Cultura

Zé do Rojão: Cantor é Patrimônio Vivo da Música Regional

Por Kamylla Lima 13/10/2013 10h10
Zé do Rojão: Cantor é Patrimônio Vivo da Música Regional
Zé do Rojão: alegria até perto da morte - Foto: Kamylla Lima

A voz grave preenche todo o ambiente. Aos 75 anos, o ícone da música regional conta com leveza a sua trajetória. Com uma memória impressionante, Zé do Rojão revela detalhes da sua história como artista, que vem desde a época em que saía escondido de casa para cantar – ainda menino –, e se mistura com o nascimento da rádio Novo Nordeste, há 37 anos, quando emprestava sua voz para imortalizar o primeiro dia de funcionamento da NN com o programa Rojão do Nordeste.

“Eu não saio da Novo Nordeste porque nunca tive divergência com ninguém”, garante ele. “O estúdio que tem lá (na rádio) leva meu nome. Tem também um retrato bem grande me homenageando”, relembra. E não é para menos. A homenagem é para o homem, que se classifica como “programador”, e na madrugada de 21 de agosto de 1976 proferia as primeiras palavras na recém-inaugurada emissora. A contribuição dele é tanta que o programa ainda está no ar, no mesmo horário, das 5h às 7h, aos sábados.

José Cícero dos Santos ganhou o apelido de “Rojão” por conta do ritmo que canta, seguindo os passos de Jackson de Pandeiro. Foi a junção perfeita: a simplicidade do “Zé” com a explosão do estilo musical regional definem bem a personalidade do artista, que candidamente não cansa de ofertar declarações apaixonadas à esposa Maísa Matias, com quem é casado há 54 anos. Quando lembra da época das andanças do marido Nordeste afora, ela ri e não se incomoda em dizer que ele era “perigoso” com as outras mulheres. Apesar disso, ele faz questão de ressaltar: “Só hoje sei o que é o casamento, o verdadeiro sentido do companheirismo”.

Com mais tempo em casa, atualmente Zé se divide entre o programa, que vai aos sábados, o carinho com a família e os eventos das muitas homenagens que recebe. O tempo para aproveitar tudo isso vem depois de uma época de corre-corre.

Nasce um Ícone
Sem o apoio do pai, aos 12 anos de idade ele saía escondido do Sítio São José, em Arapiraca, para tocar pandeiro e cantar. “Ele (o pai) só ficou feliz depois que viu que eu cantava direitinho”, lembra ele com um sorriso de saudade. E assim o ícone ia nascendo, mesmo sem ter noção do tamanho da sua importância no futuro.

De convite em convite, de festa em festa – fosse nos cabarés ou até mesmo na rua – o pandeirista não negava uma “tocada”. Aos 22 anos, casou. Para sustentar a família, se equilibrava no trabalho durante o dia e cantava à noite. Até que chegaram dois momentos marcantes: as excursões; uma com o Trio Nordestino e a outra com o “Rei do Baião”, Luiz Gonzaga. Zé do Rojão abriu os shows dos dois por uma temporada cada. Sobre “Mestre Lua”, Zé lembra que era “a animação em pessoa”. Sobre as excursões, recorda-se com saudade das idas aos cabarés e das divertidas conversas.

Em uma época de ouro do rádio, Zé era visto como ídolo em Arapiraca e na região. O seu desempenho na Novo Nordeste lhe rendeu convites para outras rádios, inclusive a Rádio Sampaio AM, em Palmeira dos Índios-AL; gravou um LP e participou de outros dois. Rojão chegou a se arriscar na política, foi vereador por oito anos em Coité do Nóia – onde ganhou o título de cidadão honorário –, mas diz que “política nunca mais”.

Mesmo enveredando pelos corredores da Câmara, as pessoas não esqueciam o cantor. Assim, prevaleceu o lado artístico e José Cícero já era o grande Zé do Rojão. “Muita gente tem respeito sério sobre mim até hoje”, afirma com satisfação.

Radialista, Compositor, Cantor e Declamador
Já não bastava ser bom em cantar e tocar, tinha que declamar bem. Apesar de ter apenas o 4º ano primário, declama poesia como ninguém. Sobre este outro dom, ele mesmo explica: “Ler poesia todo mundo sabe, mas declamar é um dom”. Zé conta que lê as poesias umas três ou quatro vezes e aprende para falar no programa. “Aprendi tudo no montão de livros que tenho em casa”, acrescenta o artista, que lançou um CD com poesias recitadas.

Defensor assíduo da música regional, faz questão de dizer que “não toca música de duplo sentido” em seu programa. E também não ouve. Fã de Jackson do Pandeiro, conta que está feliz porque o baião ganhou uma roupagem nova, mas no auge de seus 75 anos – após passar por momentos difíceis no hospital, recentemente; resultado de seus muitos anos como fumante – ele diz que “antigamente as canções eram melhores”. Sem fazer shows há cinco anos, ainda mostra o vigor de um menino com ternura ao falar que gosta de música, sobretudo a regional, a nordestina.

Confira AQUI uma poesia declamada por Rojão.