'Estou sendo punida por ter ficado doente', diz jornalista demitida pela Globo
Assim como boa parte de seus colegas, a apresentadora Izabella Camargo, 37 anos, ficou chocada ao ser demitida na última segunda-feira (5) pela diretora de Jornalismo da Globo em São Paulo. Afinal, ela estava retornando de licença médica por ter desenvolvido a síndrome de burnout, que é o ponto máximo do estresse profissional.
"Estou sendo punida por ter ficado doente, com uma doença funcional, e os laudos provam isso. Foi um susto. Esperava qualquer coisa, menos ser demitida", diz Izabella com exclusividade ao Notícias da TV.
Resumidamente, a síndrome de burnout (do inglês burn, queima; e out, exterior) é o desgaste emocional que danifica aspectos físicos e psíquicos da pessoa, reduzindo a naturalidade e a velocidade com que ela realiza suas tarefas.
Os sintomas são fadiga, cansaço constante, distúrbios do sono, dores musculares e de cabeça, irritabilidade, alterações de humor e de memória, dificuldade de concentração, falta de apetite, depressão e perda de iniciativa. Nos casos mais graves, pode levar ao consumo de álcool e drogas e até ao suicídio.
A jornalista, que prepara um livro sobre o assunto, ouviu médicos e um cronobiologista da USP e chegou à conclusão de que sua doença está diretamente relacionada ao fato de ter trabalhado de madrugada na maior parte dos seis anos em que esteve na Globo. "O turno da madrugada vai te dando um déficit celular. Trabalhar em horário especial descompensa os órgãos", conta.
Desde o final de 2014, Izabella apresentava a previsão do tempo no Hora 1 e no Bom Dia Brasil. Também substituía a titular do Hora 1, Monalisa Perrone, e eventualmente, César Tralli e Carlos Tramontina, nos telejornais locais. "Em agosto de 2017, meu corpo começou a apresentar problemas", lembra. Ela teve depressão e crises gastrointestinais e circulatórias.
Aconselhada por médicos, Izabella diz que pediu a seus chefes na Globo para que pudesse fazer "trocas intertemporais", ou seja, mudar de turno durante alguns meses, como forma de amenizar os efeitos da síndrome.
Não foi atendida. Pelo contrário, em agosto deste ano passou a apresentar o mapa-tempo em mais um jornal, o Em Ponto, da GloboNews. Ao mesmo tempo, o Hora 1 dobrou sua duração, passou a entrar no ar às 4h.
Izabella chegava na Globo às 3h da madrugada. Fazia quatro entradas no jornal de Monalisa Perrone enquanto se preparava para a GloboNews, na qual ficava até 20 minutos no ar falando de metereologia sem parar. Depois, entrava no Bom Dia Brasil.
Foi na fase de pilotos para o novo H1 e para o Em Ponto que o quadro de Izabella piorou. "Comecei a sentir taquicardia, a ter crises de choro, crises nervosas, sintomas de esgotamento", conta. O auge foi em 14 de agosto. Ela teve um apagão em pleno ar, enquanto interagia com José Roberto Burnier, âncora do Em Ponto.
"Estava falando do tempo nas capitais e não conseguia lembrar de Curitiba. Só falava 'no Paraná, no Paraná, no Paraná', até que o Burnier falou Curitiba. Não lembrava da capital do meu Estado", diz a paranaense de Apucarana. No mesmo dia, seu médico a diagnosticou com risco de convulsões e a mandou tirar licença para descansar e, assim, tratar da síndrome de burnout.
Não foi o primeiro apagão de Izabella. Nos anteriores, ela conseguiu disfarçar graças a piadas e brincadeiras dos âncoras dos telejornais com os quais trabalhava. Ela diz que o excesso de trabalho a deixava apreensiva.
"Tinha medo de não conseguir organizar as ideias e interagir com o apresentador porque, enquanto eu devia organizar as ideias [nos intervalos do Hora 1], tinha que preparar outro jornal", afirma. "Percebi que o que estava acontecendo comigo era muito grave. Você não saber quem é, pra onde vai, isso é muito incapacitante."
Izabella reclama que não teve nenhum apoio da Globo quando ocorreu o primeiro piripaque, mas não se sente no papel de vítima. Ficou chocada com a demissão, mas, após algumas horas, passou a entender que, na lógica de uma empresa, ela foi como uma peça que deu problema e teve de ser trocada.
Segundo ela, a diretora regional do Jornalismo da Globo, Cristina Piasentini, disse que não poderia correr o risco de devolvê-la aos telejornais depois dos apagões. Izabella pediu para voltar à reportagem. "Não tem mais vaga", ouviu.
Agora, ela diz que "está bem, em equilíbrio" e que espera arrumar um novo emprego em TV e se dedicar ao combate do "preconceito" em torno da síndrome de burnout.
Procurada, a Globo emitiu a seguinte nota:
"O motivo pelo qual deixou de trabalhar na TV Globo não guarda nenhuma relação com a licença médica que tirou, mas a emissora não trata em público de suas relações com funcionários ou ex-funcionários. A Globo é reconhecida por todos como uma empresa que zela por seus funcionários, dando todo o apoio possível. Como já dissemos antes, a Globo agradece à Isabela pelos anos de convivência, dedicação e profissionalismo."