Acidentes

Em áudio da cabine, piloto que levava Teori menciona chuva e não relata falhas

Registros teriam captado diálogos do piloto com outros pilotos que voavam pela região

Por Folha de São Paulo com Folha de São Paulo 24/01/2017 06h06
Em áudio da cabine, piloto que levava Teori menciona chuva e não relata falhas
Ministro Teori Zavascki morreu em acidente aéreo no Rio de Janeiro - Foto: Arquivo/Folha de São Paulo

A gravação de áudio do avião em que voava o ministro Teori Zavascki (Supremo Tribunal Federal) indica, segundo peritos da Aeronáutica, que não houve relato de problemas na aeronave antes da queda em Paraty.

Segundo a Folha apurou, os registros da cabine do avião King Air teriam captado diálogos do piloto Osmar Rodrigues com outros pilotos que voavam pela região.

Em uma conversa, de acordo com informações obtidas pela reportagem, o piloto diz que vai esperar a chuva diminuir antes de pousar. Pouco depois, a gravação teria sido interrompida, segundo análises preliminares.

Na avaliação de técnicos do Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos), o teor aponta, em caráter preliminar, que o piloto pode ter perdido o controle da aeronave, levando-a ao choque com a água. O áudio não explica exatamente o que ocorreu - a investigação depende também de outros fatores para que a causa da queda seja esclarecida.

A Aeronáutica confirmou na noite desta segunda (23) que os técnicos conseguiram acessar material arquivado no gravador de voz da cabine do avião que se acidentou na última quinta-feira (19), matando o ministro do STF Teori Zavascki.

O conteúdo da gravação não foi divulgado –a Justiça Federal decretou sigilo sobre as investigações.

O aparelho sofreu danos pelo contato com a água do mar, mas eles não foram graves a ponto de impedir o acesso aos dados. O equipamento grava os últimos 30 minutos de conversa na cabine do avião.

Segundo a Folha apurou, o registro de áudio foi feito durante todo este período.

O aparelho, chamado de CVR, chegou a Brasília na manhã do último sábado (21) e está sob os cuidados do Labdata (Laboratório de Análise e Leitura de Dados de Gravadores de Voo), do Cenipa.

À tarde, a Aeronáutica havia informado que os próximos passos do Labdata eram: "secagem do aparelho, verificação da integridade dos dados, processo de degravação dos dados e processo de transcrição".

Segundo a Aeronáutica, o CVR possui "duas partes". "A primeira é o gravador em si, que armazena os dados. Essa parte é altamente protegida. A segunda é chamada 'base', que contém cabos e circuitos que fazem a ligação com o armazenamento de dados. É essa segunda 'parte' que está molhada e precisa ser recuperada", informou a nota.

O aeroporto para o qual o avião se dirigia, na cidade de Paraty (RJ), não dispõe de torre de controle. Se o gravador estava acionado durante o voo, em tese registrou conversas na cabine e contatos do piloto com a torre de controle do Campo de Marte, em São Paulo, de onde o avião partiu. A análise das supostas conversas poderia dar pistas aos investigadores sobre as causas do acidente.

A investigação do Cenipa é focada na identificação de causas da queda e possíveis recomendações para redução de riscos e não tem prazo para acabar.

INQUÉRITO

O inquérito tocado pela Polícia Federal sobre a queda do avião inclui investigações em Sorocaba (SP), onde se localiza o hangar principal utilizado pelo avião King Air que se acidentou, Paraty (RJ) e no aeroporto do Campo de Marte, em São Paulo, onde foi apreendido equipamento de vídeo com imagens captadas sobre a chegada do ministro do STF no dia do acidente.

Os policiais, entre os quais um ex-piloto de avião comercial, são lotados na direção geral da PF, em Brasília. O grupo básico é formado por seis investigadores, alguns dos quais também trabalharam no inquérito que apurou a queda do jatinho que, em 2014, matou o então candidato à Presidência Eduardo Campos (PSB).

O objetivo do inquérito sigiloso da PF é averiguar se alguma ação criminosa concorreu para a queda do King Air.

Além das investigações do Cenipa e da PF, a queda do King Air é apurada pela Polícia Civil do Rio e pelo Ministério Público Federal.

A empresa fabricante do King Air, a Textron Aviation Corporate, que controla a Beechcraft, confirmou à Folha, por e-mail, que poderá auxiliar nas investigações no Brasil. "A Textron Aviation trabalha em estreita colaboração com as autoridades governamentais responsáveis pela investigação de acidentes e ofereceu assistência investigativa às autoridades locais", informou a companhia. Sobre detalhes do trabalho, a empresa afirmou que não faz comentários sobre investigações em andamento.

Sediada em Rhode Island (EUA), a Textrom fabrica aviões Beechcraft e Cessna e helicópteros Bell, entre outros aparelhos.

O acidente que matou Teori foi o segundo na região de Paraty envolvendo um King Air desde o início de 2016. No dia 3 de janeiro do ano passado, um avião do mesmo modelo pertencente à cadeia de supermercados Shibata também decolou do Campo de Marte, a exemplo do caso do avião em que estava Teori, e se acidentou durante procedimentos de descida no aeroporto de Paraty. As duas pessoas que estavam no avião morreram.

O Cenipa ainda não divulgou relatório sobre as causas do acidente de 2016. 

JUSTIÇA DETERMINA SIGILO

A Justiça de Angra dos Reis determinou, nesta segunda-feira (23), que a investigação sobre o acidente aéreo que matou o ministro do Supremo Tribunal Federal, Teori Zavascki seja sigilosa. A queda do avião, em que morreram outras quatro pessoas, aconteceu em Paraty, na última quinta-feira.  

O caso é investigado pela Polícia Federal e Ministério Público Federal.

As causas do acidente são desconhecidas. A Força Aérea Brasileira (FAB) informou nesta segunda-feira que houve danos na caixa-preta do bimotor que se acidentou na quinta-feira, vitimando o ministro do Supremo Tribunal Federal, Teori Zavascki, e outras quatro pessoas. No entanto, a corporação comunica que ainda não é possível precisar se a gravação de voz também ficou comprometida.

O equipamento é dividido em duas partes. O espaço para a gravação de voz é de grande proteção, ressalta a FAB.

As conversas do piloto Osmar Rodrigues durante o voo são essenciais para apurar as causas do desastre aéreo em Paraty. Além de Teori e o piloto, morreram no acidente no mar o empresário Carlos Alberto Filgueiras, a professora Maria Panas e a massoterapeuta Maíra Panas.

A perícia analisará se o aparelho estava ligado durante o voo, bem como quais conversas foram armazenadas.

CONSULTAS A MINISTROS E RELATORIA DA LAVA JATO

As conversas entre ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a definição do novo relator da Lava Jato na Corte tiveram início nesta segunda-feira, 23. A presidente do Tribunal, ministra Cármen Lúcia, conversou com ministros para se consultar sobre o assunto. Ela precisará decidir quem vai herdar a investigação, que ficava a cargo do ministro Teori Zavascki, morto na semana passada em um acidente de avião. O presidente Michel Temer já anunciou que só anunciará o nome do novo ministro que irá compor a Corte após a definição do Supremo sobre o novo relator da investigação sobre a Petrobras.

Além das conversas com os colegas de tribunal, Cármen se reuniu com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Oficialmente, ele foi "prestar condolências" à presidente da Corte. Nos bastidores, Janot tem revelado preocupação com o futuro da Operação Lava Jato e principalmente com a homologação das delações da Odebrecht, que se encontram em compasso de espera.

Cármen avalia a possibilidade de autorizar que a equipe de juízes auxiliares que recebeu delegação de Teori para trabalhar nas delações durante o recesso continue esse processo durante a próxima semana. Estavam previstas para essa semana audiências dos juízes com os 77 delatores da empreiteira, para confirmar se os acordos com o Ministério Público foram fechados de forma espontânea.

A expectativa é de que Cármen tome decisões sobre o assunto - tanto sobre a continuidade das audiências no caso da delação da Odebrecht como sobre o futuro da Lava Jato - nos próximos dias. Ela conversou com os ministros sobre as possibilidades e ouviu a opinião dos colegas.

Ministros ouvidos pela reportagem reservadamente mostram opiniões distintas sobre o assunto. Há parte que defende que o novo relator da Lava Jato deve ser definido em um sorteio entre todos os integrantes da Corte. Há ainda uma corrente que entende que o sorteio deve ser restrito à Segunda Turma do Tribunal, da qual Teori fazia parte. Outros ministros avaliam que o regimento da Corte indica que o revisor do caso é que deve assumir as ações. Neste caso, o revisor da Lava Jato na Segunda Turma é Celso de Mello. Já no plenário é o ministro Luís Roberto Barroso.

Além de receber Janot e telefonar aos ministros, Cármen passou boa parte da tarde no gabinete do ministro Teori e conversou com os assessores dele, incluindo o juiz-auxiliar Márcio Schiefler.

Ainda não é certo se Cármen Lúcia comparecerá à missa de sétimo dia de Teori Zavascki, que será realizada nesta quarta-feira, 25, em Porto Alegre (RS), a pedido da família do ministro. A ministra decidiu dispensar a tradicional sessão solene de abertura de trabalhos do Judiciário no ano, que ocorre no dia 1º de fevereiro. Em razão da morte de Teori, haverá apenas a realização de homenagens na primeira sessão plenária de 2017.