?Não pago amante com dinheiro de empreiteira?, diz Delcídio sobre Renan Calheiros
Menos de um dia após o Senado, por 74 votos a zero, lhe tirar o mandato de senador, Delcídio Amaral (ex-PT/MS) partiu para o ataque. Seu alvo é o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB/AL). “Todo mundo vê claramente. Não roubei, não pago amante com dinheiro de empreiteira, não tenho conta no exterior. O que o sr. Renan fez? Se eu não fosse cassado não colocava em votação o impeachment da Dilma. Foi uma vingança pessoal.”
Em São Paulo, onde reside temporariamente, Delcídio afirma que ‘surpreendentemente está sereno’. “Sou muito religioso, de formação católica, estou feliz da vida. Estou mesmo. Apesar da truculência e das atrocidades a que fui submetido na sessão do Plenário ontem (terça, 10) o meu dia seguinte é de tranquilidade. Sei que combati o bom combate.”
Delcídio fica inelegível por dez anos e meio, até 2027. São oito anos, mais o que lhe restava de mandato – que terminaria em 2018.
Fora do Senado por largo período, Delcídio planeja, agora, retornar a Campo Grande, capital de seu Estado. Planos para a política? “Volto para Campo Grande. Quanto ao futuro só Deus sabe!! Vou continuar trabalhando na pecuária e no comércio.”
Para o ex-líder do Governo no Senado existem ‘duas razões muito simples’ para sua cassação ter sido decretada. “Uma porque o governo pressionou, o governo não aceitaria sob hipótese nenhuma que eu votasse o impeachment. Segundo, porque o Renan estava com medo do discurso que eu ia fazer.”
O senador cassado acredita também que a delação que fez, na qual apontou o envolvimento de colegas no esquema da Lava Jato e também citou Lula e Dilma, teve peso decisivo para sua queda. “Aí entra a questão da colaboração, o pano de fundo de tudo isso. Minha colaboração vem se mostrando verdadeira. Outras testemunhas estão ratificando tudo o que eu disse. A Andrade Gutierrez, a questão do Marcelo Navarro (ministro do Superior Tribunal de Justiça), o próprio Marcelo Odebrecht confirmando. Qual foi o meu problema? Obstrução de Justiça, que eu reconheço. Agora, não fiz sozinho, fiz a mando. Então, o Renan ultrapassou todos os limites da razoabilidade.”
Delcídio se diz indignado porque na segunda-feira, 9, considera ter saído vitorioso da sessão da Comissão de Constituição e Justiça. “Ganhamos jogando com o time em campo, no convencimento, no bom direito. Tanto que praticamente a CCJ votou a favor, quase por unanimidade, só o Randolfe votou contra. Todo mundo compreendeu muito bem as razões. Houve um atropelamento do Conselho de Ética. Você não ter condição de acessar os autos, não periciar uma gravação, não compartilhar com o Supremo Tribunal Federal o aditamento à denúncia.”
Aqui, ele se refere a um aditamento da Procuradoria-Geral da República à denúncia apresentada contra ele por supostamente ter tramado contra a Lava Jato. “Foi uma audiência ótima na segunda-feira. O que o sr. Renan fez na própria segunda feira? Se eu não fosse cassado, ele não colocava em votação o impedimento da Dilma. Vinte minutos depois de encerrada a sessão da CCJ ele fez reunião em Plenário e marcou minha cassação para ontem (terça, 10). Atropelaram o Regimento, atropelaram os direitos que qualquer cidadão tem de se defender, um processo viciado de erros jurídicos.”
Delcídio esclareceu porque não foi à sessão do Senado que o pôs para fora da Casa. “Com o circo armado nem nos preocupamos em comparecer. Primeiro, não fomos notificados. Foi um negócio inacreditável. Ficamos apopléticos quando vimos o que ele (Renan) estava fazendo. Assim como o Eduardo Cunha operava como presidente da Câmara para se safar do Conselho de Ética, o Renan atropelou para votar minha cassação. Eu combati o bom combate. Se valesse a Justiça, se valesse o bom senso e a decisão lúcida iria prevalecer a decisão da CCJ. Agora, fazer uma disputa no tapetão não vale. A votação na CCJ foi nominal no sentido de trazer especialmente esse aditamento (à denúncia contra ele no Supremo) em compartilhamento com a CCJ para que eu também me defendesse. Nesse aditamento, foi denunciado o Lula e foi denunciado o Bumlai.”
“O material que lastreou a representação contra mim é nota de jornal e uma degravação que alguém digitou e que foi vazado, mas você não tem nada, nada que autentique a documentação que serviu de lastro para a representação. Para reconsiderarem a decisão da CCJ usaram em plenário argumento que era sigilo e, portanto, a CCJ não teria acesso. A legislação é clara. As duas instituições podem compartilhar as informações e, se houver sigilo, a CCJ pode fazer sessão fechada. Foi uma aberração.”
Delcídio Amaral informou que ‘vai ao Supremo e à Procuradoria-Geral da República também’ para tentar reverter sua cassação.
Ele diz que tem recebido ‘vários telefonemas de solidariedade, inclusive de parlamentares que não entendem como isso aconteceu, surpresos com a truculência, com a mentira como todo o processo acabou acontecendo, uma doideira’.
“Você precisa ver a cara do Renan quando viu o resultado da CCJ na segunda-feira, cuspia sangue”, diz o ex-senador.
Delcídio estava em São Paulo quando sua sorte foi selada. Viu pela televisão a sessão que lhe tirou o mandato. “Ninguém falou nada, por constrangimento e medo. O Plenário estava vazio. Muitos só chegaram na hora de votar. Todo mundo vê claramente. Não roubei, não pago amante com dinheiro de empreiteira, não tenho conta no exterior.”
A reportagem procurou o presidente do Senado. O espaço está aberto para manifestação.