Polícia

De veterinário embriagado à ameaças a clientes: surgem novas denúncias contra clínica veterinária

O portal 7Segundos teve acesso às informações com exclusividade após entrevistar uma ex-funcionária do local

Por 7Segundos 07/05/2021 17h05 - Atualizado em 07/05/2021 17h05
De veterinário embriagado à ameaças a clientes: surgem novas denúncias contra clínica veterinária
HVT - Foto: Reprodução/Web

Após o indiciamento feito pela Polícia Civil de Alagoas do dono de um hospital veterinário, localizado no bairro do Barro Duro, em Maceió, o portal 7Segundos recebeu mais denúncias exclusivas de uma ex-funcionária da clínica, que trabalhou por quatro meses no local, antes de ser demitida. A pessoa em questão pediu para não ser identificada, por esse motivo, o site não irá divulgar o nome, se baseando no artigo 5º, inciso XIV, da Constituição Federal, que garante o sigilo da fonte jornalística.

“O que mais me deixou assustada na minha primeira semana de trabalho foi a falta de condições sanitárias nas baias onde ficavam os animais, os quais ficavam misturados os que tinham doenças virais com os que não tinham. Os contaminados morriam e o local não era limpo, não tinha tempo de desinfecção, quando muito, passavam apenas água. Eles ganhavam dinheiro por internamento, então só se preocupavam com a quantidade”, relatou.

Segundo a fonte, no hospital eram registradas em média quatro mortes por semana e, no dia que a coleta de lixo ia ao local, eram recolhidos cerca de 70 a 80 kg de animais mortos. Geralmente, os bichos atendidos eram de pequeno porte, tornando excepcional ter um mais pesado.

“Assim que cheguei, o freezer já estava lotado com cadáveres. Na minha cabeça, pelo que ouvia do local antes de ir para lá, as pessoas exageravam, acreditava que deveria ter uma porcentagem de óbitos comum. Mas muitos morriam na mesa de cirurgia, por falta de auxílio veterinário especializado”.

A ex-funcionária explicou que era comum o proprietário do local “promover” pessoas que trabalhavam na parte de serviços gerais para serem auxiliares veterinários que, segundo ela, muitas vezes medicavam os animais livremente. “O pior era o dono. Toda vez que operava um animal, falecia. Ele já chegou a realizar operações embriagado e drogado. Uma vez um bicho acordou no meio da cirurgia porque a anestesia perdeu o efeito no meio, teve espasmos e morreu. Quando era plantonista, ficava na sala dele se drogando, não sabia nada da ficha dos animais”.

“O dono do local chegou a usar medicamentos vencidos, com um que tinha data de 2012, e quando infeccionava, ele dizia que o corpo do animal rejeitava e, geralmente morria. Lá não existia especialidades, não tinha anestesista, ortopedista, etc. Todos eram clínicos gerais, mesmo sem formação. Ele coloca o filho, que cursa o quinto período de veterinária, para realizar os procedimentos cirúrgicos.”

Ela explica que a constante negligência do proprietário já ocasionou em erros graves durante cirurgia. “Já teve animal que chegou lá com a perna doente. Ele amputou o membro errado. O bicho voltou para casa sem uma perna sadia, mas ainda tinha a doente”.

Superfaturamento, fome e extermínio

A fonte contou que, muitas vezes, ele cobrava a mais para tratar um problema que o animal adquiriu no próprio hospital. “A maioria dos clientes eram de baixa renda. Às vezes não conseguiam pagar da forma que eles parcelavam, então os animais ficavam lá. Quando isso acontecia, especialmente com gatos, ele jogava os bichos no porão, onde tinha um cachorro de grande porte que os comia”.

A ex-funcionária explica que o animal em questão era mal alimentado com restos de quentinha, pois o dono se recusava a dar ração. “Também era usado o sangue dele para transfusão, sem fazer nenhum tipo de exame”. Animais passando fome eram cenas comuns, segundo ela. “Ele comprava ração de baixa qualidade e faltava muitas vezes. Alguns já chegaram a passar cinco dias sem comer.

“Teve uma cliente de São Paulo uma vez que chegou com um bichinho, que estava em uma situação péssima, quase morto. Ele internou o animal, não fez absolutamente nada e o bicho morreu por falta de tratamento. Mas ele só informou dois dias depois, para não devolver os R$ 3 mil cobrados”.

Coerção e ameaças a clientes

“Os recepcionistas eram ‘treinados’ por ele para serem rudes e coagirem os clientes a não processarem. Como a maioria não tinha muita instrução, nunca chegava a prestar queixa, pois tinham medo ao ouvirem que ‘os advogados da clínica seriam acionados’”.

A fonte contou que, quando alguns casos eram judicializados, uma das funcionárias, que era de menor, assinava os processos a mando do proprietário, e não dava em nada.

Racismo e assédio

A ex-funcionária contou que já presenciou diversas situações de racismo e assédio sexual, este tanto contra funcionárias, quanto clientes. “Ele já chegou a dizer para uma candidata a vaga de emprego que gostou do currículo dela, mas não pensava em contratar por ser preta. E também já perseguiu uma cliente quando ela foi ao banheiro. Ele costumava dizer para as funcionárias que ‘empregada que não levava para cama, não servia para trabalhar com ele’”.

Interrogatório policial

Como foi citado no começo da matéria, o dono do hospital foi indiciado e prestou depoimento à Polícia Civil na manhã desta sexta-feira (07). O delegado responsável pelo caso, Leonam Pinheiro, explicou que esse interrogatório preliminar foi mais “genérico”, perguntando sobre coisas como a estrutura do local e o controle de medicamentos.

O suspeito será ouvido novamente nas próximas semanas. O delegado também disse que, após o primeiro Boletim de Ocorrência ser registrado, mais 12 foram feitos, narrando fatos diferentes e, depois, o proprietário vai ser interrogado por cada um deles.

Posicionamento da empresa

O portal 7Segundos entrou em contato com o hospital veterinário, que informou que os animais sempre foram bem tratados, alegando terem vídeos que comprovam isso, os quais são enviados para os tutores.

Por meio do Instagram, foi divulgada uma nota de esclarecimento, na qual a empresa lamentou a morte do cachorro Lock e repudiou “as informações veiculadas nas redes sociais desprovidas de veracidade, baseada em comentários revestidos de interesses de outros”.

“Temos uma equipe qualificada e quem nos conhece de perto sabe o quanto somos preocupados com o bem-estar de cada animal. Todas as nossas instalações são monitoradas e limpas 24 horas, de maneira que a qualquer momento e sem prévio agendamento podemos apresentá-la”.