Botão do Pânico previne violência doméstica contra mulheres em Alagoas
Monitoramento feito pela Seris ocorre de forma ininterrupta

Um relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) revelou que o isolamento social contribuiu para o crescimento do número de casos de violência contra a mulher. No Brasil, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) criou um grupo de trabalho para desenvolver sugestões de medidas para prevenir a violência doméstica, bem como tornar o atendimento das vítimas pelo Poder Judiciário mais célere.
De acordo com levantamento da divisão de estatística da Assessoria de Planejamento e Modernização do Poder Judiciário (APMP), do Tribunal de Justiça de Alagoas, de janeiro a meados de abril de 2020, foram concedidas 225 medidas protetivas a mulheres vítimas de violência doméstica. O número é superior se comparado ao mesmo período do ano passado.
Os dados fazem com que um recurso utilizado pelo Judiciário se torne ainda mais importante durante o período de isolamento social decorrente da pandemia do novo coronavírus: o uso de tornozeleira eletrônica e do botão do pânico como medida protetiva de urgência, prevenindo, dessa forma, a violência contra a mulher. Em Alagoas, o recurso começou a ser utilizado em maio de 2015 e já salvou vidas.
O monitoramento por meio de tornozeleira eletrônica é realizado pela Secretaria da Ressocialização e Inclusão Social (Seris), por meio do Centro de Monitoramento Eletrônico de Presos (CMEP). Apresentando as mesmas funcionalidades de uma tornozeleira eletrônica, o botão do pânico, por sua vez, conta com recursos que tornam o dispositivo ainda mais eficaz.
O botão serve para que a vítima possa alertar o Centro de Monitoramento da aproximação do agressor. Outra vantagem é que o equipamento, diferentemente da tornozeleira eletrônica, não fica fixado em nenhuma parte do corpo da vítima. Por ser um dispositivo discreto, o aparelho pode ser levado dentro do bolso ou em local similar.
No momento da decisão judicial, o magistrado estabelece raios – que compreendem cerca de 500 metros, tendo como referência a localização da própria vítima – e áreas de exclusão que considerem situações diversas, como as coordenadas geográficas da residência da vítima e seus familiares, além de locais habitualmente frequentados por ela, como trabalho e templo religioso.
São as áreas de exclusão que possibilitam ao CMEP observar, de maneira antecipada, a aproximação do agressor e, com isso, executar as medidas previstas nos protocolos operacionais, evitando, dessa forma, a prática da agressão. Atualmente, em Alagoas, há 19 mulheres utilizando o botão do pânico como medida protetiva.
É por meio da decisão judicial que o Centro de Monitoramento configura, de acordo com a distância arbitrada pelo magistrado, o sistema de monitoramento por GPS, com a fiscalização sendo iniciada de imediato. “Se houver uma violação de área ou se a vítima acionar o botão do pânico, a CMEP fica ciente do ocorrido por meio de um alerta sonoro”, revela a supervisora do Centro de Monitoramento de Presos, policial penal Lucianna Lupatelli.
E para garantir a eficácia desta medida protetiva, alguns elementos são considerados essenciais, como o bom funcionamento do equipamento eletrônico, uma decisão judicial precisa quanto à área de restrição, e a observância contínua dos deslocamentos do agressor.
“A Lei Maria da Penha cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. O combate a esse tipo de crime é uma das preocupações do Governo de Alagoas. Nesse sentid, o botão do pânico tem dois efeitos: inibir o agressor e encorajar a mulher a seguir com suas atividades rotineiras”, destaca o secretário de Ressocialização e Inclusão Social, coronel PM Marcos Sérgio de Freitas.
Por sua vez, o juiz Paulo Zacarias, responsável pelo Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, explica que não são todos os casos de violação à Lei Maria da Penha que exigem a colocação de tornozeleira no agressor. “Enquanto alguns réus temem a ordem judicial, outros não dão importância. Nos casos em que o agressor manda recado para a vítima ou tenta aproximação em locais públicos, entre outras situações de violação da medida protetiva, a tornozeleira e o botão do pânico tornam-se aliados importantes”, salienta.
O magistrado destaca ainda que, mesmo que se tenha filhos menores de idade, o contato entre agressor e vítima deve ser evitado. “Na audiência, ao constatar esse tipo de situação, estabeleço como será dado o contato entre o réu e a criança nos dias de visita. Caso seja necessário, o réu determina um familiar que será responsável por isso, desde que não haja nenhum tipo de conversa entre agressor e vítima”, explica o magistrado.
Já o juiz José Braga Neto, da 16ª Vara de Execuções Penais, ressalta a importância de a vítima denunciar o agressor para que as medidas preventivas possam ser tomadas. “A mulher deve lembrar que a violência doméstica é gradativa. No momento em que ocorrer qualquer tipo de agressão, a mulher deve comunicar o fato às autoridades competentes. Caso queira, já pode, inclusive, solicitar o uso da tornozeleira eletrônica como medida de proteção”, conta o magistrado.
O recurso também pode ser solicitado nas audiências de custódia ou até mesmo ao longo de um processo judicial, nos casos em que se comprova a necessidade do uso do equipamento. “Um dos principais pontos analisados no momento da decisão do uso da tornozeleira é o estado de espírito da vítima e o histórico de agressões anteriores. Se a mulher está assustada ou preocupada com sua integridade física, o uso da ferramenta é aconselhável”, reforça Braga Neto.
Por conta da pandemia da Covid-19, as mulheres que forem vítimas de ameaça ou agressão verbal podem registrar o Boletim de Ocorrência pela internet, por meio da delegacia interativa da Polícia Civil. Porém, nos casos de estupro ou agressão física, a vítima deve comparecer à delegacia para pegar a requisição do Exame de Corpo de Delito, que é realizado pelo Instituto Médico Legal (IML).
Violação
Ao ser constatada a aproximação do agressor com a vítima, o CMEP realiza contato telefônico com a mesma para alertá-la da proximidade do agressor. Em seguida, o agressor também é informado, por meio de contato telefônico, que está em violação por proximidade com a vítima e que, por isso, deve se afastar da área imediatamente.
A situação permanece sendo monitorada pelos servidores da Central e, assim que o agressor se afasta, é realizada uma nova ligação para a vítima, informando-lhe do distanciamento. No caso da situação se manter e o agressor chegar a violar a área de proximidade com a vítima, a mesma é novamente informada por contato telefônico.
Neste momento, os servidores da Central perguntam sua localização e se ela está acompanhada, orientando-a a fechar a porta do local onde estiver. Na sequência, o agressor é novamente informado da violação, sendo solicitado novamente que o mesmo se afaste da área restrita. A Polícia Militar, por sua vez, também é informada da ocorrência e, por meio do fornecimento das informações de posicionamento do agressor pela CMEP, realiza diligência em busca do denunciado.
Ao ser encontrado, o agressor é preso e encaminhando para o sistema prisional, de acordo com os procedimentos estabelecidos pela Portaria da Seris nº 243/2017 e pela Corregedoria Geral de Justiça (CGJ) do Tribunal de Justiça de Alagoas. O mesmo procedimento é adotado nos casos em que a vítima acionar o botão do pânico, ou seja, quando ela mantiver contato visual com o agressor, em clara violação do perímetro de distanciamento.
Quando descumpre a medida protetiva de urgência, o monitorado incorre em crime tipificado na lei Maria da Penha, ficando sujeito à pena de detenção pelo período de três meses a dois anos. Além disso, caso seja preso em flagrante, apenas a autoridade judicial poderá conceder fiança, sendo possível ainda, a aplicação de outras sanções.
Em Alagoas, o uso do botão do pânico tem superado as expectativas. Desde o início da utilização da ferramenta, em maio de 2015, até abril de 2020, não houve registro de novas agressões às vítimas de violência doméstica por parte dos monitorados. “Quando estava à frente da comarca de Boca da Mata, utilizei a tornozeleira eletrônica como um meio de proteção a uma vítima de violência doméstica. Algum tempo depois, o dispositivo contribuiu para evitar o homicídio desta mulher”, lembra o juiz José Braga Neto.
“Quando o agressor tentou a aproximação da residência da vítima, o CMEP adotou os procedimentos cabíveis e comunicou o fato à Polícia Militar. Ao chegar à casa da monitorada, os policias encontraram o agressor preparado para assassiná-la. Conseguimos evitar uma tragédia graças a este equipamento”, complementou o magistrado.
Lei Maria da Penha
Sancionada em 7 de agosto de 2006, a Lei 11.340, também conhecida como Lei Maria da Penha, é considerada um marco no combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. A legislação é tida como uma das mais avançadas do mundo pela Organização das Nações Unidas (ONU) por garantir uma punição mais rigorosa aos agressores.
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