MPF denuncia Eduardo Cunha por lavagem de dinheiro e organização criminosa
O MPF (Ministério Público Federal) denunciou os ex-presidentes da Câmara dos Deputados Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) e Eduardo Cunha (PMDB-RJ) por envolvimento no esquema de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa investigada na Operação Manus, deflagrada no último dia 6 de junho e que deriva da Operação Lava Jato.
Os ex-parlamentares são acusados de receber pelo menos R$ 11,5 milhões em propinas de empreiteiras. Cunha está preso em Curitiba, em função de uma condenação na Lava Jato. E Alves, preso preventivamente, encontra-se atualmente custodiado na Academia de Polícia Militar do Rio Grande do Norte.
A denúncia, que foi entregue à Justiça Federal na terça-feira (20), também acusa outras quatros pessoas pelo esquema. Entre elas, estão o ex-presidente da empreiteira OAS, Léo Pinheiro; Fred Queiroz, o empresário e ex-secretário de Obras de Natal; e o empresário Arturo Arruda, sócio da Art&C Marketing Político Ltda..
Um colaborador das investigações, o executivo da Odebrecht Fernando Ayres também foi denunciado.
De acordo com a denúncia, os dois ex-parlamentares solicitaram e aceitaram vantagens indevidas, "de forma oculta e disfarçada, por meio de doações eleitorais oficiais e não oficiais, em razão da atuação política e parlamentar de ambos em favor dos interesses de empreiteiras". A ação teria ocorrido pelo menos entre 2012 e 2014.
Os procuradores dizem que basearam a denúncia em documentos, prestações de contas eleitorais, testemunhos e depoimentos de delações premiadas. "Esse conjunto confirma as ilegalidades cometidas pelo grupo", diz o MPF, que diz acreditar que, entre Eduardo Cunha e Henrique Alves, existia uma "parceria criminosa".
Crimes
Caso a denúncia seja aceita pela Justiça Federal, os dois políticos irão responder por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Já Léo Pinheiro e Fernando Ayres, por corrupção ativa e lavagem de dinheiro. Os empresários Fred Queiroz e Arturo Arruda, por lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Segundo o MPF, os ex-deputados e os executivos da OAS e Odebrecht não foram denunciados por organização criminosa porque já respondem por esse crime em outras ações.
Os procuradores ainda pedem "a reparação dos danos materiais e morais, no valor mínimo de R$ R$ 15,5 milhões, e a decretação da perda da função pública para os condenados detentores de cargo, emprego público ou mandato eletivo".
Vantagens
Em troca de propinas, os ex-deputados atuaram para mudar a legislação a fim de evitar restrição à participação da OAS na privatização dos aeroportos do Galeão, no Rio de Janeiro, e de Confins, em Minas Gerais. Cunha e Alves ainda atuaram para "superação de entraves à liberação de financiamento do BNDES relativo à obra da Arena das Dunas", sede de Natal na Copa do Mundo de 2014.
As vantagens ilícitas aos ex-parlamentares, segundo os procuradores, foi "disfarçada" em doação eleitoral. "Em junho de 2012, ainda antes do período de campanha, foram pagos R$ 700 mil pela OAS, por meio do Diretório Nacional do PMDB, sempre com aval de Léo Pinheiro".
No total, nesse período, a OAS fez repasses de R$ 6,85 milhões a contas de campanhas e diretórios do PMDB.
Já em 2014, houve solicitação de propina por parte de Cunha e Alves, segundo o MPF, à Odebrecht, que repassou pelo menos R$ 1 milhão, através dos diretórios nacional e estadual do partido. "Eram 'valores devidos' pela OAS, mas, em razão da afirmativa de Léo Pinheiro de que não era viável a realização do pagamento naquela ocasião, as quantias acabaram sendo solicitadas à Odebrecht, para posterior compensação entre as empreiteiras", disseram os procuradores.
Mas a Odebrecht também fez pagamentos tendo em vista seus próprios interesses. De agosto a outubro de 2014, os ex-deputados receberam R$ 2 milhões em caixa dois, valor acertado com Fernando Ayres, "em razão da promessa de privatização da Companhia de Água e Esgoto do Rio Grande do Norte, operação na qual havia interesse da empreiteira em realizar investimento".
Mais empresas
Também houve repasses de outras duas empreiteiras. De junho a outubro de 2014, R$ 400 mil foram pagos pela Carioca Engenharia como "doações eleitorais oficiais feitas à conta de campanha de Henrique Alves", segundo o MPF.
Cunha, de acordo com a denúncia, também agia pelos interesses da empreiteira, "em especial entre os anos de 2011 e 2013", por meio da obtenção de financiamento perante a Caixa Econômica para obras do Porto Maravilha, no Rio de Janeiro. "Em função dessa 'ajuda', os dois ex-deputados receberam propina no exterior", dizem os procuradores.
A Andrade Gutierrez, por sua vez, doou R$ 1,25 milhão ao diretório potiguar do PMDB entre julho e setembro de 2014. Desse valor, R$ 100 mil foram diretamente para a conta de campanha de Henrique Alves.
Os valores eram uma contrapartida pela atuação de Cunha em uma Medida Provisória que tratava da tributação do lucro de empresas brasileiras no exterior, "de modo que o texto final contemplasse os interesses da empresa, o que acabou de fato ocorrendo", pontua o MPF.
Estádio
Na denúncia, o MPF aponta que Alves atuou no TCE (Tribunal de Contas do Estado) do Rio Grande do Norte para que o financiamento do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) referente à Arena das Dunas, obra da OAS, não fosse negado. "O foi procurado pela empreiteira e se dispôs a agir junto ao TCE e ainda a ir 'pra cima do TCU', o Tribunal de Contas da União", dizem os procuradores.
Em mensagens, Alves antecipou a Léo Pinheiro que falaria com o primo para buscar o aval do TCE. O parente em questão é Paulo Roberto Alves, então presidente do TCE. "Ele [Henrique Alves], no mínimo, omitiu-se de seu dever funcional, como parlamentar federal, de fiscalizar a regular aplicação de recursos do BNDES, para, em vez disso, favorecer interesses particulares de empreiteira", reforçou o MPF.
Segundo a denúncia, o ex-parlamentar ainda obteve vantagens indevidas da OAS no contrato de utilização da Arena das Dunas para o ABC e o América, os dois principais times do Estado. Cada equipe recebeu o valor de R$ 2 milhões da OAS.
Lavagem
Empresas de familiares, aliados políticos e de fachada foram usadas para "justificar, ocultar e dissimular, em prestação de contas eleitoral, a utilização de recursos de origem e destinação ilícitas" da campanha de Alves ao governo do Rio Grande do Norte em 2014, segundo o MPF. O esquema operou de lavagem operou entre julho de 2014 e fevereiro de 2015.
Por uma empresa que está no nome da mulher de Fred Queiroz passaram mais de R$ 9 milhões. Desse valor, R$ 5,5 milhões foram sacados em espécie, segundo o MPF.
A firma serviu como instrumento para compra de apoio à campanha de 2014. "Foram feitos repasses a 18 prefeitos, vereadores, lideranças políticas e familiares de políticos do interior e da capital", diz a denúncia.
Outra empresa, de um filho de Fred, recebeu R$ 1,1 milhão, "o que evidencia o desvio de recursos em benefício particular do grupo familiar em questão", concluem os procuradores.
Já para uma firma de marketing político, do cunhado de Arturo Arruda, a campanha do ex-ministro transferiu R$ 1,3 milhão, que teriam sido revertidos em favor da família de Alves.
O MPF ainda diz ter apreendido na casa do político, durante a operação de 6 de junho, uma planilha que retrata a distribuição de valores a lideranças em sua campanha, "o que demonstra a efetiva prática de compra de votos".
Posicionamento
A defesa do deputado federal Henrique Eduardo Alves afirmou que soube da denúncia pela imprensa, se inteirará dela e se pronunciará posteriormente.
A reportagem do UOL entrou em contato com a defesa do ex-deputado Eduardo Cunha e aguarda posicionamento.