Há dez anos, o STF reconhecia um direito óbvio: a união entre pessoas que se gostam
Em AL, já foram registrados 322 casamentos homoafetivos; conheça história Paulo e Cristiano
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Em 5 de maio de 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF) passou a reconhecer a união estável entre pessoas do mesmo sexo. De lá pra cá, 322 casais oficializaram a união estável em Alagoas, de acordo com levantamento da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais de Alagoas (Arpen-AL). O 7Segundos conversou com o casal Paulo Galindo Filho, de 39 anos e Cristiano Cabral, de 41, para saber como foi o processo de dizer o “sim” de papel passado. (Leia a história ao final da reportagem).
Em 14 de maio de 2013, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou a Resolução 175/2013, obrigando cartórios a realizarem casamentos homoafetivos. A norma contribuiu para derrubar barreiras jurídicas que dificultavam as uniões entre pessoas do mesmo sexo e os casais começaram a ter todos os direitos previstos em lei. A partir daí, as oficializações começaram a crescer. Em 2019 — ano que foi registrado as últimas uniões homoafetivas — o número total de casamentos civis em Alagoas chegou a 70.
Casamentos homoafetivos oficializados em Alagoas:
2011: 09
2012: 15
2013: 17
2014: 18
2015: 48
2016: 32
2017: 31
2018: 82
2019: 70
NENHUM DIREITO A MENOS
Com a conquista do direito de se casar em 2013, os homossexuais passaram a usufruir dos mesmos mecanismos legais dos casais hétero. O principal deles, segundo a juíza Emanuela Porangaba, coordenadora do Projeto Justiça Itinerante do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ/AL), é a “constituição da prova do vínculo conjugal, o resto fica por conta da satisfação dos nubentes em se sentirem iguais, vistos e, sobretudo, respeitados”.
Para a juíza, a oficialização de qualquer união é importante não só do ponto de vista social como jurídico. “A oficialização da união homoafetiva é tão importante quanto para qualquer outro tipo de união. Do ponto de vista jurídico, o casamento altera o estado civil dos nubentes de solteiros para casados, enquanto que na união estável, não há nenhuma mudança. O casamento é mais formal pois necessita do registro civil, sendo emitida inclusive uma certidão de casamento”, explica.
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Juíza Emanuela Porangaba. Foto: Caio Loureiro
Segundo a magistrada, a maior procura pela oficialização da união homoafetiva tem a ver com “as pessoas se sentirem mais confortáveis para oficializarem suas uniões sem o julgamento dos preconceituosos”. Para ela, o preconceito e a discriminação, que até pouco tempo “absurdamente” ainda permeava as uniões homoafetivas, já não são mais admitidos na atual conjuntura. “O preconceito e a discriminação jamais podem partir de qualquer pessoa, muito menos do Poder Judiciário”, adverte a magistrada.
A juíza explica quais os trâmites burocráticos para que as uniões homoafetivas sejam oficializadas: “os mesmos trâmites para qualquer casamento civil. Os nubentes devem procurar um cartório de registro civil para entrega da documentação exigida pela lei e publicação do edital de proclamas. A partir daí, todas as demais providências serão tomadas pelo tabelião do referido cartório como agendamento de data e horário para celebração do casamento”, afirma.
CONQUISTA DO MOVIMENTO LGBTQI+
Para Nildo Correia, presidente do Grupo Gay de Alagoas (GGAL), o reconhecimento da união homoafetiva no Brasil é uma das maiores conquistas do movimento LGBTQI+. “Acredito que a maior conquista foi a tipificação da LGBTfobia na lei de combate ao racismo no país. A meu ver, depois da criminalização da LGBTfobia no Brasil, o reconhecimento de casais homoafetivos como entidade familiar seria a segunda maior conquista da luta do movimento”, afirma.
Ainda segundo Nildo Correia, ultimamente há uma maior procura por oficializações homoafetivas no estado. “Esse ano estamos indo para a 5ª edição do Casamento Coletivo [programa da Justiça Itinerante do Poder Judiciário de Alagoas] e até hoje, conseguimos oficializar 247 uniões entre casais LGBT. Ano passado, infelizmente, não tivemos como realizar casamentos coletivos em virtude das restrições da pandemia. Esse ano, provavelmente, a próxima edição ocorrerá em torno de julho a setembro”, conta Nildo.
Para o presidente do GGAL, a oficialização do casamento homoafetivo propõe um leque de direitos aos casais. “Direito a renda conjunta para aquisição de bens, direito a incluir o parceiro ou parceira no seguro de vida, no plano de saúde da empresa, direito a auxílio maternidade, direito a pensão, além de um precedente por reconhecer como entidade familiar, na questão da adoção de crianças”, finaliza Nildo.
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Nildo Correia, presidente do GGAL. Foto: Divulgação
CONHEÇA A HISTÓRIA DE PAULO E CRISTIANO
Paulo Galindo e Cristiano Cabral passaram a se valer do direito quando se casaram em 2011. “Nos conhecemos em 2009 e em 2011 decidimos oficializar a união, pois já estávamos morando juntos. Não queríamos apenas a união estável e sim o registro civil. Deste modo, conversamos com dois amigos e advogados que nos ajudaram nesse processo”, contam.
Para eles, o casamento civil homoafetivo contribui para a inclusão dos casais em um contexto que, até então, admitia apenas a união entre homens e mulheres. “Entendemos que é o mesmo benefício que para os casais heterossexuais: ingresso em plano de saúde do esposo(a), adoções de filhos, segurança cônjuge em caso de falecimento e o mais importante: mostrar a sociedade que a sexualidade não pode te dar mais ou menos direitos e sim igualdade”, enfatiza o casal.
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Filha do primeiro casamento de Cristiano já tem 16 anos. Foto: Arquivo pessoal
Da aceitação da família ao papel passado
A desaprovação da família também pode afastar a ideia de casamento entre pessoas do mesmo sexo. Porém, não foi o que aconteceu com Paulo e Cristiano. “Fomos agraciados por Deus e principalmente pelas nossas famílias. Nos damos muito bem, temos total abertura para diálogo. Cristiano tem uma filha do primeiro casamento que hoje tem 16 anos e sempre conviveu conosco. Temos uma relação muito saudável”, revelou Paulo.
A oficialização da união foi registrada no Chez Marie, salão de festas localizado no bairro de Barro Duro, em Maceió. Eles fizeram uma cerimônia “tradicional”. O casamento foi conduzido pela juíza Lorena Sotto-Mayor e contou com a participação de representantes do cartório de registro civil. “Tivemos o apoio de nossos familiares. Selecionamos 260 convidados para a festa. Foi uma festa linda, com ensaio fotográfico, som de duas bandas, DJ, bar temático. Tudo que tínhamos direito”, detalha o casal.
Paulo sempre teve a vontade de ser pai, porém, devido a 'correria' do dia a dia, ele teve que deixar os planos para depois. “Logo após o casamento eu tinha o desejo de adotar, mas com o passar dos anos fui observando que a criação requer muitas coisas que atualmente não conseguimos oferecer, uma delas é tempo. Por enquanto vamos mimando nossos sobrinhos, nossa filha Camilla, e tocando a vida em frente”, finaliza.
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Casamento de Paulo e Cristiano aconteceu no Chez Marie. Foto: Arquivo pessoal
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