Tio de ex-prefeito alagoano recebia propina sobre venda de medicamentos, diz MPE
Intermediário participava de esquema que movimentou mais de 1 milhão de reais
O tio do ex-prefeito Fábio Rangel Nunes de Oliveira – que administrou o município de Girau do Ponciano de 2012 a 2015 – recebia propina sobre a compra de medicamentos feita pela prefeitura. Beneficiado a cada negociação, Valdemir Aurélio é apontado como peça chave do esquema investigado pelo Ministério Público Estadual.
Já considerado foragido da justiça, conforme revelado durante entrevista coletiva realizada nessa segunda-feira (30) em Maceió, Valdemir Aurélio faturou R$ 114 mil em apenas um mês. “Somente em dezembro de 2014, o valor de três notas fiscais frias emitidas pela Campos Distribuidora somaram R$ 146.834,33 e o acordo criminoso previa que cerca de 78%, ou R$ 114 mil, teriam que ser destinados a Valdemir Aurélio”, informa o MPE/AL com base nos dados levantados pelo Grupo Estadual de Combate às Organizações Criminosas (Gecoc).
O suposto desvio de recursos públicos iniciado em 2013 gerou a Operação Sepse, trabalho do Gecoc que indica que mais de um milhão de reais foram movimentados em Girau do Ponciano durante a gestão de Fabinho Aurélio, como é mais conhecido o ex-prefeito do município.
“O esquema acontecia de duas maneiras: emissão de notas fiscais frias, cujo dinheiro pago pela prefeitura era quase que totalmente revertido para Fábio Rangel; e com cobrança de propina de 10% em cada aquisição legal de medicamentos”, resume o MPE sobre a prática que envolve a empresa Campos Distribuidora de Medicamentos.
Apontada como principal envolvida na fraude, a referida fornecedora de medicamentos tinha contrato de R$ 1.277.764,24 com a prefeitura de Girau do Ponciano.
“No esquema criminoso, os pagamentos eram feitos sempre à empresa que, por sua vez, repassava um valor X ao intermediário do senhor Fábio Rangel, que era o tio dele, Valdemir Aurélio. Esse tio era quem negociava a liberação do dinheiro mediante lucro de 10% em cima do valor total da nota. Para despistar, os saques referentes à extorsão eram feitos pelo dono da distribuidora e entregues ao tio do gestor” explicou o promotor de Justiça Carlos Davi Lopes durante a entrevista coletiva realizada nessa segunda-feira (30).
Empresa de fachada
Ainda de acordo com informações divulgadas pelo MPE/AL, os proprietários da Campos Distribuidora criaram uma segunda empresa, a KM Distribuidora de Medicamentos Ltda. para que os mesmos empresários - que não tiveram as identidades informadas - continuassem participando das licitações em Girau do Ponciano na categoria de microempresas porque a Campos Distribuidora já havia ultrapassado o limite legal.
“O esquema permitiu que a KM Distribuidora de Medicamentos Ltda fosse a vencedora do edital e, a partir daí, a distribuição de propinas continuou, tanto com as velhas práticas de cobrança dos 10% em cima de todos os fornecimentos de medicamentos, quanto com a emissão de notas frias falsas”, destacou o promotor de justiça Hamilton Carneiro.
Um dos contratos celebrados com tal empresa ocorreu no segundo semestre de 2016. A KM Distribuidora ficou a missão de fornecer material médico-hospitalares no valor de R$ 215.105, 34. Nesse caso, a propina paga a Fabinho Aurélio foi de R$ 20 mil.
Para blindar as duas empresas que realmente repassavam os medicamentos ao município, mesmo com toda a ação criminosa chefiada pelo ex-prefeito e seu tio Valdemir Aurélio, outra empresa fantasma começou a fazer parte de toda a movimentação, ressalta o MPE/AL.
“A RR Distribuidora também foi criada pelos donos das duas primeiras, mas ela não existia nem de fato e nem de direito. O endereço disponibilizado como sendo de sede é de um terreno baldio. Somente ela movimentou em notas fiscais frias, beneficiando o prefeito Fábio, cerca de R$ 600 mil”, detalhou o promotor Carlos Davi Lopes.
Outras pastas
A promotora de justiça Eloá Carvalho enfatizou que no desenrolar da Operação Sepse, o Gecoc detectou crimes similares cometidos pelo prefeito Fábio Rangel também em outras pastas, a exemplo da educação. O esquema envolveria a aquisição de merenda escolar.
“Encontramos muitas irregularidades e, infelizmente, não somente na área da saúde. Por isso, outras secretarias também estão sendo investigadas. O esquema é abrangente e o Ministério Público lamenta muito que tais ações criminosas punam diretamente a sociedade. Passou a ser cultural esse comportamento entre os gestores”, disse a promotora Eloá Carvalho.
Prisões
Fábio Rangel já tinha sido preso, também, após investigações do Gecoc, em julho deste ano. Ele e os ex-prefeitos de Mata Grande, Jacob Brandão, e de Passo do Camaragibe, Márcia Coutinho Nogueira, são acusados de desviar mais de R$ 3 milhões da área da saúde.