Enquanto uns lutam pela vida nos hospitais, arapiraquenses se aglomeram sem máscara no Bosque
Hospitais de Alagoas já estão trabalhando com a capacidade máxima
O último discurso de Jesus Cristo, prestes a morrer na cruz, foi "Pai, perdoa-lhes, eles não sabem o que fazem". A frase, emblemática, foi repetida respeitosamente, em 2020, pela médica arapiraquense Laísa Mirele, que trabalha no atendimento a pacientes vítimas da Covid-19.
A frase bíblica foi dita pela profissional de Saúde em resposta a um vídeo feito pela equipe do Portal 7 Segundos no último domingo no Bosque das Arapiracas, um dos maiores cartões postais da cidade.
Nas imagens, é possível ver centenas de pessoas sem máscara, caminhando pelo local, aglomeradas, como se o mundo inteiro não estivesse passando pela sua maior crise em Saúde da contemporaneidade, a pandemia causada pelo coronavírus.
"Esse final de semana, eu trabalhei no Plantão Covid da Santa Casa, em Maceió, que já está com a capacidade máxima de atendimento. Nossa jornada de trabalho tem sido angustiante. Ver esse vídeo gera um sentimento de revolta, de descrença no ser humano, que é tão egoísta que, além de não pensar na sua própria saúde, também não pensa no coletivo", desabafou a médica.
Apesar dos constantes alertas, a população tem negligenciado cada vez mais os cuidados básicos. Para a profissional da Saúde, as pessoas ainda não conseguiram entender a gravidade da situação.
"As pessoas não conseguem entender que nossa vivência, enquanto profissionais de Saúde, nesses últimos meses, é ver pessoas morrendo por causa do vírus. Apesar de orientarmos os pacientes sobre os cuidados e alertarmos sobre os perigos, as pessoas não estão nem aí. É muito triste", continuou Laísa.
Enquanto as pessoas se aglomeram no Bosque das Arapiracas e nas confraternizações de final de ano, milhares de outras pessoas lutam, nos hospitais, para conseguir vencer o vírus e voltar para casa com vida.
"É triste ver a quantidade de gente que está precisando de atendimento, sem conseguir respirar, e o quão sofrida é a morte causada pelo vírus. Trabalhando, a gente ouve diversas histórias de idosos que nunca saíram de casa durante a pandemia, mas que foram infectados através de parentes que foram visitá-los", lamentou a médica.
Linha de frente
Para quem atua na linha de frente da Covid-19, ver o egoísmo de quem não se cuida é desmotivador. Para a enfermeira Rafaella Albuquerque, que lidera diversos profissionais da linha de frente do combate ao coronavírus em Arapiraca, é assustador perceber que as pessoas estão banalizando a doença.
Enquanto isso, a pandemia segue existindo, e as pessoas seguem adoecendo e transmitindo o vírus, aumento cada vez mais o número de mortos.
"Os profissionais da linha de frente tem renunciado a sua própria vida, os momentos com a família, para se doar no atendimento aos infectados, que estão lotando os hospitais e lutando para sobreviver”, disse a enfermeira.
Para Rafaella Albuquerque, a luta precisa ser de todos. "Estamos todos na expectativa dessa vacina chegar e ser disponibilizada à população, mas até lá a luta segue sendo de todos. As pessoas precisam ter consciência do que está acontecendo e fazer, efetivamente, a sua parte, pois só assim nós conseguiremos amenizar o impacto causado pela pandemia", desabafou a enfermeira.
Luto ainda mais doloroso
A morte de um familiar por si só já gera uma dor profunda, mas o luto de quem perdeu seus amados durante a pandemia chega a ser ainda pior, pela falta de preparação e sepultamento, que, por medidas de segurança, precisa ser feito às pressas.
Para o jornalista Igor Castro, que perdeu a irmã e o pai para a doença, a falta de consciência da população é lamentável.
"É um absurdo ver cenas como essas do vídeo, pois mostram que a morte do meu pai e da minha irmã foram em vão. As pessoas não aprenderam nada"', lamentou.
A irmã de Igor, Iza Castro, era assistente social e estava trabalhando na linha de frente do combate ao coronavírus. Iza faleceu no dia 3 de junho, depois de alguns dias internada no mesmo hospital onde trabalhava.
Dois dias após a morte de Iza, seu pai, o radialista Edvaldo Silva, de 64 anos, que era do grupo de risco, foi internado, vindo a falecer no dia 16 de junho.
"Como meu pai era do grupo de risco, toda a minha família tomava o maior cuidado do mundo para protegê-lo. Meu pai não saia de casa, mas mesmo assim foi infectado. Eles faleceram, mas as pessoas que andam por aí sem máscara e sem tomar os cuidados básicos continuam vivas", desabafou o jornalista.
Para ele, não se cuidar é uma maldade para com as outras pessoas. "Eu tive Covid e mesmo assim sigo me cuidando ao máximo. Eu perdi duas das pessoas mais importantes da minha vida. Além da minha família, quantas outras também perderam seus entes queridos. Usar máscara e evitar aglomerações é o mínimo que eu posso fazer para proteger os outros", finalizou.
Pesquisadores confirmam segunda onda de Covid-19 em Alagoas
De acordo com o Observatório Alagoano de Políticas para o Enfrentamento da Covid-19, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), nosso estado já está vivenciando a segunda onda de Covid-19.
Os dados foram divulgados na última segunda-feira (21), no relatório da 51ª Semana Epidemiológica.
Os pesquisadores apontam o agravamento da situação diante do alto número de casos suspeitos da doença em todo estado. Segundo eles, houve um forte crescimento na incidência de casos de pessoas infectadas pelo novo coronavírus, bem como de óbitos. Os números da última semana epidemiológica apontam mais 2.801 casos e 32 óbitos.