José Ventura
O Gavião
Gostava de ouvir as histórias de seu Chico Inácio, morador da roça, em casa de taipa e chão batido, criando nambus, codornizes e perdizes selvagens. Pegava as aves do mato em arapucas espalhadas na caatinga. Uma vez capturadas, cortava suas asas para impedir o voo e aos poucos as comia com feijão cozido em panela de barro, em um fogareiro de lenha seca. Longe de reclamos da vida simples que tinha, encontrava na natureza tudo que lhe inspirava alegria e prazer.
Observar o comportamento dos pássaros lhe dava muita satisfação. Abria um sorriso puro ao ver um beija-flor plainar no ar e voltar em marcha a ré no mesmo voo. Falava da sagacidade do gavião, arisco e que parecia entender o perigo que corria se alguém dele se aproximasse, conduzindo uma vara ou algo que parecesse uma espingarda. Rapidamente levantava voo, e já nas alturas, fora da mira do tiro, passeava em círculo, piando sobre a cabeça do “caçador”.
Mestre em arapucas, seu Chico Inácio resolveu preparar a armadilha para pegar o gavião que havia, num voo rasteiro, cravado as garras em um pintinho de seu terreiro. O gavião, conta seu Inácio, pousou num galho de um mulunguzeiro, olhou de lado, olhou a presa espetada nas suas unhas e a aos pios de socorro do pintinho, arrancava-lhes pedaços, se fartando no macabro banquete.
Debaixo da arapuca amarrou outro pintinho para atrair o rapineiro. O ripina não chegava fácil. Começava pousando em árvore distante, observando a movimentação do terreiro. A qualquer movimento batia asas e repetia o ritual em círculo, sobre o espantalho que lhe fez fugir. Empurrado pela fome, e chamado pelos piados do pintinho feito isca viva, o gavião não se rendeu ao espanto e pousou em uma estaca de pau a pique, a uns vinte metros da armadilha. Seu Chico Inácio a tudo assistia e tudo observava escondido em uma palhoça estreita e baixa, construída com palhas de coqueiro ouricuri. Num vôo curto, a ave de rapina estava no chão circulando a arapuca. Baixava a cabeça, olhava a presa a meio metro de suas garras, mas recuava antes de pisar no desarme de cipó grosso sob a armadilha. Observava seu Chico Inácio que o gavião tinha o cuidado de nunca colocar a cabeça e o corpo no interior da armadilha, nem pisava no desarme.
A perseguição foi interrompida quando o rapina passou de perseguidor a perseguido.
Um bem-te-vi investiu sobre o costado do gavião, levando-o a uma briga aérea como dois inimigos mortais. O gavião fugia e o bem-te-vi rasava sobre ele, bicorando e chilrando o cantar do desafio. Esmaecida a luta, o gavião derrotado demorava três a cinco dias para reaparecer naquele habitat natural.
Seu Chico Inácio, sem leituras escolares, resmungava sua sabedoria extraída da vida e do comportamento das aves, dizendo com um sorriso leve, “mais pequeno é bem-te-vi, mas dá pisa em gavião”
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