A ex-miss porto-riquenha acusada de matar seu marido milionário
O romance de Áurea Vázquez Rijos e Adam Joel Anhang foi breve e infeliz.
Quase 13 anos depois do assassinato de Anhang, um tribunal federal dos EUA vai finalmente decidir se condena a ex-miss Porto Rico, acusada de planejar a morte do marido - um magnata canadense da indústria de games online - seis meses após o casamento.
O julgamento, que começa nesta semana, acontece depois de uma longa batalha legal, em que Vázquez lutou contra sua extradição da Itália e da Espanha.
O pai de Anhang chegou a contratar detetives particulares para rastrear os passos da ex-miss na Itália, depois que um homem inocente foi preso, e logo liberado, pelo crime e uma nova testemunha disse ter visto o assassino do empresário conversar com Vázquez antes de golpeá-la "com força moderada".
Roubo de fachada
"Foram necessários cinco anos, muito esforço e energia para localizá-la. E, assim que a encontramos, ela descobriu e continuou se deslocando", disse Abe Anhang à BBC em sua casa em Winnipeg, no Canadá.
Aos 32 anos, Anhang, multimilionário do setor de games e negócios imobiliários, foi brutalmente espancado e esfaqueado até a morte. O crime aconteceu em uma noite de setembro de 2005, em uma rua do bairro histórico de San Juan, capital de Porto Rico, território não incorporado dos Estados Unidos.
À primeira vista, o ataque parecia ser uma tentativa de roubo malsucedida, em que Vázquez Rijos também foi ferida pelo agressor.
Mas, de acordo com os promotores, Anhang foi levado a acreditar que encontraria a esposa em um restaurante de San Juan naquela noite para discutir os termos do divórcio, quando na verdade estava sendo atraído para uma armadilha.
A acusação argumenta que a ex-miss sabia que o divórcio a privaria de grande parte dos bens do marido, avaliados em US$ 24 milhões, devido a um acordo pré-nupcial que o casal havia assinado.
Dois anos depois, Jonathan Román Rivera, assistente de cozinha em um restaurante próximo, foi condenado por matar Anhang em uma tentativa de roubo.
A sentença foi anulada mais tarde, entretanto, quando uma nova testemunha se apresentou a um júri federal dos EUA, dizendo ter visto o assassino golpear Anhang com uma pedra da calçada e apunhalá-lo várias vezes e, depois, falar calmamente com Vázquez Rijos antes de atingi-la com força moderada.
Em 2008, um júri federal acusou a ex-miss de contratar um matador de aluguel, depois que um homem, suspeito de ser o assaltante, confessou o assassinato.
Em uma declaração lida perante o tribunal de San Juan, Alex "El Loco" Pabón Colón disse que Vázquez Rijos tinha concordado em pagar US$ 3 milhões pelo serviço, quando eles planejaram o assassinato de Anhang na boate Pink Skirt, empreendimento que o marido havia dado a ela como presente de casamento.
"Áurea se comunicou com Alex para dizer a ele para estacionar o carro na rua San Justo. Alex faria o que tinha que fazer", diz a confissão assinada.
Fuga para a Europa
A essa altura, porém, Vázquez não estava mais na jurisdição dos EUA. De acordo com os promotores, ela deixou Porto Rico em 2006 e foi morar na Itália, país cujas leis às vezes são usadas por fugitivos para impedir sua extradição.
Ela conheceu um taxista italiano em Florença, com quem teve gêmeas.
Quando ele leu no jornal Corriere della Sera que a mãe de suas filhas estava sendo procurada em Porto Rico, contudo, resolveu se separar. E acabou ganhando a guarda das crianças.
Enquanto isso, Vázquez Rijos tinha se aproximado da comunidade judaica de Florença, segundo informaram os detetives particulares contratados por Abend Anhang na Itália.
"Ela foi abraçada pela comunidade judaica como uma viúva com dois filhos."
O pai de Anhang explica que o acordo pré-nupcial assinado por Vázquez Rijos e pelo filho incluía um compromisso dela de estudar e converter-se à fé judaica, da qual o marido era adepto, no prazo de dois anos.
A fachada judaica
De acordo com os promotores americanos, a ex-miss foi ajudada pelo irmão, Charbel Vázquez Rijos, pela irmã, Marcia, e pela mãe, que providenciaram documentação falsa para enganar a organização judaica Firenzebraica, em Florença, atestando em junho de 2012 que Vázquez e as filhas tinham ascendência judaica, o que permitiria a elas se mudarem para Israel.
Mas, segundo Abe Anhang, ela circulou pela Europa usando "nomes falsos e várias carteiras de identidade". Os detetives particulares que ele contratou informaram que haviam rastreado os passos dela na Espanha, na França e na Inglaterra.
Em agosto de 2012, Charbel Vázquez Rijos registrou a empresa de turismo Glatt Kosher Traveller's Inc. em Porto Rico. Tudo indica, segundo os promotores, que o plano era dar à irmã um meio de ganhar dinheiro na Itália.
Mas a agência de viagens, destinada a turistas judeus, seria a ruína da ex-miss.
O FBI e as autoridades espanholas organizaram uma operação sigilosa, convidando Vázquez Rijos para trabalhar como guia de um grupo de turistas fictícios em Madri.
Presa ao desembarcar no aeroporto, a ex-miss iniciou uma nova luta contra a extradição nos tribunais espanhóis.
Ela engravidou enquanto estava presa e teve um filho. Fontes da polícia espanhola disseram à BBC que o pai da criança era um bandido italiano que cumpria pena na Espanha por um crime relacionado a drogas.
Ela foi autorizada a casar atrás das grades e pediu a um juiz de Madri que não a extraditasse por ser mãe de um cidadão espanhol.
Em 2015, ela finalmente cruzou o Atlântico em um avião particular do FBI, e seu bebê de um mês foi colocado sob os cuidados das autoridades assim que ela desembarcou em Porto Rico.
Vários atrasos legais, além do furacão Maria, adiaram por diversas vezes o julgamento no tribunal federal dos EUA em San Juan. O irmão de Vázquez, a irmã e o companheiro dela também serão julgados.
Os promotores assinaram uma declaração perante as autoridades espanholas se comprometendo a não solicitar pena de morte neste caso, uma condição do acordo final de extradição.
Abe Anhang está otimista de que finalmente justiça será feita, mas acha irônico que a recusa da nora em enfrentar o julgamento possa acabar contando a favor dela.
"Áurea vai receber provavelmente a pena mais branda de todos os acusados porque fugiu e esperou para ser extraditada de um país que impôs condições para sua transferência de volta aos EUA para enfrentar a justiça", disse à BBC.
"Em essência, ela será recompensada com a mesma pena que teria se tivesse sido presa e condenada na Espanha. Ao mesmo tempo, os demais acusados vão receber penas mais longas, apesar de terem muito menos envolvimento no crime."
A BBC entrou em contato com a advogada de Vázquez, Lydia Lizarribar, mas ela recusou o convite para comentar a estratégia de defesa de sua cliente antes do julgamento