79% dizem que reabertura de escolas agravará pandemia, mostra Datafolha
O Datafolha ouviu 2.065 pessoas de todo o país nos dias 11 e 12 de agosto por telefone
Para 79% dos brasileiros, a reabertura das escolas no país vai agravar a pandemia do novo coronavírus e, por isso, as unidades deveriam continuar fechadas nos próximos dois meses, segundo pesquisa Datafolha. O levantamento mostra ainda que a preferência pela retomada das atividades escolares não é majoritária em nenhum dos segmentos pesquisados.
Dos entrevistados, 59% disseram crer que a retomada das aulas presenciais piorará muito a situação, e outros 20%, um pouco. Outros 18% afirmaram que não haverá efeito na disseminação do vírus, e 3% disseram não saber.
Desde junho, quando 76% responderam que elas não deveriam ser reabertas, a proporção de brasileiros que defende a continuidade do fechamento das escolas oscilou positivamente dentro do limite da margem de erro, que é de dois pontos percentuais em ambas as direções.
O Datafolha ouviu 2.065 pessoas de todo o país nos dias 11 e 12 de agosto por telefone, modelo que evita o contato pessoal entre pesquisadores e entrevistados e exige questionários mais rápidos.
Para especialistas em educação e saúde, a estabilidade da proporção de pessoas que defende a não retomada das aulas presenciais mostra que há pouca confiança no controle da pandemia e na capacidade de organização dos protocolos de higiene para um retorno seguro dos estudantes.
Nesta segunda (17), o país somou mais de 108 mil mortes registradas por coronavírus, com uma média diária de mortes que paira em mil. A situação do Brasil na pandemia é classificada como estável, ou seja, com número constante de novos casos, mas ainda em volume significativo.
Mesmo nas regiões do país em que a velocidade da doença está em redução, como no Norte, a maioria da população ainda defende que as escolas continuem fechadas.
A defesa pela manutenção das escolas fechadas é majoritária em todas as faixas etárias e de renda e em todos os estratos pesquisados pelo Datafolha, incluindo aqueles que consideram o governo Bolsonaro ótimo ou bom e entre os que estão saindo de casa normalmente na pandemia.
Há diferença, contudo, na avaliação entre os sexos. Enquanto 22% dos homens são a favor da reabertura, o número cai para 17% entre as mulheres.
Entre os diferentes tipos de ocupação, os trabalhadores sem registro em carteira são os que proporcionalmente mais defendem a reabertura (32%), seguidos de estudantes (31%) e empresários (27%).
Outro grupo com mais defensores da volta às aulas presenciais são os que afirmam estar "vivendo normalmente" durante a pandemia (38%) e os que avaliam o governo Jair Bolsonaro (sem partido) como ótimo ou bom (29%).
"As opiniões e reflexões sobre a pandemia foram politizadas ou partidarizadas no Brasil, e o mesmo acontece com a reabertura das escolas. Mas, nesse aspecto ainda temos um consenso maior, que é um receio e a insegurança, quase generalizados, com a volta às aulas", disse Claudia Costin, ex-diretora de educação do Banco Mundial e colunista da Folha.
Para Costin, a dificuldade das autoridades de saúde em controlar a pandemia no país é o principal fator de insegurança na população.
"Ainda não estabilizamos o número de casos e não paramos de crescer, por isso, é precipitado anunciar a volta das escolas. Mesmo países que haviam controlado a pandemia tiveram uma segunda onda de contágio com a retomada das aulas presenciais."
Salomão Ximenes, professor de políticas públicas da UFABC, afirma que, além da sensação de insegurança em relação ao controle da pandemia, os dados também indicam que a população tem pouca confiança na condições de reabertura das escolas. "Apesar dos protocolos anunciados pelos estados para a retomada das aulas, as pessoas conhecem a realidade dos colégios"
Na semana passada, o Amazonas se tornou o primeiro estado do país a retomar as aulas presenciais em escolas públicas. O retorno foi marcado por acusações de descumprimento das regras de distanciamento social, distribuição de máscaras em tamanho incompatível com os estudantes e uma greve parcial de professores.
"Antes de fazer a reabertura, é preciso olhar para a estrutura que temos para reorganizar o processo escolar. São muitas as adaptações que teremos de fazer, muitas regras novas a serem respeitadas para que de fato se diga que há segurança para essa volta", disse Luiz Miguel Garcia, presidente da Undime (entidade que reúne secretários municipais de Educação).
A pediatra Sandra Vieira, professora e pesquisadora da Faculdade de Medicina da USP, disse que a reabertura das escolas significa a retomada do setor que vai colocar o maior número de pessoas em circulação e, consequentemente, o vírus. "Não são só as crianças, mas os professores, funcionários, os pais, o transporte escolar e público. É o setor que implica na maior mobilização."
Ela destacou ainda que não há estudo conclusivo sobre as crianças e jovens serem menos suscetíveis a se contaminarem e transmitir o vírus, ainda que elas tendam a desenvolver quadros mais leves. "Precisamos considerar essas questões para evitar um aumento de contágio com a volta às aulas."
Entrevistas foram feitas por telefone devido à pandemia
A pesquisa telefônica, utilizada neste estudo, representa o total da população adulta do país. As entrevistas foram realizadas por profissionais treinados para abordagens telefônicas e as ligações feitas para aparelhos celulares, utilizados por cerca de 90% da população.
O método telefônico exige questionários rápidos, sem utilização de estímulos visuais, como cartão com nomes de candidatos, por exemplo.
Assim, mesmo com a distribuição da amostra por cotas de sexo e idade dentro de cada macrorregião, e da posterior ponderação dos resultados segundo escolaridade, os dados devem ser analisados com alguma cautela por limitar o uso desses instrumentos.
Na pesquisa, feita assim para evitar contato entre pesquisadores e respondentes, o Datafolha adotou as recomendações técnicas necessárias para que os resultados se aproximem ao máximo do universo que se pretende representar.
Todos os profissionais do Datafolha trabalharam em casa, incluídos os entrevistadores, que aplicaram os questionários através de central telefônica remota.