíram a suposta vítima, em vez disso, "foi voluntariamente à área do banheiro com o propósito de estar com o réu em um espaço mais íntimo".
Reações
"Estou com Dani Alves. Estamos muito felizes. Ele é inocente e está provado. A justiça falou", afirmou a advogada de Daniel Alves, Inés Guardiola, a uma rádio espanhola.
"Ainda não pude ler profundamente a sentença, mas estamos muito, muito felizes, ele ficou muito emocionado. Enfim, fez-se a justiça."
A advogada afirmou ainda que estuda pedir uma indenização pelo tempo que Alves passou na prisão, mas que uma decisão a respeito ainda não foi tomada.
A mãe do jogador também se pronunciou sobre a decisão judicial. Maria Lucia Alves compartilhou uma foto com o filho celebrando: "Grata ao meu Deus por tudo. Toda honra e glória a ti, meu Senhor."
Na Espanha, políticos e personalidades do mundo esportivo também reagiram às notícias.
A vice-primeira-ministra da Espanha, María Jesús Montero, disse que ainda precisava se informar mais sobre a decisão antes de emitir uma opinião.
Mas Montero expressou solidariedade "a todas as vítimas de abuso ou maus-tratos físicos que às vezes se veem diante de dificuldades para suportar" o ocorrido, segundo o jornal La Vanguardia.
Ana Redondo, ministra da Igualdade, reagiu com cautela à decisão da Justiça.
"Não conseguimos ler a decisão com calma; acho que precisa ser feito lentamente. Nunca vamos questionar o Judiciário. O que fazemos é não concordar com essa decisão do Tribunal Superior", disse Redondo ao jornal El País.
Pablo Fernández, porta-voz do partido Podemos, classificou a decisão como uma "vergonha absoluta".
"A decisão no caso Dani Alves é mais um exemplo flagrante de justiça patriarcal, violência institucional e total negligência com as vítimas, que são então solicitadas a registrar queixas", escreveu no X, antigo Twitter.
O caso
Uma mulher de 23 anos acusou Daniel Alves de a ter estuprado em uma festa na boate Sutton, de Barcelona, no dia 31 de dezembro de 2022. Ela diz que o jogador a agrediu, a trancou em um banheiro e a estuprou.
Ela alertou os donos da boate e foi encaminhada para um hospital que é centro de referência para vítimas de agressão sexual. Dois dias depois da festa na boate, a denúncia foi registrada.
Em uma entrevista a um canal espanhol, dias antes de ser detido, Daniel Alves comentou a denúncia.
"Eu estive nesse lugar, e quem me conhece sabe que eu adoro dançar, mas sem invadir o espaço de ninguém, respeitando os espaços. E quando você vai ao banheiro não tem que perguntar quem está lá para usar o banheiro. Não sei quem é essa senhorita, nunca a vi. Nestes anos todos nunca invadi o espaço de ninguém sem autorização", disse ele ao programa Y ahora Sonsoles da TV espanhola Antena 3.
Desde esse primeiro comentário, no entanto, Daniel Alves mudou sua versão sobre a noite algumas vezes.
Desde esse primeiro comentário, no entanto, Daniel Alves mudou sua versão sobre a noite algumas vezes.
Em seu primeiro depoimento oficial à Justiça, o jogador afirmou que encontrou a denunciante no banheiro da boate, mas que não teve qualquer relação com ela.
A terceira versão do caso foi apresentada pela defesa do jogador. Em fevereiro de 2023, os advogados do brasileiro divulgaram uma declaração alegando que ele manteve uma relação de sexo oral consensual com a mulher.
Em abril de 2023, uma nova versão do caso surgiu. Em um novo depoimento oficial, Daniel Alves afirmou que houve relação sexual, incluindo penetração, e que foi consensual.
Por fim, durante o julgamento, a defesa tentou argumentar que o jogador estava embriagado. Isso sugeriria uma "ausência de consciência" sobre seus atos, buscando o atenuante à pena.
Já a vítima manteve sempre a mesma versão, de forma consistente, durante todo o processo.
Alves foi preso preventivamente em 20 de janeiro de 2023. Cerca de um ano depois, foi condenado a 4 anos e 6 meses de prisão pelo Tribunal de Barcelona por agressão sexual.
Caso Daniel Alves inspirou lei no Brasil
No caso Daniel Alves, especialistas apontam que a boate onde ocorreu o caso de violência sexual seguiu um protocolo chamado No Callem (Não se calem, em tradução livre), criado em 2018 em Barcelona para combater assédio ou violência sexual.
A mulher de 23 anos que afirmou ter sido estuprada por Alves foi vista chorando por um segurança do local, que a levou para uma sala reservada e aplicou as regras de atendimento, segundo relatos.
A polícia foi chamada e coletou provas. A vítima foi levada para o hospital — e foi destacada a rapidez do exame de corpo de delito.
Daniel Alves foi preso preventivamente menos de um mês depois.
Essa resposta da equipe da boate e do poder público inspirou a aprovação de uma lei, no Brasil, que prevê a aplicação do protocolo "Não é Não".
A lei brasileira determina regras que estabelecimentos como bares e casas de show devem seguir para prevenir violência contra a mulher e proteger vítimas — inclui treinamento de funcionários e acionamento da polícia.
A lei foi sancionada no fim de dezembro e entra em vigor 180 dias depois — ou seja, estará valendo no segundo semestre de 2024.
Especialistas ouvidas pela BBC News Brasil concordam que o caso Daniel Alves estimulou diferentes iniciativas no Brasil — um "divisor de águas", nas palavras da promotora do Ministério Público de São Paulo Fabíola Sucasas.
Apontam, no entanto, que a conscientização sobre violência sexual e a demanda por mudança de cultura e de comportamento já vinha acontecendo no país.
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