Tenho maturidade para ser prefeito, diz deputado que xingou sindicalistas
O deputado critica Jair Bolsonaro e João Doria (PSDB), mas compartilha de valores da direita.
A notoriedade obtida com uma sequência de brigas serve para alavancar o deputado estadual Arthur do Val, o Mamãe Falei, na corrida pela Prefeitura de São Paulo, mas o comportamento não definirá sua eventual gestão no cargo.
Assim promete o segundo mais votado da Assembleia Legislativa paulista, num cenário em que o próprio presidente da República é criticado por não abandonar o estilo de deputado baixo clero.
No dia 4, um empurra-empurra entre deputados começou quando petistas ameaçaram agredir Arthur, que chamara sindicalistas presentes na Assembleia 11 vezes de vagabundos --termo que usou contra seus pares em outra ocasião, pela qual foi advertido.
"Quando você é o chefe do Executivo, sua postura tem de ser outra. Às vezes menos combativa e mais flexível", diz Arthur em entrevista à reportagem.
Para viabilizar seu projeto, está em busca de um partido --foi expulso do DEM há um mês. Ele servirá de laboratório do MBL (Movimento Brasil Livre), do qual faz parte, para candidaturas majoritárias.
O deputado critica Jair Bolsonaro e João Doria (PSDB), mas compartilha de valores da direita. Seu objetivo é enxugar radicalmente o Estado.
Pergunta - Chamar servidores de vagabundos é compatível com o cargo de deputado estadual?
Arthur Mamãe Falei - Acho que sim. Eu não xinguei servidores, minha mãe é professora pública, minha tia também, tenho dois avós que trabalharam até morrer como enfermeiros do estado.
Eu xinguei sindicalistas que estavam me ameaçando de morte, chamando a mim e às pessoas que votavam sim no projeto [de reforma da Previdência] de nazistas, assassinos. Eu não falo que servidor é tudo vagabundo. Eu olho no cara e falo: "você de óculos aí, você é vagabundo". E eu reafirmo. Sindicalista que se apoia nas costas do trabalhador para ficar sustentando mamata é vagabundo mesmo.
Mas é postura de deputado chamar para a briga?
AMF - Eu não chamei para a briga. Em nenhum momento falei "vamos sair na porrada". Se estou aqui e acredito na política é porque não acredito na barbárie. Meu jeito sempre foi mais combativo, e vou continuar assim. Tomei bastante cuidado. As minhas palavras, por mais que eu pareça ali que eu estou exaltado, usei com muita cautela.
O sr. não estava exaltado?
AMF - Não. Eu estava dentro da normalidade. Lógico, um pouquinho, mas não fora de controle.
O sr. tem maturidade política e pessoal para ser prefeito?
AMF - Sim. Existe um efeito colateral do tipo de comunicação que faço, mas é um caminho que escolhi. E o trabalho que não é midiático e a gente faz? Que é ter convicção de votar contra um monte de politicagem que acontece aqui na Casa.
Eu não surgi do nada. Não sou um cara que de repente abriu um canal no YouTube e não tinha nada para falar. Fui trabalhar, abri empresa, tive sucesso na iniciativa privada. Então existe, sim, uma maturidade. Não é um moleque bobão xingando todo mundo.
Como prefeito, o sr. vai negociar com sindicalistas? Ou vai dizer que é vagabundo?
AMF - Quando você é o chefe do Executivo, sua postura tem de ser outra. Você tem de ter uma postura às vezes menos combativa e mais flexível.
O prefeito Mamãe Falei não terá a mesma atitude do que o deputado, então?
AMF - Com certeza. São papéis diferentes. Sou o mesmo cara. Agora, o jeito de me comportar é diferente.
É possível fazer muitas críticas aos sindicatos e à maneira como operam. Mas o sr. não entende que eles são legítimos?
AMF - Depende. A partir do momento que tem financiamento compulsório e unicidade obrigando que você se filie só àquele sindicato, não pode dizer que aquilo é legítimo.
Mas a lei é assim. A culpa é deles?
AMF - Opa, claro que é. A lei foi feita desse jeito por causa de pressão de corporações como sindicatos. Eu não estou falando que sindicato não deveria existir. Deveria existir nos moldes espontâneos.
Quais são seus principais feitos na Casa?
AMF - Sou o deputado mais barato da Casa. Eu tenho 6 dos 32 funcionários que posso ter, abri mão de todos os benefícios. Isso manda um recado para todos os outros parlamentares e para a sociedade.
E barrei os principais projetos que desrespeitam o dinheiro público. Barrei sozinho o projeto que aumentava em R$ 4.000 o benefício para deputados alugarem carro. Fiz um discurso de três minutos e pouco que finalizou a sessão, viralizou e os deputados ficaram constrangidos em votar.
Por que o sr. não declarou nada de verba de gabinete? O sr. não comprou nem uma folha de sulfite em nove meses?
AMF - Não. Às vezes eu recebo um convite de um evento que vai ter aqui. Aí vem um envelope lindo, com a cara do deputado, brilhante. Quanto será que custou? Não é só pelo valor do envelope, é pelo recado que passa. No começo do ano eu gastei R$ 150, comprei uns pacotes de folha de sulfite, canetas, clipes e até hoje ninguém precisou mais.
O MBL, ao qual o sr. é ligado, defende privatização. Como avalia o programa de desestatização atual da prefeitura?
AMF - É bem-intencionado, só que por alguns motivos não deu certo. Se você pegar a privatização do Anhembi, ninguém se interessou. Se não apareceu interessado, está esquisito.
Posso dizer a mesma coisa da Prodam, do autódromo e das praças. É bem-intencionado, mas tecnicamente mal feito. Eu faria mais parecido com Nova York --no Central Park você pode comprar o banco onde conheceu sua esposa.
Sua ideia é privatizar tudo?
AMF - A gente não pode ser liberal bobo. Não posso chegar aqui e dizer "ah, é absurdo ter subsídio para transporte". Nenhuma cidade do mundo, fora Seul, conseguiu não subsidiar transporte. Se você fizer um estudo técnico dentro de um parâmetro aceitável, dá para privatizar praticamente tudo.
Escola, saúde, inclusive?"? Não, eu nem posso, pela Constituição. O que dá para ser feito são programas liberais de voucher. Sobre transporte por aplicativo, sou a favor da completa desregulamentação desse tipo de serviço.
Como vê o cenário eleitoral? Acha que consegue pegar o voto da direita bolsonarista?
AMF - O cenário é o seguinte: tem a esquerda da lacração, a esquerda PSOL, que tem um engajamento forte, mas um teto [de votos] baixo. Tem a esquerda petista, que atrapalha a esquerda não-petista, provavelmente Márcio França (PSB).
Na direita, temos no meio o Bruno Covas (PSDB) com voto de máquina. Na centro-direita, o Andrea Matarazzo (PSD), o Felipe Sabará (Novo) e eu. E uma direita mais ideológica, com algum candidato do Bolsonaro. Tem a Joice Hasselmann (PSL), que é uma incógnita. Acabou de sair um vídeo dela dançando com o Doria. É simbólico. Ela está chutando o Bolsonaro e abraçando o Doria. Qual a viabilidade eleitoral disso?
O sr. não tem partido. Essa incerteza vai até quando?
AMF - Estou conversando com muita gente. É impressionante como os partidos são rachados. O que sei é que não vou ser vice de ninguém.
Sua campanha vai ser muito centrada no combate aos privilégios. Isso como bandeira de candidato a prefeito não é insuficiente?
AMF - Minha campanha não vai ser centrada nisso. Tudo bem, você vai combater privilégios, mas e a saúde? E a educação? As pessoas têm demandas reais. A base da minha candidatura não é minha experiência de deputado. Aprendi muito mais na vida privada e na vida real.