Bolsonaro não confiava em ex-diretor da PF porque Moro era 'desarmamentista', diz deputada
Em depoimento, Carla Zambelli explicou conversa com ex-ministro da Justiça sobre o tema, uma semana antes da crise no governo
A deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) afirmou nesta quarta-feira (13), em depoimento à Polícia Federal, acreditar que o presidente Jair Bolsonaro não confiava no ex-diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, porque o então ministro Sergio Moro era "desarmamentista".
Segundo a parlamentar, Moro e o presidente Jair Bolsonaro haviam tido "algo recente" – um conflito ou uma divergência, pelo teor do depoimento – sobre esse tema.
Como a Polícia Federal é responsável pela emissão de registros e porte de armas, diz Zambelli, o presidente "não confiaria" no delegado Valeixo – indicado ao posto por Sergio Moro ainda em 2018.
De acordo com o termo de depoimento, uma mensagem sobre esse assunto foi enviada por Carla Zambelli a Sergio Moro em 17 de abril, uma semana antes da troca na direção da PF e do pedido de demissão do ministro. O conteúdo da mensagem não é descrito no documento.
A parlamentar diz no depoimento que não ouviu de Bolsonaro, diretamente, nenhuma manifestação de desconfiança sobre Valeixo. A mensagem, segundo ela, foi enviada "no contexto" da disputa entre Moro e Bolsonaro sobre a questão das armas.
"QUE questionada sobre a mensagem [...], esclarece que o presidente Jair Bolsonaro não chegou a externar desconfiança com o ex-diretor Geral Maurício Valeixo, e que a mensagem foi no contexto de que o ex-ministro Sergio Moro era desarmamentista, e por tal razão este e o presidente Jair Bolsonaro haviam tido "algo recente" e por esta mesma razão o presidente não confiaria no delegado Valeixo, então Diretor Geral da Polícia Federal, órgão responsável pela emissão de registros e porte de armas", diz o termo.
Aliada de Jair Bolsonaro, Carla Zambelli prestou depoimento no inquérito aberto pelo ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, para apurar suposta interferência política do presidente Jair Bolsonaro na Polícia Federal. De acordo com o ex-ministro Sergio Moro, Bolsonaro pressionou por mudanças na direção-geral e na superintendência da PF no Rio de Janeiro.
A vaga no STF
Zambelli foi chamada a prestar depoimento porque, no dia em que pediu demissão, Moro entregou ao Jornal Nacional conversas com a deputada que, na visão dele, comprovariam as tentativas de influência do governo nos rumos de inquéritos da PF (veja vídeo).
Nas mensagens, a parlamentar afirma que, se Moro aceitasse a substituição defendida por Bolsonaro na direção-geral da PF, poderia, após alguns meses, ser indicado como ministro do Supremo Tribunal Federal.
Questionada sobre essas mensagens no depoimento, a deputada do PSL disse que "como ativista, chegou a trabalhar junto ao então presidente [Michel] Temer na indicação de Ives Gandra Martins Filho à vaga do STF do Ministro Teori".
E que, por isso, achava que poderia "trabalhar junto ao presidente Jair Bolsonaro" para que Sergio Moro fosse o substituto do ministro Celso de Mello. O decano do STF se aposenta por idade no fim deste ano.
Ainda sobre a tentativa de emplacar Moro no STF, a deputada diz que não chegou a conversar com Bolsonaro, ou interlocutores do presidente, sobre a proposta feita a Moro por mensagens de celular.
O ministro Teori Zavascki morreu em janeiro de 2017, em um acidente aéreo. Na época, Carla Zambelli não tinha mandato político e liderava um movimento social de direita. Um mês após a morte, Temer indicou Alexandre de Moraes para a vaga deixada por Teori.
O jurista Ives Gandra Filho, citado por Carla Zambelli, é ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
A véspera da demissão
O depoimento também detalha conversas tidas por Carla Zambelli em 23 de abril, um dia antes das trocas na PF e no Ministério da Justiça. As mensagens reveladas pelo Jornal Nacional mostram que, nesse dia, a deputada já tinha tentado convencer Moro a permanecer no cargo.
Segundo o relato, a parlamentar também "estabeleceu contato ao telefone com o próprio Delegado Maurício Valeixo, por meio de chamada no aplicativo WhatsApp".
Nessa ligação, Carla Zambelli diz ter escutado, de Valeixo, que ele "já havia pedido demissão naquele dia, sem lhe revelar o motivo, porém o ex-ministro Sergio Moro não havia aceito".
A deputada também diz que fez contato, na véspera da exoneração de Valeixo, com o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, e com o secretário de Comunicação da Presidência da República, Fábio Wajngarten.
Ambos sugeriram, segundo Carla Zambelli, que ela "continuasse a manter contato com Sergio Moro, 'fazendo o possível' para que o mesmo permanecesse como ministro.