Fatalidade

Cidades pequenas concentram metade das mortes no trânsito

Localidades de até 100 mil habitantes têm vácuo em processo de municipalização da gestão viária

Por Folha de São Paulo 27/07/2019 11h11
Cidades pequenas concentram metade das mortes no trânsito
Cidades pequenas concentram metade das mortes no trânsito - Foto: Folha de São Paulo

Na manhã de uma quinta-feira de 2017, um aposentado de 64 anos atravessou uma rua em Bom Jesus dos Perdões, cidade a 76 km de São Paulo, com cerca de 20 mil habitantes. Um motorista que conduzia seu carro ladeira abaixo naquela rua disse não ter visto quando o pedestre "surgiu" na sua frente. O aposentado foi atropelado e morreu naquele dia.


Cenas como essa se repetem todos os dias no trânsito brasileiro, pulverizados pelo território nacional. E, segundo uma pesquisa da Universidade Federal do Paraná em parceria com o ONSV (Observatório Nacional de Segurança Viária), as cidades brasileiras de pequeno porte (com até 100 mil habitantes) concentram praticamente a metade das vítimas de trânsito no país (49%).

O dado é alarmante, já que nelas residem 43% da população --além de terem menor frota de veículos e fluxo de viagens. Essas cidades também estão mais longe de cumprirem as metas nacionais de redução de mortes.

Os dados são do SUS de 2017, que apontam a ocorrência de 35.367 mortes no trânsito em todo o território brasileiro. Para o ONSV, falta maior compromisso das prefeituras de municípios de pequeno porte com o tema.

Para efeito de comparação, cidades grandes (que têm mais de 500 mil habitantes) concentram 30% da população brasileira, mas respondem por 23% das mortes no trânsito. Nas cidades médias (entre 100 mil e 500 mil habitantes), há maior equilíbrio entre os dois parâmetros: nelas residem 26% da população do Brasil e morrem 28% das vítimas do trânsito brasileiro.

Em 2017, entre as cidades pequenas com grande número de mortes estão, por exemplo, Lagoa dos Três Cantos (RS), onde apenas uma colisão frontal entre dois veículos numa rodovia estadual que cruza a cidade matou cinco pessoas. 

O município, de apenas 1.650 habitantes, viu seu índice de mortalidade no trânsito explodir.
A presença de rodovias federais e estaduais em muitas cidades pequenas brasileiras influi no índice de mortes a cada grave acidente.

Só nas rodovias federais, é possível dizer que ocorreram 23% das 17.343 mortes das cidades pequenas. 
O excedente fica ao custo das vias estaduais e também das próprias prefeituras, que têm responsabilidade sobre seu trânsito local. 

É o caso, por exemplo, de Barra do Turvo (SP), onde dois jovens (um deles menor de idade) morreram em um acidente de motocicleta numa via de terra, na cidade de cerca de 7.000 habitantes, na divisa paulista com o Paraná. 

Ou então em Itapeva (SP), 13 mil moradores, onde um motociclista de cerca de 50 anos morreu em um calmo cruzamento do centro da cidade.
Segundo o ONSV, os números indicam a necessidade de que as prefeituras pelo país foquem a gestão de seus sistemas de transporte e vias.
Para se ter uma ideia, apenas 29% das cidades brasileiras têm o sistema de trânsito local municipalizado. Ou seja, criaram departamentos executivos para o trânsito e atuam nos temas de educação, engenharia de tráfego e fiscalização. 

Em todas as outras cidades, o trânsito local fica sem cuidados específicos.