Estudo mostra a existência de “acumuladores de animais” em Maceió
Pesquisa aponta falta de política pública no controle das populações de cães e gatos
Um inquérito epidemiológico realizado com 400 pessoas criadoras de cães e gatos na cidade de Maceió, revelou que 72,75% costumavam abrigar animais das ruas em suas residências. Nesse universo, foi observada a presença expressiva de “acumuladores de felinos”, sendo verificada a existência de 10 a 75 animais sendo criados com deficiência de orientação médico-veterinário.
A pesquisa também verificou que, dentre as justificativas para o não acompanhamento de profissional dessa área aos animais, os “acumuladores” alegaram falta de condições financeiras e de não acreditarem ser necessária a orientação. A falta de pretensão para a tutoria permanente dos animais, também foi justificada para a realidade encontrada.
O inquérito epidemiológico integrou a pesquisa de mestrado da médica- veterinária Eveliynne Hildegard Marques de Melo e teve como objetivo investigar “O nível de cuidados básicos destinados aos caninos e felinos pelos seus tutores e a relação de risco zoonótico no município de Maceió-AL”.
A pesquisa, realizada em ambiente reservado, investigou 31 pontos relativos à criação de cães e gatos, com destaque para “o hábito de resgatar animais da via pública e criar em residência”, o que evidenciou o comportamento de “ acúmulo de animais”.
Durante a realização do trabalho observou-se que a maioria dos acumuladores não tem ocupação formal. O desconforto emocional ao falar sobre o número de animais acumulados, foi uma constante entre os entrevistados. Segundo a pesquisadora, “os acumuladores de animais são uma população que necessita de intervenção multidisciplinar para tratamento desse transtorno e orientação sobre zoonoses”.
Evelynne é egressa do curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal de Alagoas e colaboradora/consultora voluntária do Grupo de Extensão de Educação Ambiental sobre Cuidados com Cães e Gatos, conhecido como PetCidadão, coordenado pela professora Márcia Notomi. Com atuação em medicina veterinária preventiva, tem linha de pesquisa focada nos aspectos ligados às necessidades de políticas públicas relativas à presença desordenada de cães e gatos no centro urbano.
Segundo a pesquisadora, considera-se “acumulador de animais”, o indivíduo que mantém dezenas ou centenas de animais em condições inadequadas e não percebe isso como um problema. “O acumulador é uma síndrome: união de fatores comportamentais que resultam em problemas sanitários e comprometem o bem-estar dos animais, da própria pessoa que acumula e dos vizinhos”.
São pessoas que precisam de amparo psicossocial. Foram identificados muitos comportamentos de angústia pessoal nos entrevistados acumuladores. As pessoas facilmente choravam quando perguntadas sobre a quantidade de animais que mantinham em casa, explica.
Nos desabafos, existe exclusão familiar, pressão da vizinhança pelo incômodo com os animais, isolamento social e sofrimento por não conseguirem dizer “não” aos pedidos de outras pessoas que levam cães e gatos para as suas residências.
De modo geral, “os acumuladores” são pessoas que adquirem muitos objetos ou animais sem um propósito aparente, perdem a noção de espaço, expressam descuido pessoal e com as coisas ou animais que acumula. “Essas pessoas são conceituadas popularmente como meras apaixonadas por cães e gatos. No entanto, trata-se de transtorno mental e com sérios impactos na saúde única que é a interação entre saúde animal, saúde humana e saúde ambiental”, salienta.
No Brasil há poucos estudos abordando a temática de “acumuladores de animais”, sendo esse o que a motivou incluir a investigação na pesquisa feita em Maceió. A pesquisa foi realizada durante o Mestrado Profissional Pesquisas em Saúde com ênfase em saúde pública com caninos e felinos domésticos , sob a orientação do professor Sílvio Romero Oliveira de Abreu. Teve continuidade na Ufal com colaboração do professor Wagnner Porto, como aluna do Mestrado Acadêmico com ênfase em Medicina de Felinos.
A veterinária informa que como a conclusão da pesquisa apontou para a necessidade de política pública de educação ambiental para tutores de cães e gatos, foi desenvolvido como produto de utilidade pública os primeiros materiais educativos, identificados como Guias educativos/cartões sanitários animal, já registrados na Biblioteca Nacional brasileira e com selo ISBN, e disponíveis como utilidade pública no site do Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV), de Alagoas.
Legislação municipal
Existe em Maceió desde 25 de setembro de 2003 uma lei, em vigor, que define a quantidade de animais (caninos e felinos domésticos) em residências. Consta na legislação municipal, em seu Art. 35: Não serão permitidos, em residência particular, a criação, o alojamento e a manutenção de mais de 10 animais, no total das espécies canina ou felina com idade superior a 90 dias.
A lei municipal, em seu parágrafo 1º, esclarece “A criação, o alojamento e a manutenção de animais, em quantidade superior ao estabelecido neste artigo, caracterizará o canil de propriedade privada sujeito às penalidades legais pertinentes”.
Embora a legislação esteja em vigor há quase duas décadas, a médica-veterinária diz que de modo geral, não há conhecimento por parte das pessoas e essa realidade é percebida até informalmente em conversas em consultório, durante as orientações preventivas para cuidados com animais. Em sua opinião, “a única forma de tornar o cidadão participativo nas regras criadas pelo legislativo, é fazê-lo conhecer as normas/leis e que o poder público direcione os esforços necessários a isso, bem como, definir estratégias que permita ao cidadão cumprir o estabelecido legalmente.