Arapiraca

Prostitutas de Arapiraca: Um retrato de mulheres que trabalham na Rua 16

Por Clau Soares, especial para o 7Segundos 27/07/2014 08h08
Prostitutas de Arapiraca: Um retrato de mulheres que trabalham na Rua 16
Rua 16: tranquilidade disfarça vida difícil de mulheres - Foto: 7Segundos

O trabalho começa cedo, muitas vezes, às 6h, e não tem hora para acabar, estendendo-se pela madrugada. Às segundas-feiras, o movimento é ainda maior e, nestes dias, o atendimento costuma dobrar. As mulheres que compartilham o ambiente de trabalho também têm em comum histórias, filhos, clientes. Na Rua 16, no Centro de Arapiraca, há um verdadeiro batalhão delas que diariamente se desdobram para garantir o sustento de si mesmas e, muitas vezes, da família.

“O povo pensa que essa vida é fácil, que se ganha por prazer, mas aqui é muito difícil”, desabafa Jéssica*. Com a fala embargada, ela confessa que ingere álcool o dia todo, diz que, desde os 18 anos, faz programas. Hoje, com 26 anos, embora a aparência seja de 40, ela diz que vai parar com a prostituição. Mãe de duas meninas, que moram com as avós, Jéssica está grávida do terceiro filho e confessa que já doou o bebê, antes mesmo do nascimento. “Essa vida de puta é muito sofrida”, reafirma.

Aline*, de 30 anos, uma negra com traços típicos de brasileira, sorri, com as respostas da colega. Com simpatia e muita irreverência, ela diz que começou a se prostituir com 14 anos, quando ainda morava em Maceió. Há três meses, veio para Arapiraca procurar emprego em restaurante. “Disseram que aqui era bom para trabalhar”, afirma. Como não conseguiu nenhuma vaga, ela foi para os bares da Rua 16. Os três filhos, um garoto de 14 anos e duas meninas, uma de 12 e a outra de 11, ficaram na capital onde estudam e moram com a avó. “Sempre mando dinheiro para eles”, diz.

Elas revelam que pelo local passam homens casados, autoridades da região, agricultores. Todo tipo de gente. Muitos vão para conversar e tomar bebidas, outros querem ainda mais diversão e pagam pelo programa, que varia de R$ 20 a R$ 50, e dura, em média, 20 minutos. O valor depende do que eles pedem para elas fazerem. Também é o cliente que paga pelo quarto, que custa R$ 10, e deve ser quitado com a dona do estabelecimento. 


O pagamento do programa ocorre antes de ser feito, no entanto, é comum que elas levem o “xexo”, que é um tipo de calote que Jéssica explica: “xexo é quando come e não paga”.
Segundo elas, algumas ficam nos bares que, em média tem três quartos, outras estão lá só para trabalhar e moram até em outras cidades. “Elas passam dois, três dias por aqui e vão embora. Nenhuma mora. Ficam de bar em bar, dormem em pousadas”, explica uma proprietária de bar. Jéssica* diz que está na Rua 16 há dois anos, mas o imóvel onde ela dorme é dela, mas para trabalhar fica nos bares da rua. “Essa vida cansa. Vou sair. Às vezes, dá vontade de meter a mão na cara (do cliente) e eu já meti”, revela.

Aline diz que prefere ficar ali, porque acha mais seguro. “Eu não saio daqui porque na BR (rodovias) é mais perigoso”. Segundo ela, costumam ficar nas vias, mulheres de fora da cidade, travestis e transexuais.

Para Gilda*, ser prostituta é uma necessidade. Ela também tem três filhos e reclama que está com problemas na coluna. “Queria ter estudado, ter um emprego certo, uma vida. É o destino, a precisão”, fala quando perguntamos se ela tinha algum sonho. Gilda diz que já trabalhou como empregada doméstica, mas nunca deu certo.

Para elas, a prostituição é, antes de tudo, uma alternativa para levar a vida e se sustentar. No entanto, apesar de ser um local de diversão, elas revelam que enfrentam dificuldades diárias e que gostariam de ter mais direitos civis, como a aposentadoria.

O professor de Direito, professor Júlio Gomes Duarte Neto, esclarece sobre a questão legal em torno da prostituição no Brasil. Ele frisa que “o Projeto de Lei "Gabriela Leite", de autoria do deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), prevê a regularização dos profissionais de sexo, mas está parado na Câmara dos Deputados”.

“A ideia do Projeto de Lei 4211/2012 é transformar a prostituição em uma profissão regulamentada, com direito à Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) Assinada, Aposentadoria Especial (com apenas 25 anos de trabalho a pessoa poderia se aposentar), e demais direitos inerentes ao trabalhador formal, entre outras coisas”, comenta Júlio Gomes.

Segundo o docente, a prostituição no Brasil não é ilícita, no entanto, agenciar pessoas, ainda que com o consentimento delas, para fazer sexo com pagamento é crime no País. “O que é crime é o ato do favorecimento do sexo de terceiros. O conceito enquadra os cafetões, os intermediários e os donos de casas de prostituição”.

Políticas públicas
Seguindo orientação do Estado, a Secretaria de Políticas para Mulheres de Arapiraca realizou, este mês, um mapeamento da prostituição na cidade. Foram entrevistadas 120 profissionais, entre mulheres, travestis e transexuais, em bares, ruas, rodovias e avenidas do município. O trabalho visa identificar demandas para elaborar políticas públicas dirigidas às prostitutas. A prostituição é uma profissão prevista na lei, mas não dispõe de quase nenhum direito.

*Os nomes são fictícios para preservar a identidade das entrevistadas.