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Psicólogo viaja 3 mil km de moto em homenagem a amigo que morreu em Noronha

Lucas Raphael Merigueti saiu de Ribeirão Branco (SP), cidade onde o turista morava, e segue até o Ceará

Por G1 Itapetininga e Região 11/06/2021 09h09 - Atualizado em 11/06/2021 09h09
Psicólogo viaja 3 mil km de moto em homenagem a amigo que morreu em Noronha
Psicólogo viaja quase 3 mil km de moto em homenagem a amigo de Ribeirão Branco - Foto: Elizabeth Verneque Cordeiro Silva/Arquivo pessoal

O psicólogo Lucas Raphael Fitz Balo Merigueti está na estrada nesta sexta-feira (11). Há dois dias, ele começou uma viagem de cerca de 2,8 mil quilômetros em homenagem ao amigo José Edvaldo da Silva, o turista que morreu no fim do mês passado ao mergulhar usando uma prancha puxada por um barco, em Fernando de Noronha (PE).

José Edvaldo, de 52 anos, era diretor de escola e morava em Ribeirão Branco, no interior de São Paulo. Ele e o amigo, que atualmente mora no Ceará, combinavam há anos uma viagem de moto juntos de um estado para o outro, mas os dois nunca conseguiram realizar o trajeto.

Com a morte do amigo que conhecia havia mais de 10 anos, Lucas viajou para Ribeirão Branco para o velório e enterro. No entanto, para voltar ao Ceará, decidiu escolher um meio transporte bastante diferente do avião que utilizou na ida: uma moto.

"Antes dessa viagem que ele foi fazer, ele falou para a filha dele que se acontecesse alguma coisa com ele, a moto dele era pra ficar comigo. Eu nem sabia que ele falava de mim", conta Lucas.

Então, o psicólogo ganhou a moto de presente da família de Edvaldo, de quem é bastante próximo, e decidiu fazer sozinho a viagem que tinha combinado com o amigo. Ele contou ao G1 que pretende viajar de 400 a 600 quilômetros por dia.

"Eu vou ouvindo Jota Quest, que era a banda preferida dele, paro nos lugares, faço minha oração e peço para Deus levar meu abraço para onde ele estiver."

Antes de viajar, Lucas batizou a moto de "Diva", também em homenagem ao amigo Edvaldo que ele tinha apelidado como "Divo". Na moto, ele colou a foto do diretor de escola, e ainda levou a jaqueta e o capacete do aventureiro.

"Eu estou com o capacete dele, com a jaqueta dele e com ele no meu coração [...] Mas eu não consigo ver essa moto com alegria, eu vejo com gratidão. Eu não queria essa moto, eu queria meu amigo", lamenta o psicólogo.

Para Lucas, a viagem também é uma forma de fazer com que o amigo seja lembrado. Ao G1, o psicólogo ressaltou o quanto Edvaldo foi importante na vida dele e esteve presente nos melhores e piores momentos.

"Eu conheço o Divo, ele não ia querer a gente para baixo, triste. Ele queria ser lembrado com respeito e alegria. Ele sempre fez questão de marcar e fazer parte da minha vida, de dizer 'eu estou aqui', sempre me apoiou em todas as ideias, em tudo", relata.

Amizade

Lucas e Edvaldo se conheceram em 2010, quando o psicólogo morava em Ribeirão Branco e fazia palestras na escola onde Edvaldo trabalhava como diretor. Com o tempo, a amizade dos dois se fortaleceu e, mesmo depois que Lucas se mudou para o Ceará, eles conversavam todos os dias.

Lucas e Edvaldo se conheceram em 2010 em Ribeirão Branco — Foto: Elizabeth Verneque Cordeiro Silva/Arquivo pessoal

"No Ceará ele veio me visitar três vezes, trouxe a minha mãe para me ver, coisas assim que nem os familiares mais próximos fizeram dessa forma. E toda vez que ele ia a gente combinava de viajar. Em janeiro deste ano, ele falou que ia me ajudar a comprar uma moto e, em seis meses, a gente ia subir para o Ceará junto, mas não deu tempo."

O psicólogo também foi uma das primeiras pessoas a ficar sabendo da morte de Edvaldo depois de praticar o esporte, chamado "plana sub", na região do Porto de Santo Antônio. Ele disse que, assim que soube do ocorrido, viajou para o Recife dar apoio à esposa do amigo.

"Como eu moro no Ceará e eles estavam em Recife, arrumei as coisas e fui com ela. Mas na hora de reconhecer o corpo no IML, eu pulei na frente dela, não deixei ela ver. Tinha dor demais. O lugar é feio, malcheiroso, é traumático, entende? Eu falei que ela não precisava daquela imagem."

Agora, a esposa de Edvaldo, Elizabeth Verneque Cordeiro Silva, também está ajudando Lucas na viagem ao Ceará. Ela auxiliou no planejamento e compartilha os vídeos que o psicólogo faz ao longo do percurso.

"Era um desejo dele fazer essa viagem e agora esse amigo já está fazendo. Está sendo muito bacana, e aí eu me distraio, fico acompanhando, vendo essas coisas. O Edvaldo adorava aventura, inclusive ele se foi fazendo aventuras, ele amava, eu e ele. E ele ia gostar muito dessa viagem de moto se ele estivesse aqui", comenta Elizabeth.

Durante entrevista ao G1, Lucas também ressaltou sobre o amor que o amigo tinha pela esposa, pelos três filhos e também pelo serviço que exercia na escola onde trabalhava.

“Ele é uma pessoa que sempre ajudou muitas pessoas. Ele sempre incentivou as pessoas a crescerem, a estudarem, sempre tinha uma palavra de otimismo. Era uma amizade que dava lucro, boas risadas, boas experiências, nunca tivemos nenhum desentendimento."

30 anos de casados

José Edvaldo comemorava 30 anos de casado com a esposa durante a viagem para Noronha. Aventureiros, Elizabeth também contou ao G1 que não era a primeira vez que os dois iam para o local e faziam o mergulho.

“Fomos de boa. Já sabíamos como que era. Inclusive esse passeio de barco já tinha sido marcado desde casa. Antes de chegarmos tinha agendado. Ele queria muito fazer esse passeio. Perdemos o agendamento da terça porque estávamos numa trilha, mas assim que voltamos para a pousada, ele remarcou para quinta.”

A esposa contou ainda que não ficou ao lado do marido durante o passeio e, aparentemente, tudo tinha corrido bem. Contudo, quando subiu no barco, achou que José Edvaldo já estava lá. Isso porque, como ela tinha dificuldades e usava um colete, demorou um pouco mais para sair da água.

Orgulhosa de ter conseguido completar o passeio, tentou procurar o marido no barco para compartilhar a experiência, mas não o encontrou.

“Um moço falou pra mim que achava que ele poderia estar no banheiro. Fiquei nervosa na hora, em pânico. Quando vi a porta do banheiro fechada, fiquei aliviada. Mas bateram e tiveram que arrombar. Ele não estava lá. Me ajoelhei no barco e fiz uma oração.”

Segundo ela, o Corpo de Bombeiros chegou muito rápido e todos que sabiam nadar pularam na água para tentar achar o marido, que foi socorrido e levado ao hospital.

Ela já estava na pousada se preparando para a transferência para a capital pernambucana, quando sentiu que deveria voltar ao hospital. Foi quando recebeu a notícia que o marido não tinha resistido.

“Comoveu a ilha, é um lugar pequeno. Todos ficaram sabendo praticamente na hora e todos muito carinhosos. Não me senti sozinha. Todos da pousada, do passeio, os médicos, funcionários do hospital, bombeiros, a Roberta, que é mergulhadora, me ajudaram."