Alagoas

Bancário retorna ao cargo 52 anos após ter sido exonerado pela ditadura militar

Petrúcio foi preso em 64 e conseguiu reaver o cargo somente cinco decádas depois

Por 7Segundos, com assessoria 08/04/2021 11h11 - Atualizado em 08/04/2021 11h11
Bancário retorna ao cargo 52 anos após ter sido exonerado pela ditadura militar
Bancário retorna ao cargo após ter sido exonerado pela ditadura - Foto: Reprodução

A história e a democracia voltaram a fazer justiça com mais um perseguido da ditadura militar, desta vez o bancário alagoano Petrúcio Lages, reintegrado em agosto ao Banco do Nordeste do Brasil (BNB). Preso em 1964 por sua identificação com as lutas sindicais e sociais, o colega retornou à agência Centro após amargar 52 anos de uma exoneração espúria e traumática.

A experiência sofrida e seus 76 anos de idade seriam motivos para não mais incentivá-lo ao trabalho, à árdua labuta moderna dos bancos. Mas o desejo de retomar o que lhe foi arrancado e a vontade de contribuir com o banco e a sociedade falam mais forte. Petrúcio mantém suas atividades no BNB, diariamente.

Em entrevista ao departamento de comunicação do Sindicato, o bancário contou resumidamente o que sofreu nas garras do regime militar, que além de promover prisões, torturas e forte repressão às entidades representativas dos trabalhadores e da sociedade, impôs seu arbítrio e autoritarismo nas instituições e empresas públicas.

ENTREVISTA


P
- Como você chegou ao BNB ?

R
- Foi em 1960, após prestar concurso um ano antes, em Recife. Minha posse foi em Maceió e fiquei lotado na agência Centro, nessa época na Rua do Comércio.

P-
E sua história política, de onde vem ?

P
- Eu cursei filosofia e era militante do Partido Comunista Brasileiro. Ajudava a editar o jornal dos bancários e o jornal universitário. Atuei na greve de 1963, quando a grande mobilização dos funcionários do BNB conseguiu arrancar algumas conquistas de equiparação salarial e outros benefícios com o Banco do Brasil.

P
- Como você foi preso ?

R
- No dia do golpe militar, em 1° de abril de 1964, e nos dois dias subsequentes, foi decretado feriado nacional no país. Por volta do dia 3 de abril, quando eu retornei da faculdade de filosofia para casa, fui informado por minhas irmãs que os agentes da repressão tinham invadido minha residência, e de forma agressiva, procurando por mim. Daí fugi para Palmeira dos índios e permaneci lá por cerca de 15 dias, na casa de um tio. Até que fui localizado por uma guarnição da Policia Militar, que me encaminhou para Maceió em um ônibus de linha, acompanhado por um soldado armado de metralhadora. Fiquei preso por mais de 90 dias, sendo interrogado e pressionado psicologicamente por diversas vezes.

P
- E como se deu a perseguição no Banco ?

R
- Ainda na prisão recebi a visita de auditores do BNB para responder sobre atividades que eles consideravam subversivas, e o depoimento era para um processo administrativo interno. Após ser libertado da cadeia, em agosto de 1964, voltei a laborar no banco, percebendo de imediato que o clima na agência não era o mesmo. Os colegas não conversavam mais comigo e atravessavam a rua para não cruzar o meu caminho. Fiquei em grande isolamento. Até que em outubro de 1964 saiu no Diário Oficial da União a minha exoneração do BNB.

P
- E você fez o que a partir daí?

R- Migrei para o Rio de Janeiro, onde tirei nova carteira de trabalho. Trabalhei durante um ano para uma empresa de materiais plásticos, redigindo cobranças. Depois trabalhei cinco anos na Editora Letras e Artes. Até que abri uma pequena empresa de vendas de livros pelos Correios.

P
- E sua vida política acabou...

R- Não. Apesar de toda a perseguição que sofri, continuei a militar de forma aleatória em passeatas e protestos contra a ditadura militar.

P
- Como conseguiu voltar ao banco?

R- Em 1990 ingressei com um pedido administrativo no banco pleiteando a minha reintegração, mas ele foi negado. Em 1992 ingressei com ação na Justiça do Trabalho, mas o pleito também foi indeferido. Em 2007 voltei a ingressar com um processo, desta vez acatado pelo Judiciário. A sentença saiu este ano e fui reintegrado em agosto.


DEPOIMENTO


"O Sindicato dos Bancários de Alagoas tem orgulho de receber em sua base um militante valoroso, que lutou no momento mais difícil da historia do país contra o arbítrio do Estado, sem nunca se vergar às dificuldades que esta luta poderia lhe causar. Petrucio Lages é um exemplo de luta e que deve servir de inspiração a todos os trabalhadores, sobretudo a categoria bancaria"