Alagoas

Secular casarão em Pão de Açúcar onde se hospedou Dom Pedro II sofre com o abandono dos poderes públicos

Moradores temem acidentes por problemas na estrutura do prédio que virou abrigo de morcegos, ratos e insetos

Por 7Segundos 20/03/2022 12h12 - Atualizado em 20/03/2022 13h01
Secular casarão em Pão de Açúcar onde se hospedou Dom Pedro II sofre com o abandono dos poderes públicos
Casarão que deu abrigo ao Imperador Dom Pedro II em Pão de Açúcar está abandonado - Foto: Cortesia

"A vista do Pão de Açúcar é bonita! Cheguei por volta das 8 horas ao Pão de Açúcar. Receberam-me com muito entusiasmo e um anjinho entregou-me a chave da vila. Defronte desta povoação há uma grande coroa de areia, que me cansou atravessar e com a luz dos foguetes, que não têm faltado por todo o rio (…)”

Segundo alguns relatos históricos, essas palavras foram escritas pelo Imperador Dom Pedro II em seu diário durante sua passagem pela cidade de Pão de Açúcar durante sua viagem pelo Rio São Francisco em meados do século XIX quando Pão de Açúcar ainda era um vilarejo.

Ainda de acordo com a história, Dom Pedro II teria desembarcado em Pão de Açúcar no dia 17 de outubro de 1859 e pernoitado num casarão de sobrado que ainda existe, mas se encontra em situação de abandono.

O secular casarão onde Dom Pedro II ficou hospedado, também chamado de Paço Imperial por ter se tornado a residência oficial do Imperador por um determinado período, fica na Avenida Ferreira de Morais, Nº 1001, na orla de Pão de Açúcar, de frente para o Rio São Francisco.

Apesar da importância histórica do imóvel, os moradores vizinhos ao prédio que abrigou por alguns dias o Imperador Dom Pedro II, estão preocupados com o elevado grau de deterioração do imóvel.

Paço Imperial em Pão de Açúcar sofre com o abandono. Foto: Cortesia

Dona Elza Machado, que mora ao lado do casarão, está com a estrutura do imóvel. Ela teme que algum incidente ocorra devido ao mal estado de conservação das paredes e do telhado que inclusive, já caiu quase que por completo. Outro problema são os insetos e ratos que habitam o lugar, segundo a moradora, que acabam invadindo as residências vizinhas, isso sem contar a presença de morcegos.

“O casarão está em total abandono, ele está cheio de morcegos, muitos ratos, escorpiões, dentre outros insetos, causando danos à nossa saúde e na qualidade de moradora eu venho pedindo socorro há muito tempo, clamando misericórdia porque uma parte do prédio na frente em cima já caiu e a qualquer momento eu temo haver um desabamento”, disse Dona Elza.

Seu Abdenago Feitoza, também mora vizinho ao prédio e assim como Dona Elza, teme que o pior aconteça e que a atual situação do imóvel provoque danos aos moradores que residem próximos.

“Nós estamos sofrendo há anos com isso e ninguém toma alguma providência para recuperar o prédio que é importante para a cidade, para o turismo, para a história, e com isso também, devolver a nossa paz porque a gente pode ser vítima de algo que aconteça com este imóvel, caso ele desabe, a gente não sabe” disse o morador, aflito com a situação.

Insetos, ratos e morcegos habitam o antigo prédio, relatam os moradores vizinhos. Foto: cortesia

Iphan

A reportagem do Portal7Segundos teve acesso a um documento enviado pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) em novembro de 2015 como reposta a um questionamento feito ao órgão por um morador de Pão de Açúcar que queria saber do Iphan se haveria algum processo de tombamento aberto em relação ao imóvel onde esteve hospedado Dom Pedro II em Pão de Açúcar.

Em resposta ao morador, o Departamento de Patrimônio Material e Fiscalização do Iphan informou à época que naquele período, novembro de 2015, havia um processo de tombamento aberto em relação ao velho casarão e que o processo estaria sob análise da Superintendência do Iphan em Alagoas, e ainda, que o prazo para a conclusão do mesmo seria de 5 anos.

Ofício encaminhado pelo Iphan a morador de Pão de Açúcar sobre possível tombamento. Foto: reprodução

Em contato com a Superintendente do Iphan em Alagoas, Melissa Mota, ela informou que não tinha conhecimento de nenhum processo de tombamento aberto em relação ao referido prédio. A reportagem do Portal7Segundos também entrou com contato com a assessoria de comunicação do Iphan em Brasília que respondeu através de e-mail que o Instituto optou pelo indeferimento do pedido de tombamento feito à época mas não revelou os motivos:

O Iphan desenvolveu uma série de estudos e análises para averiguar se o bem poderia ser inscrito em algum dos Livros do Tombo do Instituto, conforme ocorre a cada pedido de tombamento. Após a conclusão do processo, o Instituto optou pelo indeferimento do pedido. Vale ressaltar que um bem pode não ser tombado a nível federal, pelo Iphan, e ainda sim ser protegido por outras instâncias de proteção ao Patrimônio Cultural, como estadual e municipal.

Prefeitura

A reportagem do Portal7Segundos procurou a Prefeitura de Pão de Açúcar em busca de informações sobre a situação do prédio. O Assessor de Planejamento e Comunicação do município, Rafael Arley, informou que o prédio pertence a um morador da cidade e foi cedido há alguns anos ao município de Pão de Açúcar através de um regime de comodato, que é um empréstimo feito de maneira gratuita. O prédio é tombado pelo Estado e que por conta disso, existe uma série de restrições para a realização de uma reforma, que depende da análise e aprovação dos órgãos responsáveis pela proteção e promoção do patrimônio cultural, histórico, natural e científico de Alagoas.

Apesar disso, Rafael Arley informou que existe um amplo projeto elaborado pela atual gestão do Prefeito Jorge Dantas que trata da revitalização e restauração completa do imóvel. O projeto foi encaminhado à Secretaria de Desenvolvimento Turístico do Estado e os trâmites para esse convênio com o Estado já foram tomados, disse.

“Nós temos um projeto arquitetônico moderno, elaborado pela arquiteta Jacqueline Antunes, profissional especialista em restauração. O projeto foi debatido e aprovado pela sociedade civil, sobretudo pelo setor cultural do município. Apresentamos ao Governador Renan Filho que o aprovou e garantiu a possibilidade do financiamento pelo Governo do Estado. Todo o projeto já está em tramitação na Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico e Turismo e nós esperamos ansiosos para que tudo dê certo. A restauração do Paço Imperial é um sonho antigo de Pão de Açúcar e o prefeito Jorge Dantas tem se esforçado para que tão logo se torne realidade!”, explicou Rafael Arley, que disse ainda que o município espera receber essa resposta até o dia 2 de abril para saber se esse convênio com o Estado será firmado, inclusive, para a restauração também de outros prédios históricos da cidade, como a antiga delegacia, informou.

Imóvel precisa ser submetido a um amplo processo de restauração. Foto: cortesia

Sedetur

Também procuramos a Sedetur (Secretaria de Estado de Turismo) para saber sobre a tramitação do projeto encaminhado pela Prefeitura de Pão de Açúcar e fomos informados através de sua assessoria de comunicação que as documentações do processo do Paço Imperial de Pão de Açúcar foram entregues nesta semana pela Prefeitura Municipal de Pão de Açúcar à Secretaria e que o processo foi aberto e encaminhado para PGE (Procuradoria Geral do Estado) onde se encontra em tramitação no momento.

Pró-Memória


A reportagem também procurou o Pró-Memória, órgão ligado à Secretaria de Estado da Cultura (Secult). Através do Assessor Especial do Pró-Memória, Pablo Christian, fomos informados que o prédio localizado na Avenida Ferreira de Morais, nº 1001, em Pão de Açúcar, conhecido com o Paço Imperial, é tombado em nível estadual através do Decreto nº 37.932, de 28 de dezembro de 1998.

Pablo também informou que a Prefeitura de Pão de Açúcar e os proprietários do referido imóvel foram notificados pela Secretaria de Estado da Cultura em 2016 sobre a situação de abandono encontrado à época, prevendo riscos iminentes de colapso em sua estrutura.

Dessa forma, foi requisitada a imediata interdição da área e intervenções imediatas no imóvel, de forma a proteger os transeuntes e o patrimônio histórico do Estado.

O Pró-Memória informou ainda que medidas administrativas e judiciais foram tomadas até o presente momento, onde o órgão aguarda decisão proferida pelo juízo da comarca sobre uma Ação Civil Pública motivada pelo Ministério Público.

Ministério Público


Em contato com a assessoria de comunicação do Ministério Público Estadual, a reportagem do Portal7Segundos foi informada que a Ação Civil Pública movida pelo MP foi julgada procedente pelo juiz de primeiro grau, responsabilizando o Município pela restauração do imóvel, mas o município recorreu da decisão e o processo encontra-se tramitando no Tribunal de Justiça.

Segundo a assessoria do MP, o Promotor de Justiça da Comarca de Pão de Açúcar, Ramon Formiga, explicou que, como ainda não houve o trânsito em julgado dessa ação, o Município não estaria obrigado, pelo menos judicialmente, a executar a reforma.

O Promotor de justiça Ramon Formiga disse que ao manter contato com a Procuradoria Geraldo Município, foi informado que toda a documentação foi enviada à Sedetur e à Seinfra e que o Município aguarda a resposta e a assinatura do convênio para repasse dos recursos pelo Estado, mas as negociações já estariam avançadas.

É o que os moradores de Pão de Açúcar esperam que aconteça, para que as ações em benefício do velho e histórico casarão não sejam realizadas somente após algum incidente.