Alagoas

Trabalho Infantil em Alagoas: um alerta para o futuro de crianças e adolescentes

As consequências do trabalho infantil são profundas e impactam negativamente a vida das crianças e adolescentes envolvidos

Por 7Segundos 30/07/2023 16h04
Trabalho Infantil em Alagoas: um alerta para o futuro de crianças e adolescentes
Trabalho Infantil - Foto: Ilustração

Alagoas enfrenta, há décadas, uma triste realidade em relação ao trabalho infantil. De acordo com dados divulgados pelo Painel de Informações Estatísticas da Inspeção do Trabalho no Brasil, o número de casos de crianças e adolescentes encontrados em situação de trabalho infantil no estado aumentou significativamente. Em 2021, foram registrados 11 casos, enquanto no ano passado esse número saltou para 20, representando um alarmante aumento de 81,8% em apenas um ano.

Os registros foram obtidos por meio de fiscalizações da Auditoria Fiscal do Trabalho, que abrangeram o período de janeiro a novembro de 2022. Os casos incluem tanto crianças com menos de 16 anos trabalhando, quanto adolescentes de 16 e 17 anos exercendo atividades proibidas pela legislação brasileira.

Entre as atividades consideradas como as piores formas de trabalho infantil, destacam-se trabalhos nas ruas e outros logradouros públicos, venda de bebidas alcóolicas e trabalhos de manutenção, limpeza e lubrificação de veículos. É preocupante notar que, dos 20 casos registrados, oito deles se enquadram nessas condições mais extremas.

O trabalho infantil tem consequências que podem afetar toda uma vida. É o caso de Josefa Maria de Jesus, que atualmente tem 52 anos. Ela foi retirada do seio familiar aos nove anos, na comunidade rural Riachão, em Junqueiro, para morar e trabalhar na casa de uma família em Arapiraca.

“Naquela época, era muito difícil conseguir carro para visitar minha família. Lembro de ter passado mais de três anos sem ver meus pais e irmãos. Não tinha telefone onde eles moravam e a comunicação era impossível”, relatou.

Para dona Josefa, o trabalho infantil foi responsável por um dos maiores traumas da sua vida.

“A falta de contato com meus familiares fez com que eu nem soubesse sobre o falecimento da minha mãe. Eu tinha uns 14 anos na época e encontrei um morador antigo do Riachão na feira livre de Arapiraca. Lá, no meio da multidão, esse homem falou sobre minha mãe como finada. Cheguei em casa chorando e dois dias depois descobri que minha mãe tinha morrido há mais de seis meses. Adoeci de tanta tristeza”, continuou.

Josefa trabalhou como doméstica em troca de um prato de comida. Sem tempo - e oportunidade - de estudar, chegou aos 15 anos sem saber ler e escrever. Ela conta que deixou a casa dos patrões para trabalhar na loja de uma vizinha. Com o pouco que ganhava, alugou uma casa e passou a morar sozinha. 

"A casa não tinha nada, mas eu conseguia sobreviver. Foi então que procurei uma escola, pois queria correr atrás do tempo perdido. Não cheguei a fazer faculdade, mas consegui construir minha vida e minha família", concluiu Josefa, que atualmente mora no bairro do Jacintinho, em Maceió.

E é na capital do estado que se concentra o maior  número de crianças em trabalho infantil, totalizando 16 casos, o que representa 80% do total registrado em Alagoas. Os outros quatro registros foram feitos em municípios vizinhos, incluindo Paripueira, São José da Laje e São Miguel dos Campos.

Essa problemática não é exclusiva de Alagoas ou do Brasil, mas sim uma questão global que merece atenção urgente. De acordo com o relatório conjunto da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), intitulado "Trabalho infantil: Estimativas globais de 2020, tendências e o caminho a seguir", estima-se que 160 milhões de crianças e adolescentes, com idades entre 5 e 17 anos, estavam envolvidos em trabalho infantil no início de 2020. Dessas vítimas, 63 milhões eram meninas e 97 milhões eram meninos.

O relatório também revelou que 79 milhões de crianças e adolescentes estavam submetidos a trabalhos perigosos, que colocam em risco sua saúde, segurança e moral. A agricultura é a área com maior incidência de trabalho infantil, representando 80,9% dos casos, seguida pelos setores de serviços (19,7%) e indústria (10,3%).

Infelizmente, pela primeira vez em 20 anos, o progresso para combater o trabalho infantil estagnou, revertendo a tendência de queda anterior que viu a violação diminuir em 94 milhões entre 2000 e 2016. A pandemia da COVID-19 foi apontada como um dos fatores que contribuíram para o aumento dessa realidade, especialmente devido ao aumento da pobreza e ao fechamento de escolas.

As causas do trabalho infantil são multifacetadas, e algumas delas incluem a pobreza, má qualidade da educação e questões culturais. É essencial desconstruir os mitos que ainda envolvem essa questão e trabalhar em conjunto para prevenir e erradicar essa prática nociva.

As consequências do trabalho infantil são profundas e impactam negativamente a vida das crianças e adolescentes envolvidos. Além de perpetuar o ciclo da pobreza, o trabalho infantil afeta a educação, a saúde física e mental, expõe os jovens à violência e acidentes, prejudica o desenvolvimento emocional e social e pode causar traumas irreversíveis.

A infância é uma fase crucial para o desenvolvimento pleno das crianças, e privá-las desse período de sonhos, brincadeiras e educação adequada prejudica não só o seu futuro, mas também o futuro da sociedade como um todo. É responsabilidade de todos os setores da sociedade, do governo às organizações não governamentais e à população em geral, trabalhar em conjunto para proteger nossas crianças e garantir que elas tenham a oportunidade de crescer em um ambiente seguro, saudável e livre de exploração.

Somente com um esforço conjunto e contínuo, será possível combater efetivamente o trabalho infantil e proporcionar um futuro digno e promissor para as crianças e adolescentes de Alagoas e do Brasil.