'Não somos responsáveis pelo contingenciamento atual', diz ministro em sessão na Câmara
Abraham Weintraub disse que prioridade é ensino básico, fundamental e técnico. Ele foi convocado no mesmo dia das manifestações de protestos contra o bloqueio de verbas no setor.
O ministro da Educação, Abraham Weintraub, disse nesta quarta-feira (15), em sessão no plenário da Câmara dos Deputados, não ser responsável pelo atual contingenciamento (bloqueio) de verbas no setor. Ele afirmou ainda que a prioridade do governo é o ensino básico, fundamental e técnico. "Não somos responsáveis pelo contingenciamento atual", afirmou, atribuindo a culpa ao governo da petista Dilma Rousseff, que tinha Michel Temer como vice. "Este governo, que tem quatro meses, não é responsável pela situação", disse.
Weintraub afirmou que a educação apresentou uma "involução" nos últimos anos, declaração que provocou aplausos de deputados aliados do governo e vaias de oposicionistas. "O orçamento atual foi feito pelo governo eleito Dilma Rousseff e Michel Temer, que era vice. Nós não votamos neles. Não somos responsáveis pelo desastre da educação brasileira. O sonho das pessoas é colocar os fihos na educação privada, não na pública", declarou.
Convocado para falar sobre os bloqueios no orçamento das universidades, Weintraub afirmou que o ensino superior é uma área onde o país "está, entre aspas, bem". "Não estou querendo diminuir o ensino superior. Ao que a gente se propõe? Cumprir o plano de governo que foi apresentado. Prioridade é ensino básico, fundamental, técnico", afirmou. Weintraub disse ainda que não há corte de recursos. Segundo ele, o governo está "obedecendo a lei". "Não tem corte. Se você pegar o orçamento total, a gente está obedecendo a lei", declarou.
Em outro momento da audiência, o ministro declarou não haver “revanche” ao comentar o contingenciamento de verbas para as universidades e que sabe “do papel republicano do cargo de ministro”.
Em relação a críticas de que o bloqueio de verbas prejudicará pesquisas no país, afirmou que a pasta analisará “pesquisa a pesquisa” para liberar verba e que isso será feito com “diálogo e transparência”. “Algumas áreas de, entre aspas, pesquisas que são feitas podemos postergar para um segundo momento”, disse.
A sessão, que durou seis horas, transcorreu em clima tenso entre o ministro e deputados da oposição. Parlamentares oposicionistas o acusaram de ter declarado que comunista merecia "levar bala na cabeça" e de ser próximo a banqueiros. Weintraub disse que iria responder sobre as questões "fúteis e superficiais", que, segundo ele, representavam um "desrespeito" a quem paga impostos. "Quanto à bala na cabeça, eu não tenho passagem na polícia por ameaça, agressão, não tenho processo trabalhista. Minha ficha é limpíssima. Não tem um ato. Tiveram que voltar 30 anos para achar um boletim ruim. Bala na cabeça quem prega não é este lado aqui", afirmou. E acrescentou: “Quem ligou para o Santander na Espanha para pedir a cabeça de uma colega minha porque ela disse que, se a Dilma fosse eleita, o real ia cair e o dólar ia subir. Foi o Lula, que hoje está na cadeia [...]. O amigo de banqueiro é o Lula”, declarou. Ele se referiu ao episódio da demissão de uma analista do Santander que, em 2014, enviou a clientes uma nota sugerindo que a reeleição da então presidente Dilma Rousseff provocaria uma piora na economia.
As declarações do ministro provocaram confusão no plenário. Deputados de oposição passaram a gritar "demissão, demissão". O deputado Marcos Pereira (PRB-SP), vice-presidente da Câmara, que conduzia os trabalhos, pediu aos deputados e ao ministro que se restringissem ao tema da comissão geral, os bloqueios na educação.
Iniciada às 15h com um plenário cheio, a sessão foi se esvaziando à medida que se aproximava do final. Cinco horas depois do início, o ministro falava a um grupo menor de deputados, principalmente do PSL e de partidos de oposição.
Mesmo com o quórum mais baixo, o clima voltou a esquentar na sessão quando o deputado André Janones (Avante-MG) subiu à tribuna e, em tom exaltado, insistia para que o ministro olhasse para ele enquanto falava. "Eu vou me recusar a falar. O ministro é um moleque, o senhor é um moleque. O senhor é um moleque, não merece respeito. Não olha para nós quando estamos falando porque o senhor não sabe o que é conviver numa democracia”, afirmou. Weintraub o ignorou e continuou conversando com a líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP).
Começou, então, novo tumulto no plenário. Aliados do governo, incluindo o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), que é filho do presidente, protestaram. Bolsonaro gritou para Janones: “Respeita o ministro, seu palhaço”. A gritaria só acabou quando acabou o tempo a que Janones tinha direito e o microfone foi cortado. No entanto, a calmaria durou pouco. Logo depois, teve um intenso bate-boca no plenário, que descambou para briga e alguns parlamentares precisaram ser contidos por colegas e seguranças legislativos. Tocando incessantemente a campainha para pedir silêncio, o vice-presidente da Câmara, Marcos Pereira (PRB-SP), que conduzia os trabalhos, ameaçou encerrar a sessão antes das 21h, horário previsto para o término. Com a confusão formada no plenário, a sessão chegou ser suspensa por alguns minutos. De um lado, o Delegado Éder Mauro (PSD-PA) gritava com Glauber Braga (PSOL-RJ). De outro, a deputada Carla Zambelli (PSL-SP) gritava com Talíria Petrone (PSOL-RJ). Os ânimos só arrefeceram após a intervenção de colegas.
A sessão foi convocada para o mesmo dia das manifestações contra o contingenciamento de verbas anunciado pelo Ministério da Educação (MEC). Houve atos de protesto em pelo menos 149 cidades de todos os estados e no Distrito Federal. Universidades e escolas também fizeram paralisações após convocação de entidades ligadas a sindicatos, movimentos sociais e estudantis e partidos políticos.
Weintraub é o primeiro ministro do governo Jair Bolsonaro a ser convocado para uma "comissão geral", sessão realizada no plenário, com todos os deputados, em vez de numa comissão, com um grupo restrito de parlamentares. Logo no início da sua fala na tribuna, o ministro agradeceu a oportunidade para esclarecer "uma série de informações que foram distorcidas e estão gerando mal estar na sociedade”. A convocação do ministro foi aprovada na terça-feira (14) por 307 votos a favor e 82 contra, o que evidenciou a falta de articulação do governo para barrar a sua vinda.
Descontente com a articulação política, a maior dos partidos orientou as bancadas a votarem a favor da convocação. Somente o PSL, partido de Bolsonaro, e o Novo foram contrários. Há cerca de 40 dias no cargo, Weintraub causou polêmica ao anunciar o corte de verba de três universidades que tinham sido palco de manifestações públicas. Diante da reação, ele estendeu o bloqueio de 30% para todas as universidades e todos os institutos. De forma reservada, auxiliares próximos do presidente Jair Bolsonaro ouvidos pelo Blog do Camarotti avaliam que o discurso mais incisivo do ministro da Educação acabou estimulando os atos desta quarta.
Nesta quarta-feira, nos Estados Unidos, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que os manifestantes que protestam contra o bloqueio de verbas da educação são "idiotas úteis" e "massa de manobra". Estudantes reagiram à fala do presidente.