Política

Fantasma "assinou" prestação de contas da prefeitura de São José da Tapera enviada para o TCE

Documentos foram assinados eletronicamente por ex-secretário de Finanças 10 dias depois de ele ter falecido

Por 7Segundos 27/05/2021 13h01 - Atualizado em 27/05/2021 13h01
Fantasma 'assinou' prestação de contas da prefeitura de São José da Tapera enviada para o TCE
São José da Tapera, Sertão alagoano - Foto: Reprodução

O falecimento do ex-secretário de Finanças de São José da Tapera, Alexandre Pereira Lima, ocorrido no dia 18 de abril, teve grande repercussão no município. Alexandre era muito conhecido e a morte dele, em decorrência da Covid-19, causou comoção entre parentes e os muitos amigos que ele tinha. Hoje, um mês após o passamento, o nome dele volta ao centro das discussões no município, por conta da denúncia de que ele teria "assinado", após a morte, a prestação de contas da prefeitura de Tapera, que foi entregue ao Tribunal de Contas do Estado.

Vários documentos anexados à prestação de contas referentes ao exercício financeiro da prefeitura de 2020 - último ano da gestão do ex-prefeito José Antônio Cavalcante - contém a assinatura dele e também de Alexandre Pereira, que respondia pela pasta das Finanças no período. Não haveria qualquer problema se o ex-secretário tivesse assinado os documentos antes do dia 18 de abril, mas a assinatura digital que consta nos documentos registra data e hora em que foram assinados. E todos eles estão datados em dias posteriores ao falecimento dele.

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Um desses é o Demonstrativo da Execução das Despesas por Função/Subfunção. O documento é público e pode ser conferido no portal da Transparência da prefeitura, ou ainda por meio desse link. Ele trás informações discriminadas sobre as despesas, saldos e restos a pagar referente aos meses de novembro e dezembro de 2020, e foram assinados pelo prefeito da época, José Antônio Cavalcante, pelo contador José Aldo Alves da Rocha, e por Alexandre Pereira. A assinatura digital dele aconteceu no dia 29 de abril de 2021 , às 23h03, onze dias após a morte dele.

"Isso faz a gente se perguntar: quem assinou no lugar dele? Alexandre não pode ter atestado as informações contidas na prestação de contas, por qual motivo alguém cometeu crimes de falsidade ideológica e de falsificação de documento público usando o nome dele?", questiona o presidente do Sinteal de São José da Tapera, José Márcio de Oliveira. Ele foi vereador na gestão de José Antônio Cavalcante e disputou a eleição para a prefeitura em 2020, mas não conseguiu se eleger.

Professor Márcio, como é mais conhecido, declarou que está conversando com advogado e, nas próximas semanas, deverá formalizar denúncias em órgãos competentes, como por exemplo, o Ministério Público de Contas.

"Ao meu ver, tanto o ex-prefeito, como o atual prefeito têm responsabilidade sobre a prestação de contas de 2020. O ex-prefeito pelo suposto uso indevido da assinatura digital de alguém que já morreu, o que levanta suspeita de que outras irregularidades podem ter acontecido. Já o atual prefeito é responsável por ter encaminhado esses documentos ao Tribunal de Contas sem conferir a veracidade das informações", declarou.

Assinatura digital

Os documentos eletrônicos podem ser autenticados ou assinados digitalmente, por meio de certificado digital e chaves criptográficas, que servem para identificar quem está assinando o documento, proteger as informações e conferir validade jurídica. Essa assinatura geralmente é feita por meio de um token, dispositivo eletrônico parecido com um pendrive. Após a inserção do dispositivo, o portador deve ainda inserir a sua senha pessoal da certificação digital.

Neste caso específico, quem assinou a prestação de contas no lugar de Alexandre Pereira, além de estar com o token que pertencia a ele em mãos, também conhecia a senha utilizada pelo ex-secretário.

Prestação de contas

A prestação de contas é um dos deveres dos gestores municipais. Os documentos referentes ao exercício financeiro anual das prefeituras devem ser publicados no Portal da Transparência e encaminhado para a Câmara de Vereadores e para o Tribunal de Contas do Estado.

A reportagem entrou em contato com a assessoria de comunicação do Tribunal de Contas do Estado, que explicou que a prestação de contas referentes ao ano de 2020 tinha prazo até o final de abril deste ano para ser entregue ao órgão fiscalizador. Após receber os documentos, eles são distribuídos, por sorteio, para um dos conselheiros, que analisam os dados e dão aprovação ou reprovação das contas. Caso alguma irregularidade seja identificada, o conselheiro pode requisitar mais informações ou até mesmo abrir uma ação de improbidade administrativa contra o gestor.

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